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SEIS MISTÉRIOS

O MISTÉRIO DO DESENGANO

                I
Nadas em torno a ti
Braçadas na distância,
Arrepiado na jactância
À vida que atraí.

Atraíram-me sonhos,
Lindos…., deusas, vagos!
Silenciosamente trago-os
Na caixa dócil de medronhos!


               II

Caixa ilustre prá mão,
Rodopiando o grão na bailarina
Beijando óleo da lamparina,
O sangue de meu coração.

Quando te abres odor….
Quando te fechas, o que sei?
Foste a vida que não neguei,
Foste a vida do temor!

 

              III


Temor? Se sempre voaste!
Se sempre alvoraçaste a vida!
Temor?!....Só da arrepiada
Volta de que não voltaste….

Acabou-te a força medrada,
Impulso de todo o salto.
Sempre soubeste quão alta,
Se baixava a sombra cravada!


             IV

Ah sombra febril e oca!
Fantasma solene desvairado,
Cravas fundo, bem cravado,
Sangue fluido duma boca!

Se não fosse minha, mas tua,
Seria de deus e nossa,
Deles todos e também vossa,
O vómito que cobre esta rua!

 

              V


Mas ai de quem ousa impedir
O fétido périplo da viagem,
Poção de bêbedo em passagem,
Palavra que em vós há-de fruir!

Será perdido para mim senhor?
Para vós poderei esconder
O caldo ignóbil, que faz doer
Em tremulina o cristo salvador?


             VI

Salva-me a sombra da sombra,
Luz dum ponto miserável,
Luz dessa luz tão amável,
Enchida em loquaz penumbra!

Salva-me a mão que partiu….
Salva-me o peito arranhado,
Por ternas lâminas esgravatado!
Salva-me o sonho que já ruiu.

 

             VII


Vê-se uma lua cheia, redonda,
Espreitando o manto de nuvens….
Vê-se a madeira de que vens,
Vê-se uma figura hedionda!

Vê-se um velho nojento
Esgravatando na terra, crispado….
E um gato oculto, arrojado,
Vai embalado no ver pestilento!


            VIII

Há lajedos frios, frios!
Transbordando ossos trajados
Em vestes, a vestuário rodeados!
Carnes, botões, esgares, arrepios!

Vêm árvores milenárias,
Árvores ainda assim apavoradas!
Murmuram preces estagnadas,
Nas suas folhas centenárias!

 

              IX


E ainda caminhos de vermes,
Um outro mundo de loucos!
Sugando, sugando…., já poucos
Líquidos brancos inermes!

E os pássaros da nossa morte!
Malditos seres alados, vivos.
Que pensais, nós também temos
Por vós, patifes, nossa sorte!

 

             X

Fica a mancha com a caixa,
Fica o vapor gritando a mim,
Na outra mão com jasmim,
A sorte da maldita caixa.

Vem então do solo um sopro,
Abre-se a caixa, voga o coração
Dolente, trespassado em união,
A razão porque afinal sofro?!

                                                            Coimbra, 28 de Setembro de 1992


O MISTÉRIO DA INIQUIDADE

                   I


Que te vai na alma, homem?
Quem te sonhou opróbrio assim,
E destapou no ventre o sim,
Às trevas de teu lobisomem?

Quem me envergonhou o rosto
Atrás do oiro, atrás da mentira?
Ai, por quem esta alma aspira?
O leito das rochas do desgosto.


                   II

Que iluminada melancolia
Nos passos, nos olhos, em sorrisos.
Que paciência hábil nos abrigos,
Gasta nos beijos que queria!

Queria ser grande uma vez….
Queria possuir uma cascata,
Uma montanha, um prado, uma mata….
Queria ser grande uma vez!

 

                   III


Mas é sempre o frio, o agasalho,
Agastado num canto onde estou,
Onde tu vieste…., não. Voou
Contigo e poisou num galho!

Fazes mal amor, cantar
Em baixo do calor do rouxinol.
Encobre-se em ti o sol,
E o biquinho já nega o chilrear!


                  IV

Deixem-me as mágoas em ferida,
Curar este meu ar melancólico,
Este meu borbotão alcoólico
Matar a água adormecida!

Pedras despontam em flores,
Rosas pétreas dão tristezas,
Teus olhos…., dão rezas,
Rezas inflamando as minhas dores!

 

                V


Eu não sei porque choro,
Mesmo na alegria tamanha!
Eu não sei que artimanha
Escondo veemente, como imploro

Que me deixem ajoelhado,
Fuzilado com o olhar as vidas,
Néscias do pecado, escarnecidas….
Como elas estou aprisionado!


                 VI

E não existem anjos, nada!
Nem santos, santas e bondade.
Só um deus de piedade….
Só uma deusa abandonada….

Ditoso quem o tem agarrado!
Ditoso quem se desposou com ela!
A sua virtude, doçura, anela
A sorte, do coração esmagado!

 

                  VII


E quem sou eu para vós?
Não vim eu dum ventre materno?
Não pra todos o ser eterno?
Afinal, que sou para vós?

O coitado trajado na rua estreita,
Espreitando o tripudio da morte….
Ah, que me roubou a sorte
Que a todos uma vez espreita?


                 VIII

Não se pode viver assim, deus!
Ultrajado e ignóbil no percurso,
Da juventude perdida no decurso
De conhecer um amor…., outro adeus!

