MEDO DO AMOR

MEDO DO AMOR

Passo a passo
sentimos a areia da praia
desfazer-se debaixo dos nossos pés.
Olhar em olhar
sentimos a cor do mar
envolver os nossos corpos.
O vento sopra forte
abana o meu carro
e eu não estou
sexualizando nenhuma mulher
apenas existe a cumplicidade
de um beijo devastador
e as carícias das mãos
procurando abraçar o vazio
que nos preenche a vida.
A música soa docemente
nos suspiros dos nossos corpos
transpirando desejo
falando de sonhos
há muito acabados.
Os nossos cabelos esvoaçam
por entre os dedos
e as nossas bocas
bebem fluídos loucos
e as nossas pernas
dançam a canção
do desespero sentido
por falta de liberdade.
Nossos corações abrem janelas
mas fecham as portas
que nos poderiam levar
ao tempo do antigamente

onde para amar
não era preciso ter fé.
Hoje o amor não é cego
é calculado ao minuto
razão de existirmos no passado.
O futuro existe nos sonhos
mas sonhar é incorrecto
a vida faz-se pela matemática.
Seguir a corrente dos sentidos
no momento do tempo exacto
é a única verdade
todo o resto como a poesia
é simplesmente utopia.
A loucura não existe
nem mesmo na própria loucura
de sermos loucos.
O amor não existe
amordaçamos o amor
com as feridas do passado
com o medo da felicidade.
É humanamente correcto
vivermos o segundo o minuto
o dia que acontece
o amanhã poderá ser fatal
o mês seguinte nem pensar ...
não irá acontecer.
A vida não tem alicerces
é apenas pré-fabricada
compra-se em grandes superfícies
de preferência a crédito
o pronto pagamento caducou
letras livranças
transferências permanentes
que o amor é efémero.
A angústia de começar de novo
sufoca-nos a mente
liberta-nos os sentidos
enclausuramo-nos no medo
como se ter medo

fosse uma bandeira ao vento.
Venha donde vier
a brisa fresca da noite
torna-nos mais crianças
e o pavor de sermos inocentes
o desespero de cairmos na lama
e não termos força que nos levante
faz de nós a merda que somos.
De que nos vale
a felicidade do momento presente
se para o ano estaremos sós.
Fazemos dos nossos sentimentos
raízes quadradas e equações
quando tudo é simples
como um sorriso
ou mesmo darmos as mãos.

02. 01. 2003
in MEDO DO AMOR
Jorge d'Além-Mar