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CHOCALHO DE SAUDADE
O silêncio é a multidão que resta
pela fria calçada encascalhada de vazio
nas ladeiras desentendidas na cascata do pensar,
é a mais rude aresta em ruinas num sorriso
que envelhece pelas esquinas
da eternidade.
É o silêncio o mais inóspito ar,
por onde indiferente o olhar voa
esquecido à toa pelo chão de outroras,
por onde sujo de tantas horas de outras vidas,
o sentir, é o frágil casco de uma canoa de solidão
cuja proa a pique cai em cruas vertigens de desilusão.
É o silêncio o mais fino
e puro fio condutor das sombras
que me alagam o sol da alma com lágrimas,
gotas de quase sangue desgarradas pelo pulsar
de andares por aí calçados de nada.
É o silêncio
o mais engrenado chocalho de saudade,
onde a verdade agita todas as lamas da morte,
ócio assente no fundo de um infinito findo
em indo que caminha sobre mais indo
até chegares que fraudam sonhos.
Está nas mãos do silêncio o afago
que afaga as entrelinhas do quotidiano
onde medonhos agoras jazem irrequietos,
sinfonia só, vento
encorpado de ásperas poeiras,
fogueiras de insanos tactos
que escurecem os tectos da noite,
que acontecem no golpe de um açoite
de acordada insónia nos serões da ansiedade,
brincadeira endurecida pelos barros do tempo,
pontapés pontapeados por derrocadas
de desespero em dor.
Pisca-pisca no silêncio lembranças
que estalam como pipocas
no caldeirão da vida.
É o silêncio a última onda
que rebenta aos pés da poesia
nas praias de imperfeitas musas,
caverna de tusas e tosses
onde os lábios gritam por amor,
onde o corpo sem eco se enruga de tristeza.
.
.
Henrique Fernandes
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