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Rapoesia do Marginal
Quando o som vem revelando-se concreto,
Como sempre inclina-se meu tímido farelo.
Deixo ao lado o sujo cobertor;
Entrego-me ao sonho-filme de terror.
Nas calçadas já existe o real do movimento;
Meu corpo treme, nada mais que o frio vento.
A barriga, igual o ontem, ficará vazia.
(Isso era simples, muito não me afligia).
Ao lado, o shopping veste a forma do futurismo
E o capital movimenta o nosso egoísmo.
Sujo, rasgado e do lado de fora
Peço uns trocados, quero a minha esmola.
Valeu! “brigado”! Deus que pague!
Nossa relação não é sacanagem!
Ando pelas ruas sem rumo certo,
Já acostumei-me com a violência por perto.
O ponto está cheio, minha camisa manchada,
As pessoas parecem entender minha desgraça.
Numa padaria ganho uma rosca.
Legal! veio de brinde uma mosca.
Atravesso as ruas: será ilusão?
Os carros querem ver-me no chão.
Em frente um camelô discute com a polícia,
Uma relação cheia de malícia,
Até que o cassetete levanta a sua voz.
As águas do rio chegam a sua foz.
Às filas de banco não tenho acesso,
Não sou capitalista. Um mendigo esperto.
Os correios pra mim não têm utilidade.
Não sei escrever. E pra qual localidade?
A barriga vazia novamente ronca,
Demorou anoitecer, quero dar uma bronca.
A promessa era sempre trazer a sopa,
Quem sabe tenho sorte e ainda ganho outra mosca!
Sei que assunto de mosca está repetido.
Vê lá se entende: abstrações de um mendigo.
Alguma esquina surpreende-me com ameaça,
Às vezes tenho o socorro da garrafa de cachaça.
Nas madrugadas vejo fotografias no céu.
Não sou exigente! são imagens ao léu.
Nada de sofrimento em cor;
Minha vida: pinturas além de dor.
Sou o espelho natural da rua,
Vivo na pureza da clareza crua.
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