O Homem duplo

Quem olhar para si vê duas almas,
Porque cada pessoa são duas diferentes
Que convivem numa terceira, unidas,
Numa só alma existentes.

As três foram postas num lugar
Que toma o nome de Vida,
E em que procuram encontrar
Outras três ou mais ainda.

O ser humano era menos gente
Quando um só se chamava;
Mas tornou-se Homem de repente
E precisou de mais uma alma.

A alma que temos é outro ser.
As pessoas são elas mesmas e elas próprias
E a cada momento tentam entender
Quem manda no corpo, das duas.

Quando o homem se tornou humano
Por dois passou a valer;
Mas em lugar de se tornar duplo
Mais individual decidiu viver.

Quanto mais unidas, mais distantes,
As facetas da individualidade
Constantes zaragatas interiores
Afastando a alma da realidade.

Debruçado sobre si mesmo, alheado,
O homem particular corrói o colectivo
Porque o destrói o conflito continuado
Entre ele mesmo e ele próprio.

Vivemos num mundo desconhecido
No conhecimento uns dos outros,
Rumando as almas num só sentido,
Cujo destino desconhecemos todos.

Num mundo que alguém nos deu
Acompanhamo-nos a sós:
É preciso deixar de ser eu
E passar a sermos nós.