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A coragem de um pequeno ser...e a crueldade do mundo...

Em nossa casa sempre houve animais de estimação porque havia amor suficiente para toda a gente! Desde pequeno que alimenta o sonho de um dia vir a ser bombeiro tal como o seu grande herói, o pai. Teve uma infância feliz, como a maioria das crianças têm… ou deveriam ter. Mas… foi uma infância difícil…pois o destino pregou-lhe uma partida, o que fez com que este menino se transformasse num pequeno homenzinho.
Este menino, igual a tantos outros, preferia ir jogar à bola do que ficar em casa fechado a estudar! Mal chegava da escola a primeira coisa a fazer, depois dos trabalhos de casa, era ir para o Terreiro jogar à bola. Não importava que estivesse frio, o mais importante era ter uma bola para dar um chutos. Penso que, as crianças são o melhor do mundo pela sua simplicidade. Pela forma, tão única de serem felizes. Não é difícil proporcionar um momento de realização a uma criança, basta gostarmos dela e mostrarmos-lhe o quanto é importante para nós. E, no caso do Hugo, a sua felicidade residia numa bola e num local para jogar.
Nunca fui uma pessoa rica, isto é, com muito dinheiro, mas sempre me considerei a pessoa mais afortunada do mundo por ter uma rica família. Em nossa casa nunca abundou dinheiro e eu sempre soube que isso não era mais importante. Sempre fui muito feliz, sempre me considerei uma sortuda por pertencer a esta família. O mais importante para nós era que todos gostássemos uns dos outros e que todos nos sentíssemos bem. O dinheiro não compra felicidade e isso era algo que nós tínhamos presente sempre que ficávamos tristes por não termos aquele brinquedo que dava nas publicidades de Natal ou por não andarmos com roupas de marca. Tudo isto era acessório quando comparado com todo o carinho e amor que recebíamos em casa. Tudo isto era compensado pelos momentos que tínhamos em família e pela união que sempre nos caracterizou.
Penso que, todos os meninos do mundo deveriam ter experiências destas nem que fosse uma vez na vida. Toda a gente deveria viver experiências de carência ao nível material para que conseguissem reflectir sobre o que realmente é importante na nossa formação como pessoas.
Quando somos pequeninos não temos consciência de todo o esforço feito pelos nossos pais para nos proporcionarem uma qualidade de vida excelente onde não nos falte nada. No entanto, quando os pais dão tudo aos filhos só para compensar a infância com carências que eles tiveram estão, ainda que, inconscientemente, estão a cometer um grande erro. Estes brinquedos todos que as crianças têm faz com cresçam a pensar que é tudo muito fácil, é só pedir ou fazer uma birra no supermercado junto à estante e atirarmo-nos para o chão que conseguimos convencer os nossos pais a darem-nos tudo. Não interessa se existem ou não possibilidades de dar, não interessa que esse brinquedo seja equivalente a quase um mês de trabalho do pai, o que interessa é dar tudo do bom e do melhor aos nossos filhos.
No entanto, no nosso lar sempre tivemos presente que não podemos ter tudo o que queremos, nem devemos pedir coisas muito caras, porque o dinheiro não chega para tudo e o dinheiro de um brinquedo nosso dá para comprar outras coisas que fazem mais falta em casa. Acima de tudo sempre tivemos o essencial e sempre nos contentámos com aquilo que os nossos pais nos davam, porque sabíamos o esforço que tinham feito para conseguirem dar-nos aquilo e porque não havia prenda melhor do que ser feliz com a nossa família.
De nós os três, o Hugo sempre foi o mais travesso e o mais malandro, mas até nem se portava mal na escola e todas as professoras o consideravam um menino muito querido. Em todas as reuniões de pais era realçada a boa educação dele, o que confrontava com o facto de ele ser um pouco preguiçoso e não gostar muito de Língua Portuguesa. No entanto, a matemática era a sua área preferida e gostava imenso de cálculo mental. Podia considerar-se um aluno com um desenvolvimento dentro dos padrões normais.
No segundo ano de escolaridade o Hugo começou a ter alguns problemas na escola. Nas aulas fazia os trabalhos com alguma lentidão. Quando estava acompanhado por alguém que o vigiava ele trabalhava muito bem e fazia os exercícios correctamente, mas quando a professora o deixava sozinho distraía-se muito. Esta sempre foi uma das características do Hugo, sempre distraído, com a cabeça no ar. Havia até quem dissesse que ele tinha jeito para ser astronauta, por andar sempre na lua e “conhecê-la tão bem”. No entanto, algo ali não estava bem! A professora começou a desconfiar do processo de aprendizagem do Hugo. Aquela distracção não era igual à dos outros meninos da sala, tinha uma particularidade. Ele estava a fazer o exercício e depois distraía-se, mas quando “voltava à terra” sentia-se perdido, como se voltasse de outra galáxia.
A mamã sempre fora muito atenta na nossa vida e em particular na escola. Dizia que a escola era o nosso futuro. Se estudássemos haveríamos de ter um futuro melhor do que o dela e o do papá. A nossa educação sempre foi a prioridade da família.

