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MISSIVA ESCRITA EM FOGO PRECOCE

Madrugada delineada como teia
em desenho que se pinta insípido bafo de insónia.

Pretenso descalabro da identidade
das estrelas que se desfolham inquietas
como candelabro em estouro no calendário.
Pombo-correio sem poleiro em deserto aberto em pranto.

Rara gente parada em curva recta pela noite,
povo anárquico em propaganda ao impossível.
Lúmen que se arrasta e transpira nas minhas veias.
Vozes como tentáculos ébrios a engasgar a ceara do cérebro.

Cintilar que se abriga na barriga do mundo.
Como mar profundo esconde as correntes do tempo. 

Cor fera cujo pigmento encera a hipocrisia
do arco-íris amputada ao senso da tolerância. 

Ausência como ponte
de despedida das margens cruas.
Descompassadamente nuas em espera.

Missiva escrita em fogo precoce.
Aspecto hirto de um rio pendurado
entre a nascente do sol e a foz do dia.

Mar de horas à deriva, querela absurda,
surda ira num ai de mármore na esquina da mentira.

Anestésica dor, louvor duro.
O amor como furo entupido de lugares ridículos.

Mecanismo de beijos rotos,
desfasados na sequência carrossel dos lábios.
Saliva inconsciente, fel latente no gesto das mãos.
Como barco sem âncora no recife áspero dos olhos.

Telhado encalhado na sombra da chuva.
Eixo de silêncio que arde num fósforo de perfeição.

Maré que limpa
a praia dantesca da alma,
sentir que suja e deita fora o corpo
como alga morta na borrasca da vida.

 

 

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sábado, outubro 29, 2011 - 20:24

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Henrique

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