José Rodrigues dos Santos - Fúria Divina (Perspetiva Muçulmana)
"A mensagem de Alá é uma mensagem de bondade, de piedade e de tolerância. No último sermão que fez antes de morrer, Maomé disse: «Não existe superioridade de um árabe em relação a um não árabe, nem de um não árabe sobre um árabe, nem de um branco sobre um negro, nem de um negro sobre um branco, excepto a superioridade que se obtém através da consciência de Deus»."
"Quando Maomé disse que não havia superioridade de raças, estava a dizer o que vem no Alcorão."
"Claro."
"Mas, xeque, nessa mesma frase o Profeta torna claro que, não havendo superioridade de raças, há superioridade no islão. O que o apóstolo de Alá diz é: não há superioridade entre os homens «excepto a superioridade que se obtém através da consciência de Deus». Ou seja, os muçulmanos são superiores. Alá diz na sura 3, versículo 19: «A religião, para Deus, é o islão.»"
"Claro, o islão é a submissão a Deus. Quem se submete a Deus é superior. Mas lembra-te de que os Adeptos do Livro também têm consciência de Deus..."
"É uma consciência deturpada pelos rabinos e pelos padres, xeque. Não é a verdadeira consciência. Eles só têm conhecimento de Deus através de intermediários, não de forma directa, como nós."
"É verdade", reconheceu o mestre. "E então?"
"Isso mostra que não somos todos iguais, xeque."
"Admito que não", reconheceu Saad.
"Mas lembra-te que Alá diz na sura 2, versículo 62: «Na verdade, os que crêem, os que praticam o judaísmo, os cristãos e os sabeus - os que crêem em Deus e no Último Dia e praticam o bem - terão a recompensa junto do seu Senhor. Para eles não há temor.» A mesma mensagem é repetida em dois outros versículos. Como vês, as pessoas boas dos Adeptos do Livro serão recompensadas por Alá. Isto mostra tolerância para com as outras religiões."
"E, no entanto, na sura 5, versículo 51, Alá torna claro que um crente não pode ser amigo de um judeu ou de um cristão..."
"É verdade." Ahmed voltou a hesitar, na dúvida sobre se deveria expor o que tinha em mente, mas desta feita venceu a hesitação.
"E há outra coisa, mas peço-lhe que não se zangue com aquilo que vou dizer ...."
Saad sorriu, benigno. "Fica descansado."
"O senhor disse há pouco que Alá proibiu no Alcorão que se matasse."
"Sim."
"Mas se assim é, xeque, por que razão a sura 2, versículo 193, diz: «Matai-os até que a perseguição não exista e esteja no seu lugar a religião de Deus»? Se assim é, por que razão o versículo 191 da mesma sura diz: «Se vos combatem, matai-os: essa é a recompensa dos incrédulos.» Se assim é, por que razão Alá ordena no Alcorão a morte dos que cometem certos crimes? Afinal, matar é ou não proibido?"
O mestre ficou momentaneamente sem saber o que dizer. "Bem... quer dizer, é proibido, mas... também é permitido... enfim... é permitido, mas só em certas circunstâncias, claro."
"É isso, xeque. É permitido em certas circunstâncias. Mais do que isso, a morte é ordenada, como acontece no caso dos crentes envolvidos em assassínio, apostasia ou relações sexuais ilegais ou no caso dos kafirun. Lembre-se que a sura 4, versículo 29, se dirige aos crentes, não aos kafirun. «Ó vós que credes», diz Alá: «Não vos mateis!" Ou seja, não mateis outros crentes, não mateis outros muçulmanos, com excepção dos criminosos. Mas Alá não proíbe a matança de kafirun. Aliás, ainda nem sequer falámos sobre o que vem na sura 9, versículo 5, onde Alá..."
"... na sura 9, versículo 5, Alá diz: «Matai os idólatras onde os encontrardes. Apanhai-os! Preparai-lhes todas as espécies de emboscadas!»"
(…)"Está bem, mas essa ordem foi dada no contexto de urna batalha específica, não pode ser lida como ordem geral."
"Só não é lida como ordem geral por quem não a quer ler assim, xeque", devolveu o pupilo com um esgar sobranceiro. "É evidente que todos os versículos do Alcorão têm um contexto. Mas não é Alá As-Samad, o Eterno? Então as Suas ordens, embora sempre proferidas num contexto, também são eternas. Quando Alá, na Sua infinita sabedoria, revelou ao Profeta o versículo a ordenar que certas acusações envolvessem um mínimo de quatro testemunhas, essa ordem tem ou não tem um contexto?"