Lembro-me de entrar para o décimo ano e ouvir os meus pais dizerem que embora soubessem que eu tinha capacidades para chegar longe não sabiam se eu poderia ingressar na universidade porque estava para além das suas possibilidades económicas. Como mandar uma filha estudar para fora? Sempre foi um dos meus grandes sonhos ir para a universidade e tirar um curso ainda que não tivesse definida a área de estudos. Gasta-se muito dinheiro na faculdade.. propinas, alojamento, gastos pessoais, …. Teriam de manter duas casas! Era impensável! Com um ordenado pequenino do meu pai e umas hora que a minha mãe ia fazendo era impossível! Eu não queria que lhes faltasse nada aos meus irmãos para eu vir estudar para fora! Mas se eu viesse claro que lhes faltariam bens! Quando cheguei ao décimo segundo os meus pais apoiaram-me e hoje tenho um curso! Claro que há sacrifícios que foram feitos, imensos! Mas a força de vontade perdurou sempre e a prioridade é o curso e a minha futura formação! Com muito sacrifício claro, mas só assim é que odu valor a tudo o que consegui até hoje! Só com sacrifício é que consegues dar valor ás coissa que consegues! As facilidades não são muito pedagógicas! À dias li um livro de Javier Urra que dizia que os pais comeram restos e agora continuam a comê-los porque dão o melhor aos filhos.
- Quem estuda e luta por aquilo que quer, acaba por ser recompensado - dizia ela.


