Poesias Inéditas - Deixo ao cego e ao surdo

Deixo ao cego e ao surdo

Deixo ao cego e ao surdo
A alma com fronteiras,
Que eu quero sentir tudo
De todas as maneiras.

Do alto de ter consciência
Contemplo a terra e o céu,
Olho-os com inocência :
Nada que vejo é meu.

Mas vejo tão atento
Tão neles me disperso
Que cada pensamento
Me torna já diverso.

E como são estilhaços
Do ser, as coisas dispersas
Quebro a alma em pedaços
E em pessoas diversas.

E se a própria alma vejo
Com outro olhar,
Pergunto se há ensejo
De por isto a julgar.

Ah. tanto como a terra
E o mar e o vasto céu,
Quem se crê próprio erra,
Sou vário e não sou meu.

Se as coisas são estilhaços
Do saber do universo,
Seja eu os meus pedaços,
Impreciso e diverso.

Se quanto sinto é alheio
E de mim sou ausente,
Como é que a alma veio
A acabar-se em ente ?

Assim eu me acomodo
Com o que Deus criou,
Deus tem diverso modo
Diversos modos sou.

Assim a Deus imito,
Que quando fez o que é
Tirou-lhe o infinito
E a unidade até.

Fonte: http://www.secrel.com.br/jpoesia/fpesso.html

Submited by

Friday, September 25, 2009 - 15:30

Poesia Consagrada :

No votes yet

FernandoPessoa

FernandoPessoa's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 13 years 46 weeks ago
Joined: 12/29/2008
Posts:
Points: 745

Add comment

Login to post comments

other contents of FernandoPessoa

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Mas eu, alheio sempre, sempre entrando 0 980 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Mas o hóspede inconvidado 0 1.094 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Minha alma sabe-me a antiga 0 1.174 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Minhas mesmas emoções 0 1.830 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Minha mulher, a solidão 0 805 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Na noite que me desconhece 0 374 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Não digas nada! 0 765 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Não quero rosas, desde que haja rosas. 0 1.104 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - No Fim da chuva e do vento 0 667 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - O abismo é o muro que tenho 0 697 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - O Amor 0 826 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Fito-me frente a frente ( I ) 0 717 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Fito-me frente a frente ( II ) 0 414 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Flui, indeciso na bruma 0 654 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Glosa 0 819 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Glosas 0 744 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Gnomos do luar que faz selvas 0 940 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Gostara, realmente 0 1.241 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Gradual, desde que o calor 0 786 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Grande sol a entreter 0 983 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Há uma música do povo 0 673 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Já ouvi doze vezes dar a hora 0 520 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Há um frio e um vácuo no ar 0 920 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Ladram uns cães a distância 0 1.002 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General Poesias Inéditas - Em torno ao candeeiro desolado 0 682 11/19/2010 - 16:55 Portuguese