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A Democracia da Depressão
A DEMOCRACIA DA DEPRESSÃO
Jorge Linhaça
A depressão é uma das doenças mais democráticas que existem, junto às doenças infecto-contagiosas.
Depressão não escolhe idade, etnia, posição social, credo religioso, opção sexual , lugar onde se mora, se fuma, se não fuma e etc.
A depressão, ao contrário do que muitos ( inclusive governantes e alguns poucos "profissionais" da saúde ) pensam, não é uma doença burocrática que se resolve por meio de uma canetada num papel, do tipo:
O senhor ou a senhora vai ficar 15 ou 30 dias em casa, descansando, tomando fluoxetina ( mas não pode falhar nenhum dia e o efeito desta medicação é cumulativo, ou seja , seus efeitos só serão sentidos ao final desse período ) e depois retorne aqui para uma nova avaliação.
Até aí tudo bem...a prescrição pode estar totalmente correta.
Fluoxetina encontra-se em postos de saúde e etc , não é preciso nem desembolsar o dinheiro para conseguir o remédio.
As diferenças ficam por conta é do resto do tratamento.
Se você é uma pessoa abastada, é uma ótima oportunidade para um bom veraneio, sair de casa rumo a uma praia ou qualquer outro lugar, desligar o celular, ausentar-se dos problemas do dia a dia,
sem preocupações do vencimento do aluguel ou das prestações ou contas que precisam ser pagas. Leva seu jogo de cartões de crédito e preserva o corpo e a mente daquilo que o estava sufocando.
Se você, por outro lado, pertence à classe média, pode ser que nem possa viajar, dependendo de seu poder aquisitivo ou reserva de emergência.
Se puder é o caso de pegar o carro e sumir para algum lugar calmo, geralmente casa de parentes ou amigos dispostos a recebê-lo durante alguns dias.
Caso isso não seja possível, talvez um cineminha, caminhadas, uma baladinha ( pra quem gosta ) um fim de semana farofando, possam realmente ajudar.
Praqueles pra quem sobra mês no fim do salário o buraco é bem mais fundo...tirando uma pelada com os amigos no fim de semana, umas horas de sono a mais, um ou outro passeio a lugares calmos e relaxantes ou centros culturais gratuitos, não há muito mais o que se possa fazer. Esquecer os problemas então é impossível pois, quando a licença médica chega, na maioria dos casos, o vale transporte e o vale refeição fogem pela porta mais próxima.
Parece que quem sofre de depressão não precisa comer nem se locomover por aí.
Quem é funcionário público então, fica entre a cruz e a caldeirinha pois, na maioria dos órgãos públicos os seus vencimentos são compostos, não por um salário, mas por um salário base e uma série de abonos e benefícios como insalubridade, periculosidade e etc.
Entrou em depressão? Os benefícios e abonos desaparecem pelo períodos em que você esteja afastado, levando pelo menos 50% dos seus vencimentos.
Aí são duas as opções, vai-se trabalhar sabendo-se doente e rasgasse a licença médica ou ao fim desta seus problemas estarão multiplicados pela falta de dinheiro.
Para quem é , simplesmente pobre, resta aquela visita frequente ao boteco "da esquina" onde o cidadão enche a cara para "afogar as mágoas". Aí surge o fantasma do alcoolismo.
O uso de drogas de diversos tipos , como maconha, crack, Oxi, cocaína e tantos outros também está em boa parte dos casos ligados a um quadro de depressão emocional.
A depressão surge, muitas vezes, quando nos sentimos impotentes diante de alguma crise, seja ela financeira, familiar ou pessoal.
Outras vezes surge quando sentimos inadequação diante de um grupo com o qual necessitamos conviver por motivos profissionais ou sociais, o que nos leva a apelar para paliativos como o álcool ou as drogas.
Em fases mais agudas, a depressão se alia à famosa síndrome do pânico, quando perdemos totalmente o desejo de sair de casa ou mesmo de nossos quartos até mesmo para ir comprar comida.
A depressão, por mais desprezada que seja pelas pessoas e pelos órgãos competentes como uma doença séria, ocupa hoje o ponto de origem de muitos problemas sociais que se disseminam como pontos de fuga para os seus efeitos avassaladores.
O tão na moda "bulling" pode ser, ao mesmo tempo, causa e efeito da depressão.
Quem "bulliniza" pode fazê-lo em busca de um reconhecimento de um certo grupo de pessoas , já que não recebe a devida atenção em sua casa ou consegue destacar-se de outra maneira.
Já o "bulinizado" acaba por sentir-se inadequado para a convivência no grupo que o cerca e , cada vez mais , recorrer a um isolamento para tentar permanecer "invisível" aos seus agressores e outros membros de seu grupo social.
Depressão não é "doença de riquinho" ou de "funcionário vagabundo" , não começa da noite para o dia. Quando os primeiros sintomas visíveis se estabelecem , suas raízes já estão a muito tempo fincadas na alma dos que são atingidos por ela.
Quando pararem de tratar a depressão como um resfriado que se cura em 7 dias e derem a devida atenção às suas causas e efeitos, por certo que estaremos caminhando para uma sociedade melhor.
Doença não pode ser motivo de punição, de diminuição de proventos por parte das empresas e órgãos públicos. Quem está doente precisa, mais do que nunca de apoio e acompanhamento.
Mas, como a corda sempre estoura do lado mais fraco, o quadro que se nos apresenta hoje é de total descompromisso com a dignidade do ser humano.
Até mesmo em casa a coisa é complicada, os próprios familiares fazem pressão para que o "deprimido" deixe de frescuras e vá trabalhar ou procurar emprego pois acham que isso é desculpa para vadiagem.
Quem já sofreu ou sofre de depressão, sabe muito bem o quanto é fundamental um ombro amigo e um empurrãozinho para levá-lo para além das portas da penumbra onde encontra-se sua alma.
Um "empurrãozinho" é "levar pela mão" ajudá-lo a encontrar suas próprias respostas, tira-lo do círculo vicioso de sua mente, e não enxotá-lo de casa ou do seu meio como se ele fosse um cão sarnento.
Contatos com o autor
anjo.loyro@gmail.com
Arandu, 6 de Junho de 2011
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