Passava-se alguma coisa! Não era normal o que se estava a passar com o Huguinho. A professora, como excelente profissional que era tinha de fazer alguma coisa, pois havia qualquer coisa que não batia certo. Marcou, através da escola, uma consulta no hospital distrital e fez alguns exames.
Passado algum tempo descobrimos que o Hugo tinha um colapso na memória. Aparentemente nada que o fosse prejudicar muito. Com alguma medicação o problema seria resolvido. Durante, mais ou menos, cinco anos o Hugo foi bombardeado com três comprimidos por dia. Como era possível, um menino tão pequeno ter que andar a tomar aquela medicação toda.
As ausências à escola foram-se multiplicando e o Hugo foi perdendo alguma matéria. As suas idas ao hospital distrital deixavam-nos completamente desregulado, pois a viagem era longa e o seu estômago não aguentava. Cada vez que tinha que ir ao hospital era um dia perdido porque vomitava sempre e quando chegava a casa já não tinha disposição para o que quer que fosse.
Este ano havia sido um pouco estranho e como tinha faltado às aulas a professora pensou que, fazer novamente o segundo ano seria favorável ao seu futuro escolar.
O último dia de aulas é sempre um dia de muita euforia, grande diversão e muita descontracção para quase todos. Ao contrário de todos os outros meninos da escola o Hugo sabia que ia reprovar e por isso não se sentia feliz.
Quando somos pequenos não encarámos a perda como uma aprendizagem, mas sim como uma derrota e o huguinho sentia-se derrotado. Parecia que o mundo se tinha virado contra ele. Ele não tinha culpa de ter faltado aquele tempo todo à escola, não tinha culpa de ter ido ao médico! Mas, o facto é que era o único naquela escola, com pouco mais de vinte alunos, que tinha reprovado. Sentia-se incapaz, pequenino e sem vontade de voltar outra vez à escola. É difícil quando, pela primeira vez, enfrentamos um desafio e os nossos pais não podem resolvê-lo por nós.
A vida por vezes é cruel, mas só com essa crueldade é que crescemos. Não é fácil enfrentarmos nós próprios os desafios. Nunca pensei que reprovar fosse assim tão prejudicial para a vida de alguém. Só quem vive um desafio assim é que sabe como é difícil! É complicado ser o único! Ser diferente! Ainda mais quando somos pequeninos e indefesos.
Quem vive na cidade não nota muito, como, por vezes é complicado ser diferente, mas quem vive numa aldeia sabe-o tão bem quanto eu. Uma aldeia é como se fosse uma família grande. Uma família onde toda a gente se conhece e onde todos sabem a vida uns dos outros. Essa proximidade, como tudo na vida, tem o seu lado bom e o seu lado mau.
No caminho da escola haviam campos de cultivo e quando as crianças passavam as pessoas perguntavam:
- Então, houve alguma raposa este ano?
- Houve só uma, o Hugo. – diziam as crianças, continuando o seu caminho para casa.
O Hugo vinha mais atrás acompanhado pelo seu sofrimento e pelo sentimento de medo que sentia com a reacção dos pais. Cabisbaixo, questionava-se como seria que os pais iriam reagir ao facto de ele ser o único a reprovar.
Quando chegou a casa notámos o seu aspecto derrotado e a sua expressão de tristeza. Era difícil não perceber que o huguinho, uma criança sempre alegre e com um sorriso estampado no rosto, se encontrava triste e se sentia mal. Enfiou-se no quarto e deitou-se na cama.
Não era normal ver o Hugo a deitar-se na cama depois de chegar da escola. A primeira coisa que ele queria ir brincar à bola para o Terreiro. Como era possível no último dia de aula o Hugo estar tão triste, por se ver livre, durante dois meses, das aulas. Este facto preocupava-nos. Mas como as mães têm o dom de arrancar de nós toda a verdade apenas quando olhamos para elas a mamã foi ao quarto ter com ele para perceber o que se passava.
- O que tens Huguinho? Porque ‘tás triste?
- Por nada…
- Por nada ninguém fica triste! Conta à mamã o que tens. Senão contares eu não te posso ajudar a resolver esse problema.
- Mas eu não tenho nada! Deixa-me! Eu só tou cansado! – retorquiu o Hugo.
- Não quero que estejas assim! Não queres ir brincar lá para fora? Está um solzinho tão bonito e tu ‘tás aqui fechado… nem parece teu!
- Eu só ‘tou assim porque fui o único a reprovar…- disse o Hugo com os olhos cheios de lágrimas.
- Oh filhinho! Não é preciso ficares assim! Ninguém te vai bater, nem ralhar porque reprovaste! Ás vezes até é bom ficarmos um ano na escola primária, porque depois nos anos seguintes a matéria já está bem sabida. Uma boa escol,a primária feita é essencial para ter sucesso nos estudos.
- Não vou ficar de castigo? Vou poder ir para a piscina na mesma?
- Claro que sim. Essas coisas às vezes acontecem! É normal! Mas nunca vais ficar de castigo por causa disso! Anda – agarrando na mão do Hugo - agora vais lavar a carinha e as mãos e vais brincar um bocadinho que logo comemos um gelado.
O facto de chorar não quer dizer que estejas no fundo do túnel. Por vezes estamos a sofrer mais quando estamos silenciosos. O sofrimento que não “sai” com as nossas lágrimas acumula-se no coração e dói mais.
E com um abraço daqueles que só a mamã sabe dar acalmou o huguinho, pondo de parte qualquer hipótese de castigo nas férias e mostrando-lhe que não era o fim do mundo.
Nenhum medicamento no mundo tem tantos poderes anti-depressivos como os abraços da nossa mãe ou do nosso pai. Às vezes quando nos sentimos em baixo e tristes, basta que a nossa mãe ou o nosso pai nos diga as palavras que só eles sabem dizer para nos sentirmos melhor. Todas as crianças do mundo deviam ter uns pais como os meus e uma família como a minha. Se assim fosse não haveriam tantos problemas como existem.
Aquele Verão decorreu calmamente. Todos os dias tínhamos coisas para fazer. As nossas férias sempre foram pautadas por pequenos projectos. Sempre nos contentámos com as férias em casa. Sempre nos apercebemos de que o mais importante que tínhamos não eram brinquedos, mas sim a nossa família e podermos contar sempre com eles para tudo. Sempre fomos uma verdadeira família, não só porque éramos pais e filhos, mas sim, porque todos desempenhávamos o nosso papel de filhos e pais como tinham de ser desempenhados. Claro que haviam zangas e nem tudo eram rosas, mas tudo era sempre resolvido através do diálogo e da compreensão. Ninguém julgava os actos de ninguém, tentávamos pôr-nos no lugar da outra pessoa. Mas o mais importante é que os valores estiveram sempre presentes na nossa vida e nas nossas aprendizagens. Não era importante termos muito dinheiro, porque há coisas que o dinheiro não paga. Além disso, o dinheiro vai e vem e a família se for unida fica para sempre.
O Hugo em Setembro voltou à escola. Ele sabia que aquele iria ser um ano um pouco difícil pois sabia que de todos os meninos da escola era o único repetente. Ao longo desse ano ele foi ouvindo comentários que o deixavam em baixo. As outras crianças, por vezes, chamavam-lhe “burro”. Esta é uma palavra que dói ouvir, pois sentimo-nos incapazes, sentimo-nos em baixo.
Por vezes ponho-me a pensar como é que é possível que uma palavra, algo imaterial, nos possa magoar tanto. Somos humanos e segundo a religião somos todos irmãos, mas muitas vezes não nos apercebemos que nos vamos destruindo uns aos outros com a nossa crueldade, muitas vezes sem nos darmos conta disso.

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quinta-feira, janeiro 13, 2011 - 15:08

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andreia fernandes

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muitas vezes sem nos darmos conta disso

Muita verdade nas suas palavras, até nas entrelinhas está presente o essêncial para que tudo esteja no lugar certo!!!

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