Que venha o fechar olhos,
O silêncio da potestade infernal,
As rezas de minha mãe em manancial,
Mas coberto por um tufo de abrolhos….

                                                                         Coimbra, 29 de Setembro de 1992


O MISTÉRIO DA MELANCOLIA

                       I


Alvorada de rompante imensidão,
Leva-me pró vazio do silêncio
Sereno, cândido, apagado e cônscio,
Reluz um raio escuro no coração!

Levaram-me assim, contorcido….
Quiseram sempre assim, poço
De água que não sobe, moço
Tímido de palavras escondido!


                     II

Para a lua serve o teu cogitar….
Para ela, que não vibra sons!
Ah pedaço alvo, vestida de tons,
Fundida na salinidade do mar!

Eu te comparo a um rosário
De estrelas quebradas e coladas,
De estrelas unidas e guardadas,
Conchinhas lânguidas dum fadário!

 

                      III


Belas noites cercam pseudo alegria,
Correntes moídas, eléctricas de tristeza.
Périplos ondulantes duma leveza,
Duma fleuma do olor do dia.

Elas me fazem quebrar a tortura,
Esperando sentado, pintado no quadro,
A face esperada no beijo medrado,
Velado, ó sim, sim perene ventura!


                       IV

Caminho, num caminho arrastado,
Com o suor gasto na algibeira,
Gemem sulcos, perdidos da ribeira….
Vagueia o terror imponderado!

Ah se te visses a partir,
Pelintra cósmico, derretido!
Vale bem o que tens vestido,
Malha do sempiterno dormir!

 

                      V


Mas eu fico, mitigando dor,
Fibras de sangue envolvidas,
Vísceras de vida despidas
Como seiva ausente de flor!

Ah divina estátua de mármore,
Em base fria de raiz,
Cobre-te um sonho flor-de-liz….
O palor rubro do sangue em mármore!


                       VI

Deste um passo fino, perpétuo.
Milímetros de distâncias abissais….
Juntam-se as mãos que abeirais,
Ao pescoço do fruto ósculo!

Suprema agonia, supremo gozo!
Já silencias bocas com falar.
Mutilas olhos com chorar.
Ah supremo dom, supremo gozo!

                                                                 Coimbra, 29 de Setembro de 1992

 

O MISTÉRIO DA DIVINDADE

                          I


Longos caminhos de campos funéreos,
Onde camponeses atiçam fervorosos,
As loucuras adiadas dos odiosos….
Estatelados em olhares aéreos!

De sol a sol, enxada ao ombro,
Um sorriso geométrico e logo matinal!
Uma persistência sem mácula, jovial,
Afunda o escapar pra aonde tombo….


                        II

Oh deus da infinita glória!
Fâmulo do teu poder marginal….
Oh deus de impotência sem igual!
Porque em nós reina a discórdia?

Só no céu azul te vejo meu
Desprendido nos raios meigos do sol.
Minto. Também é fixo o rouxinol,
Neste corpo, também o escuro do céu é teu!

 

                       III


Trabalham em perdida constância,
Auréola da víbora repelida,
Sintoma da miséria expelida,
Conservais toda uma infância!

Só nos campos, cearas lindas….
Os olhos dele fazem milagres, só aí!
Misturei deitado o halo meu, mas traí
As fantasias da torre de vidro ruídas


                     IV

Vem por mim uma vez bramido,
Vem opor-me ao pecado sombrio,
Vem ver-me como sou próprio,
Eu a cinzel, manturo esculpido!

E se puderes mistério benigno,
Culpa-me em grande força e vigor,
Destrói-me duma vez, água pra calor
De achas dum clarão maligno!


                                                          Coimbra, 30 de Setembro de 1992

 

O MISTÉRIO DO AMOR

                        I


Castelo de vidro dum condado,
Funciona assim o coração….
Gradeado na vala da oração,
Suplicando o olhar esperado!

Fugitivo preso no desassossego,
Aterrado ainda ontem na doçura,
Daquela que te vestiu de formosura,
Daquela que te amou com desapego!


                       II

Amar, amor…., amas-me?
Eu na fé disse-lhe que sim,
Beijei-lhe o rosto de carmim.
E insistiu ela, amas-me?

Cobriu-nos um tempo vagabundo,
Sufoquei o seu e meu amor….
Já chora ela…., perdoa flor,
Este ser que me cobre imundo!


                                                         Coimbra, 30 de Setembro de 1992

 

O MISTÉRIO DO ÓDIO

                            I


Sonolência desflorada nas trevas,
Refulgindo num lancinante espumar.
Virtude calejada, recalcada a sonhar
O veneno das rasas puras ervas!

É como se o mundo fosse regurgitado,
Afagado numa ondina pervertida!
Oh mundo das voltas duma só vida!
Oh cactos dum jardim de névoa regado!


                            II

Fervor de sangue emancipado,
Rompido em veias, cristo perdido,
Fel de susto…., cristo despedido!
Está ali um corpo assassinado.

Esvaído na poça, o tacto infame….
Vi-o eu, na esquina da desgraça,
Vi-o eu, emoldurado na sua graça….
Vi-o eu, o rosto que o mundo teme!

                                                                    Coimbra, 1 de Outubro de 1992

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terça-feira, junho 14, 2011 - 23:50

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