"Claro que sim."
"E, no entanto, é eterna. O mesmo se passa com a ordem da matança dos idólatras. Como todos os versículos do Alcorão, esse versículo tem igualmente um contexto. Porém, é tão eterno quanto os outros. "O senhor mesmo disse várias vezes que o Livro Sagrado é atemporal. Se assim é, este versículo também o é."
"Há situações que não estão previstas no Livro Sagrado. "
"Claro que há. Como fazes para as resolver? "
"Julguei que estava tudo previsto no Alcorão, senhor professor."
"Pois não está".
(…)"O que fazemos agora quando aparece alguma coisa que não está esclarecida no Livro Sagrado?" "
"Boa pergunta! Esse foi justamente o problema que os primeiros crentes enfrentaram quando o apóstolo de Deus foi para o Paraíso, que Alá o tenha para sempre consigo."
"O que fizeram eles para o resolver?"
"Como sabes, a autoridade passou para o sucessor do Profeta, não é verdade? Quem ficou a mandar foi o primeiro califa, Abu Bakr. Sempre que havia uma disputa, as pessoas recorriam a Abu Bakr ou a alguns dos outros companheiros de Maomé, todos eles testemunhas de anteriores decisões do apóstolo de Deus, como a sua segunda mulher, Aisha, e ainda Ma'az ibn Jabel, Abu Hurairah, Abu Obayda ou Omar ibn Al-Khattab. Os companheiros do Profeta actuavam como juízes e consultavam o Santo Alcorão. Quando o Livro Sagrado não dava resposta, aplicava-se o que Alá estabelece na sura 33, versículo 21: «No Enviado tendes um formoso exemplo», e na sura 4, versículo 80: «Quem obedece ao Enviado obedece a Deus.» Ou seja, o Profeta, que a paz esteja com ele, é um exemplo para ser seguido. Daí que procurassem orientação em episódios da vida de Maomé, que a paz esteja com ele."
"Os ahadith relatam histórias de Maomé, que a paz esteja com ele, estabelecendo desse modo a sua sunnah, ou exemplo. Os episódios da vida do Profeta, que a paz esteja com ele, servem assim de fonte legal, só suplantados pelo Santo Alcorão." Alterou o tom da voz, como se fizesse um aparte. "Aliás, muitos versículos do Livro Sagrado só se entendem se conhecermos as circunstâncias em que apareceram. Essas circunstâncias estão relatadas justamente nos ahadith."
"Mas, senhor professor, como sabemos se esses episódios narrados nos ahadith ocorreram mesmo? O meu mullah disse-me que há muitos ahadith falsificados..."
"E disse bem. Há imensos relatos fraudulentos de episódios da vida de Maomé, que a paz esteja com ele. Foi por isso que, duzentos anos depois da morte do Profeta, que a paz esteja com ele, alguns estudiosos se puseram a coleccionar ahadith e a verificar a forma como foram transmitidos ao longo do tempo, de modo a garantir a sua fiabilidade. A colecção mais importante é a do imã Al-Bakhari, que analisou trezentos mil ahadith e determinou que dois mil eram autênticos, uma vez que conseguiu seguir-lhes a pista até ao próprio mensageiro de Alá. Esses ahadith estão publicados numa colecção chamada Sahih Bukhari. Também o imã Muslim fez uma colecção muito credível, conhecida por Sahih Muslim.'"
"Portanto, qualquer hadith que esteja nessas colecções é considerado verdadeiro?"
"Sem dúvida", assegurou o professor. "Mas deixa-me voltar à questão de como se formam as leis islâmicas, porque isso é importante. Imagina agora que era preciso pronunciar uma decisão legal... uma fatwa. O que se fazia? Se o Santo Alcorão era omisso quanto ao assunto em apreço, ia-se ter com Aisha e ela lembrava-se de uma sunnah, um exemplo da vida de Maomé, que a paz esteja com ele, que se adaptava à circunstância em questão. Mas imagina que não lhe ocorria nenhum episódio, não encontrava nenhum hadith adequado. O que fazia ela? Dizia para a pessoa ir falar com Abu Obayda, por exemplo. Talvez ele se lembrasse de algum hadith apropriado. Se Obayda não se lembrasse, remetia a pessoa para Abu Bakr."
"E se o califa também não tivesse resposta?"
