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OS GÉMEOS - 24

.

 

(continuação)

 

— Doutor William, hoje completo trinta e cinco anos. — fora Hana de propósito dizer-lhe, mal o vira a atravessar o descampado que separava as traseiras do seu contentor de alojamento e o cercado de altas estacas de sebe, no interior do qual estavam instaladas as gaiolas e os tanques de cobaias que ele utilizava nas suas experiências.

— E eu que não me lembrei! Hana!... Muitas felicitações! — respondeu William, reprovando-se pelo seu esquecimento, e oferecendo-lhe um abraço amistoso. — Socialmente sou um desastrado! Louise é que é a culpada porque me habituou a desleixar-me, tendo sempre de véspera uma palavrinha de lembrança... desta vez...

— Está perdoado. Até eu própria me ia esquecendo. Louise é que telefonou para cumprimentar-me. Quer que vamos jantar com ela e diz que me responsabiliza se eu não for capaz de o levar comigo! Por isso, hoje tem de ir.

— Irei com prazer, se isso lhes agrada.

— Espero que não lhe faça transtorno. Por mim, vou ter de adiar uns testes que estava a prever para hoje, e... esta idade já não é muito de comemorar, não é?... Mas ela insistiu tanto...

— Você está ainda uma jovem, Hana!... E muito bonita! — retorquiu William, achando que na circunstância não estava a dizer nada de bajulador, porque eram da mesma idade e ele ainda se julgava um rapaz de uns vinte e poucos anos, e por aquilo que na realidade estavam os seus olhos a confirmar nesse mesmo momento: quando Hana entendia assumir-se mulher antes de estrénua cientista, mostrava um encanto que excedia muito qualquer expectativa baseada na sua mera feminilidade.

— Obrigada! Gostei de ouvir isso... Foi um lindo presente de aniversário!... Vaidade! Vaidade!... Conto consigo logo. A ideia é distrairmo-nos um pouco.

— Pois sim. Vaidoso estarei eu, a exibir-me convosco.

Vaidoso, mas aperreado, e depois algo enciumado, foi como ele passou grande parte da noite. Vaidoso porque tanto Louise como Hana, combinadas ou não, se prepararam e apresentaram de modo a revelarem formosura. Mesmo provocantes, atraindo sobre eles todas as atenções durante o jantar, interrompido por constantes manifestações de simpatia e de felicitações de gente de Lameira Grande. Aperreado porque se apercebia que aquelas mulheres, invejáveis, que por divertimento mais se comportavam como se fossem suas naturais amantes do que apenas colaboradoras de trabalho, tinham direito a merecer dele, com mais regularidade, outra solicitude que as não deixasse estiolar devotadas às ordens da sua voluntária solidão — é claro que ele desconhecia as noitadas folgazãs que ambas se prodigalizavam com frequência. Ciumento porque mais tarde, então já longe da suburbanidade de Lameira Grande, a exuberância delas fez a tentação de muitos estranhos que mesmo debaixo do nariz dele se excitavam galanteando-as, as levavam para dançar e ousavam familiaridades embaraçosas.

Às cinco da manhã — algo miraculosamente regressados a salvo ao complexo, tal a semiembriaguez de champanhe com que cada um deles no seu bocado de percurso reconduzira o jipe para casa — foram surpreendidos por Zirá, aterrorizada pela sua própria angústia e embasbacada pela descomedida cena de nudismo que encontrou, andavam eles ainda em barulhenta e festiva recreação a jogarem à cabra-cega nos aposentos de William.

Ele, foi o que primeiro deu conta da estranha presença de Zirá àquela hora, não como de costume a abrir a porta e a introduzir-se lá dentro, sorrateira, com os olhos a brilharem de marotice e logo um altear de cabeça e um suave passar de mão pela anca a imitarem indiferença e a desafiarem-lhe atrevimento, mas antes parando à entrada, braços cruzados sobre o peito, desgrenhada e desatinada. A cabeça dele não estava sóbria, mas era sem dúvida Zirá!

Estupefacto, viu-a cambalear e cair desmaiada, e só então Hana, a quem o súbito estacar de brincadeira por parte dele como que alertara para algo intrigante, tomou consciência de Zirá e da sua própria nudez e correu a abraçar-se nas costas de Louise, como se mais não houvesse a fazer do que esconder-se.

Louise, vendada, rindo-se, estentórea, deitou um braço atrás e prendeu-a e ainda revolteou o corpo e a estreitou, mas, ou o silêncio deles ou a sua intuição alertaram-na e com brusco movimento tirou a venda dos olhos e também ficou tolhida de pejo.

Já William se ajoelhara junto de Zirá — descuidadamente impudico perante a mulher, em razão da mútua intimidade — e com atrapalhação tentava reanimá-la, quando Hana e Louise ressurgiram do seu embriagado embotamento, acorrendo a prestar socorro, pressurosas mas com os sentidos numa perturbação um tanto inelutável.

O gesto, imperativo e sem palavras, que ele lhes dirigiu querendo significar que lhe chegassem um copo de água, e porque mudo apontava inconsequente para a porta, foi interpretado como uma ordem para que se retirassem dali, e numa reacção automática ambas correram para o exterior, mesmo sem terem compreendido que o que ele pedia era ajuda para recompor Zirá e nem lhe passara ainda pela cabeça que não havia recato nenhum na figura deles todos.

Enquanto levava Zirá, para a deitar com todo o cuidado em cima da cama, ela recuperou os sentidos e debateu-se como se pretendesse soltar-se dele, e isso desequilibrou-o, fazendo-o cair junto com ela sobre o leito, a força a escassear-lhe e um trejeito de sofrimento a assomar-lhe ao rosto, pelo esticão repentino num braço atrancado debaixo dela. Então, atingido pela dor, desanuviou-se-lhe a mente e conseguiu perguntar:

— Que é que foi, Zirá? Aconteceu alguma coisa?

— Aconteceu, mon amur... Infelizmente aconteceu... — respondeu Zirá, depois de ligeira hesitação e da rápida e incrédula mirada com que se certificara que afinal não estavam ali nem Hana nem Louise e fora ela que imaginara a rocambolesca visão que tivera momentos antes. E perdeu-se num choro convulsivo, abraçando-se a ele com impetuosidade, sacudida de tremores, a boca a sufocar-se no peito dele para conter os gritos que ameaçavam explodir num chinfrim tumultuoso.

— Mas, o quê, Zirá? O que é que aconteceu?... Diz-me. — insistiu William, quando achou já lhe ter sustentado por minutos tão angustiada comoção.

— Uma desgraça!... Uma desgraça! Mataram o Zeca...

— Mataram o Zeca?! — repetiu ele, perplexo, como se a frase não tivesse conteúdo, conseguindo por fim desapartar-se dela e reclinando-a carinhosamente na cama.

— En... en... en... — recomeçou ela a fungar, agora choramingando, olhar encovado coberto por uma das mãos enquanto a outra, dedos entrelaçados nos dele, fazia mimos na perna de William.

 


 
(continua)

Escrito de acordo com a Antiga Ortografia

 

.
 

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sexta-feira, maio 10, 2013 - 14:09

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Nuno Lago

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