O meu olhar, de O Guardador de Rebanhos - II (Fernando Pessoa)

O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás...

E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...

Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...

Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender ...

O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,

Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...
 


Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa), In: O Guardador de Rebanhos, parte II.
 

Submited by

Jueves, Marzo 3, 2011 - 12:04

Poesia :

Sin votos aún

AjAraujo

Imagen de AjAraujo
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 6 años 30 semanas
Integró: 10/29/2009
Posts:
Points: 15584

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of AjAraujo

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Poesia/Dedicada Auto de Natal 2 2.309 12/16/2009 - 02:43 Portuguese
Poesia/Meditación Natal: A paz do Menino Deus! 2 4.007 12/13/2009 - 11:32 Portuguese
Poesia/Aforismo Uma crônica de Natal 3 3.268 11/26/2009 - 03:00 Portuguese
Poesia/Dedicada Natal: uma prece 1 2.488 11/24/2009 - 11:28 Portuguese
Poesia/Dedicada Arcas de Natal 3 4.073 11/20/2009 - 03:02 Portuguese
Poesia/Meditación Queria apenas falar de um Natal... 3 4.672 11/15/2009 - 20:54 Portuguese