"Bom, nesse caso reunia um conselho e apresentava a questão, perguntando se alguém se lembrava de alguma coisa na vida de Maomé, que a paz esteja com ele, que resolvesse o problema. Se ninguém se lembrasse, então o conselho pronunciava uma nova decisão, mas sempre inspirada no espírito do Santo Alcorão ou da sunnah."
"Isso não é uma ijma'ah?"
"Sim, essas decisões são as ijma'ah. Portanto, a fonte superior do islão é o Santo Alcorão. Quando o Livro Sagrado não tem resposta, vamos aos ahadith que contam episódios da vida do Profeta, que a paz esteja com ele, e extraímos uma sunnah, um exemplo apropriado ao problema. Quando os ahadith não têm resposta, os sábios emitem uma ijma'ah inspirada no Santo Alcorão ou na sunnah."
"Mas isso era no tempo em que ainda viviam pessoas que conheceram o Profeta. Como se fazem hoje as ijma'ah?"
"Da mesma maneira, com um conselho de sábios. Grande parte das ijma'ah é actualmente pronunciada pelo Conselho Islâmico para a Pesquisa, que se reúne aqui no Cairo, na Universidade Al-Azhar."
"Tenho uma dúvida, senhor professor: como podemos ter a certeza de que as decisões desses sábios são todas acertadas?"
"Pois, esse é um problema", reconheceu o professor Ayman, o olhar de repente toldado. "O Conselho Islâmico para a Pesquisa está sob influência do governo e as suas ijma'ah tendem a ser feitas para agradar ao governo, não a Alá." Abanou a cabeça. "Isso não pode ser. Eu acho que a umma não pode confiar nestes sábios que só dizem o que é conveniente, não o que é verdadeiro. Há outros sábios cujas ijma'ah são mais fiéis ao Santo Alcorão ou à sunnah."
"Quem?"
"O grande mufti da Arábia Saudita, por exemplo. Ou a Escola de Lei Islâmica do Qatar."
"Senhor professor, ainda não percebi bem. Permita-me que lhe faça uma pergunta! Não entendo o que tem isto a ver com o problema dos kafirun", disse, retomando a questão que ali o levara. "O mullah da minha mesquita diz que os cristãos são os mais próximos de nós e que devemos perdoar e contemporizar. Isso está de facto dito por Alá no Alcorão. Mas, ao mesmo tempo, Alá diz outras coisas no Livro Sagrado. Diz que não podemos ser amigos dos kafirun judeus e cristãos. Diz que devemos matar os kafirun até que a perseguição pare e eles se convertam e deixem de ser kafirun. Diz que devemos preparar todas as espécies de emboscadas aos idólatras e matá-los. Afinal onde está a verdade?"
"Está em tudo o que te disse." O aluno sacudiu a cabeça, inconformado.
"Desculpe, mas continuo a não entender. O que têm estas coisas de que o senhor professor falou a ver com o problema dos kafirun?"
"Têm tudo. Tudo. O Santo Alcorão e os ahadith contêm uma resposta clara para o problema dos kafirun."
"Qual resposta? "
"Já ouviste falar na nasikh?"
"Sim... "
"Bem... é a revelação progressiva do Alcorão."
"Sim, mas o que quer isso dizer?"
"Nasikh é a chave para as aparentes contradições do Alcorão. Na verdade não há contradições nenhumas. O Livro Sagrado é perfeito. Nasikh significa que Alá decidiu, na Sua imensa sabedoria, revelar progressivamente o Santo Alcorão. Podia ter revelado tudo de uma vez, mas Deus, que tudo sabe e tudo planeia, optou por fazê-lo por fases, através do sistema de revelação progressiva, ou nasikh. Isso quer dizer que as novas revelações cancelam as anteriores. Compreendeste?"
"Hmm... sim."
"Mas eu explico-te melhor. Antes de Meca, para que direcção o Santo Alcorão mandava os crentes rezarem?"
"Al-Quds."
"Exactamente! Primeiro foi mandado aos crentes que rezassem na direcção de Al-Quds e depois na direcção de Meca. Parece haver aqui uma contradição. Afinal, qual a ordem que é válida?" "Ora, a segunda." "Isso é nasikh, ou abrogação. Através do Santo Alcorão, Alá mandou primeiro rezar na direcção de Al-Quds e depois na de Meca. Quando há contradição aparente, aplica-se o princípio da revelação progressiva. As novas revelações cancelam as anteriores. A ordem de rezar na direcção de Meca cancelou a anterior. O mesmo acontece com o álcool, por exemplo. Primeiro o álcool era permitido em todas as circunstâncias, depois passou a ser proibido só durante a oração e mais tarde foi proibido em qualquer circunstância. Qual a ordem que é válida?"
