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Visões de um Parapeito

Visões de um parapeito
Jorge Linhaça

Dia chuvoso em Porto Alegre...
Bah, acho que vou sentar no parapeito aqui do prédio e escrever, pensei eu...
E assim foi, devidamente acomodado no parapeito passei a observar
as pessoas lá embaixo, na rua...muitas andavam apressadas, corriam
até, para escapar da chuva teimosa que insistia em cair sobre eles.
O asfalto escurecido e a semi-escuridão causada pelas nuvens escuras
davam um ar de melancolia à cena.
Subitamente lembro-me de Quintana a falar dos cataventos, na verdade
os cataventos que vejo não são as saias rodadas das moças, mas os guarda chuvas coloridos a cobrir as faces e corpos daqui do meu angulo de visão.
Um catador de papelão sobe a rua, vestido de saco de lixo, na tentativa de
proteger o corpo da chuva. Besta-humana, a ser animal de tração de sua carrocinha,
onde carrega, quiçá, o sustento de sua vida marginal.
Os outros ignoram a cena, talvez já acostumados a ela.
Se eu não estivesse no parapeito talvez não lhe desse maior importância.
O salão de estética, na esquina oposta, continua seu movimento de mulheres
em busca da juventude eterna...contraste absurdo com o carroceiro.
Repentinamente percebo que algumas pessoas se dão conta de mim...
Primeiro dois homens na porta da agência de correio comentam algo entre si.
Depois uma janela do prédio em frente se abre e uma mulher me olha curiosa.
Do outro lado da esquina, primeiro uma moça e depois vários funcionários
de um possível escritório se juntam diante da janela com olhares assustados,
achando talvez que eu estivesse escrevendo um bilhete suicida,
imaginando qual seria o seu teor, as faces exprimiam uma preocupação mista de curiosidade, normal nesse tipo de situação.
Engraçado como as pessoas esperam sempre pelo pior...parecem mesmo ansiar ver uma cena
diferente para contar aos amigos durante o resto de suas vidas.
Permaneço mais um pouco de tempo ali, escrevendo, mas resolvo sair de meu
mirante improvisado antes que alguém incomode os bombeiros e a brigada militar.
Já imaginaram ser capa do Zero Hora, ou do Diário gaúcho com uma singela manchete:
"Escritor suicida resgatado no Centro de POA".
A minha foto logo abaixo, na escada dos bombeiros, com uma legenda do tipo...
"Jorge Linhaça foi impedido a tempo de cometer suicidio, pelos valorosos soldados do fogo".
Ninguém merece...
Mas quem sabe assim eu não ia parar no programa do Jô?
Huummm, é um caso a se pensar....
 

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sábado, maio 21, 2011 - 17:07

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Jorge Linhaca

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