"A última, claro."
"Nasikb! As revelações anteriores são canceladas pelas novas. É isso a abrogação. Podemos continuar a ler os versículos cancelados no Santo Alcorão, claro, mas já não são válidos.
"Agora é preciso que percebas mais outra coisa", disse. "A revelação progressiva divide-se em dois períodos fundamentais: o de Meca e o de Medina. O primeiro período é o de Meca, altura em que o Profeta, que a paz esteja com ele, nunca falou em guerras e defendeu a tolerância e o perdão para com os Adeptos do Livro. Neste primeiro período de treze anos, ele limitou-se a pregar e a rezar e a meditar. O único conflito que teve foi com a adoração dos ídolos. Mas depois o Profeta, que a paz esteja com ele, fugiu para Medina e tudo mudou. Neste segundo período ele quase só falou em guerras e passou a pregar o islão com a espada na mão. Comandou pessoalmente os crentes em vinte e seis batalhas, ordenou a morte de pessoas, regozijou-se quando lhe mostraram as cabeças decapitadas dos seus inimigos e combateu os Adeptos do Livro. Agora repara: quando começou a era islâmica?"
"Foi com a Hégira."
"Que foi justamente a fuga do Profeta, que a paz esteja com ele, para Medina. Isso quer dizer que a fase de Medina é que é a do verdadeiro islão, não a fase de Meca. Se fosse a de Meca, a era islâmica teria começado com a primeira revelação. Mas não. A era islâmica só começou quando Maomé, que a paz esteja com ele, foi para Medina; só se iniciou quando o Enviado de Deus, que a paz esteja com ele, começou a pregar a guerra e a intolerância para com os Adeptos do Livro. E eu pergunto-te agora: em que fase da revelação progressiva do islão está dito por Alá no Santo Alcorão que, em relação aos judeus e aos cristãos, devemos perdoar e contemporizar?"
"Na fase de Meca."
"E em que fase está dito que devemos emboscar e matar os idólatras?"
"Na de Medina, claro."
"À luz do princípio de nasikh, o que se deve concluir quanto a essa aparente contradição?"
"A fase de Medina é posterior à fase de Meca", constatou Ahmed. "Logo, a revelação que está na sura 9 cancelou a da sura 2. É essa a ordem de Alá que permanece válida. A que se encontra na sura 9, versículo 5."
Ayman abriu os braços, fechou os olhos, levantou o rosto e, com a expressão mística de um asceta em transe, entoou o versículo que a revelação progressiva autenticara."«Matai os idólatras onde os encontrardes. Apanhai-os! Preparai-lhes todas as espécies de emboscadas!».
(…) viam os monges cristãos fechados num mosteiro a dizer que estavam em meditação para comungar com Deus e para encontrar a paz e o amor. Toda essa conversa influenciou os crentes fracos, muitos dos quais se puseram então a falar no amor de Alá, não na força de Alá. Nasceu assim o sufismo, um movimento que prega o amor, a paz e a espiritualidade.
"Pois ficai a saber que o sufismo não é islão "
"O mero respeito de alguns preceitos do islão não faz de uma pessoa um crente. Para se ser muçulmano é preciso respeitar todos os preceitos, sem excepção. Todos. É isso o que Alá diz na sura 4, versículo 65 do Santo Alcorão e é isso o que está estabelecido na sunnab do Profeta, como é relatado num hadith apropriado. O mensageiro de Alá comandava homens no campo de batalha e os sufis vêm agora desvalorizar a importância da guerra? Os sufis renegam o exemplo do Profeta, que a paz esteja com ele, e ainda acham que são crentes? Acaso não está estabelecido por Alá na sura 33, versículo 21 do Santo Alcorão: «No Enviado tendes um formoso exemplo»? Se o Profeta, ele próprio, fazia a guerra e mandava degolar kafirun, não é isso um formoso exemplo? Se ele mandava matar em guerra, quem são os sufis para desvalorizar a guerra?"
"Onde está dito no Santo Alcorão que devemos evitar o uso da força?"
"Está ... está na... na sura 3, senhor professor."
"Recita o versículo."
«Esses que praticam a caridade, obedecendo a Deus nas alegrias e nas desgraças, que reprimem a cólera e apagam a ofensa dos homens - Deus ama os que fazem o bem!»"
"Só isso?"
"Há outras suras onde... onde Alá diz o mesmo, senhor professor."
"Claro que há. Por exemplo, na sura 42, versículo 37, Deus promete o melhor para aqueles «que se afastam dos grandes pecados e das torpezas e que, quando se irritam, perdoam»." Encolheu os ombros. "E depois? Alá quer que haja perdão entre os crentes e que se faça o bem. Perdoemos então e façamos o bem entre os crentes. É por isso que somos bons muçulmanos. Mas engrandecer o islão também é fazer o bem! Perdoar os kafirun que se convertam ao islão também é perdoar! Há, no entanto, limites ao perdão. Ou não há? O que diz Alá no Santo Alcorão para os que roubam? Diz para perdoar? Não! Diz para lhes cortarem as mãos! O que diz Alá através da sunnah para as adúlteras? Diz para perdoar? Não! Diz para as lapidarem até à morte! O que diz Alá no Santo Alcorão para os idólatras? Diz para perdoar? Não! Diz para os emboscar e para os matar! O Santo Alcorão é para ler no seu todo, a sharia é para ser respeitada no seu todo! Entenderam? "Os sufis enfraqueceram o islão."Quando os kafirun cruzados invadiram o islão e conquistaram Al-Quds, que Alá os amaldiçoe para sempre, alguns sufis opuseram-se ao uso da força, dizendo que a guerra pregada no Santo Alcorão não era física, mas espiritual. Esta conversa enfraqueceu o islão e foi por causa desses sufis malditos que os cruzados conseguiram humilhar a umma. E quando, mais tarde, os Mongóis atacaram e conquistaram a sede do califado, Bagdade, vários sufis repetiram a mesma heresia, afirmando que não se devia lutar com as armas, que pela força não se resolvia nada... essa conversa cristã. Qual foi o resultado disso? Enfraqueceram de novo o islão e deixaram mais uma vez humilhar a umma! E sabem quem se ergueu contra os sufis e os denunciou como hereges? Foi Ibn Taymiyyah! Sabem o que disse Ibn Taymiyyah?"."Ibn Taymiyyah declarou que o sufismo é um movimento cristão!" Ergueu o dedo, para sublinhar a afirmação. "Um movimento cristão! Dizem-se crentes, mas são cristãos! Tal como os kafirun cristãos, os sufis acham que, quando oram a Alá, eles estão com Alá e Alá está com eles. Onde se encontra isto escrito no Santo Alcorão? Em parte nenhuma! Esse tipo de oração é dos kafirun cristãos, não de um verdadeiro crente! E ainda por cima os sufis puseram-se a interpelar os santos, exactamente como os infiéis cristãos e xiitas, negando assim que só existe um Deus." Voltou a apontar para o aluno. "Eles não passam de kafirun a fingir-se crentes! Não se deixem, pois, enganar por esses apóstatas! O islão que os sufis pregam não é o islão que está no Santo Alcorão! Leiam o que se encontra de facto escrito no Livro Sagrado e conhecerão a palavra de Deus. Não deixem que os intermediários façam as interpretações que lhes convêm!
(…) o versículo 34 da sura 4: «Os homens têm responsabilidade sobre as mulheres, porque Deus favoreceu a uns em relação aos outros, e porque eles gastam parte das suas riquezas em favor das mulheres»"; "«As mulheres piedosas são submissas às disposições de Deus; são reservadas na ausência dos seus maridos no que Deus mandou ser reservado. Àquelas de quem temais desobediência, admoestai-as, confinai-as nos seus aposentos, castigai-as. Se vos obedecem, não procureis pretexto para as maltratar. Deus é altíssimo, grandioso»."
"«Meu Deus, como és bom com aquele que vai contra os Teus princípios»"? Mas o que é isto? Alá é bom com quem não O respeita? Onde estaria isso escrito?
Descobriu que se tratava de uma ordem ligada a Bahauddin Naqshband, o santo de Bucara que viveu no século xiv. A meio do texto, o livro referiu a corrente islâmica a que pertencia essa ordem. Era sufi.
Onde já se vira tal coisa? Muçulmanos a comungar com Deus? Muçulmanos a usar a meditação, a música e a dança para se unirem ao Misericordioso? Onde estava isso escrito no Alcorão? "Quem são estes homens?"
"Ascetas sufis."
O xeque era um sufi! E o que era um sufi senão um muçulmano submetido a influências cristãs? Um kafir, portanto. Isso queria dizer que ele, Ahmed, estava a ser ensinado por um kafir! Isso queria dizer que o verdadeiro islão não era aquele que o xeque lhe explicava nas suas lições. Pior ainda, o verdadeiro islão não era aquele que o mullah pregava todas as sextas-feiras na mesquita. Ele e a família estavam a ouvir uma doutrina cristã encapotada, não o verdadeiro islão! O verdadeiro islão era outro. O verdadeiro islão era o que se encontrava exposto por Alá no Alcorão e exemplificado pelo Profeta na sunnah. O verdadeiro islão era o da sura 9, versículo 5. "«Matai os idólatras onde os encontrardes. Apanhai-os! Preparai-lhes todas as espécies de emboscadas!»" Como poderiam os verdadeiros muçulmanos ignorar tão claras ordens de Alá?
Além disso, concluiu que o islão desviante era defeito geral no Egipto, o medo de desagradar ao governo parecia maior do que a fé desses clérigos cobardes.
"Os sufis é a corrente mais pacífica do islão, juntamente com a dos ismaelitas; vivem em paz e harmonia. Para eles a jihad é um conceito de luta do espírito para atingir a perfeição, não é necessariamente guerra nem matança."
"É isso mesmo o que diz Alá no Santo Alcorão! Para se ser muçulmano é preciso respeitar sempre todas as leis. Basta falhares em algumas delas e deixas de ser muçulmano. "
"«Não há nenhum Deus senão Alá.» Isso significa que todas as outras autoridades existentes na Terra, incluindo presidentes e governos, valem menos do que a vontade de Alá, expressa directamente no Santo Alcorão. Isto quer dizer que a vontade de Alá tem de ser obedecida, mesmo que isso implique desobedecer a um presidente ou a um polícia. Alá manda acima de todos. "
(…) " Somos totalmente livres! O islão liberta o homem das imperfeitas leis e tradições humanas e submete-o unicamente a Deus. O universo inteiro fica assim sob a autoridade de Alá, e o homem, sendo uma ínfima parte desse universo, passa a obedecer às leis universais. A Lei Divina regula todas as matérias e põe o homem em harmonia com o resto do universo. O ser humano liberta-se. No islão não interessa a raça, a língua, a nacionalidade, a classe social, somos todos gotas de água que se juntam num ribeiro e todos os ribeiros convergem para um grande rio que desagua no oceano imenso. Compara, por exemplo, o império de Deus com os impérios humanos do passado. "
(…)"Olha para os grandes impérios europeus, como o britânico, o espanhol, o português ou o francês! Todos eles eram fundados na ganância e no orgulho, na opressão e na exploração de povos. Olha para o império comunista! Em vez de mandarem os nobres, ali quem manda é o proletariado, ou, para ser mais verdadeiro, uma elite privilegiada que usurpou o poder em nome do proletariado. Todo o comunismo é fundado na luta de classes, não na harmonia. Compara tudo isso com o islão, que liberta o ser humano destes grilhões e o submete universalmente à Lei Divina. "
"Alá instituiu o islão justamente para pôr fim ao culto das imperfeitas leis humanas. Todas as pessoas da Terra devem obediência a Deus e a Deus apenas. Ninguém tem o direito de fazer leis. Aceitar a autoridade pessoal de um ser humano é aceitar que esse ser humano partilha a autoridade de Alá. Isso é heresia! Isso é a fonte de todos os males do universo!"
Numa democracia são as pessoas que decidem o que se pode ou não fazer, o que se pode ou não proibir. Isso é contra o islão! No islão as pessoas não têm o poder de decidir o que é legal ou ilegal. Esse poder é exclusivo de Alá!
Os seres humanos têm de obedecer à Lei Divina para estarem em harmonia com o universo e em paz consigo mesmos. Se, em vez de o fazerem, cederem às suas tentações e instintos e rejeitarem a sharia, então entrarão em confronto com o universo e aparece a corrupção e todos os problemas que estamos a ver no islão e no mundo.
(…)"quem usurpar o poder divino tem de ser afastado. Esse afastamento é feito através da pregação ou, quando se levantam obstáculos, através da força. Ou seja, com recurso à jihad."
"Os kafirun cristãos distorcem o conceito de jihad, insinuando que ela impõe a tirania. Bem pelo contrário, a jihad liberta os homens da tirania. E esses cobardes que se dizem crentes ficam tão embaraçados diante dos kafirun cristãos que se põem a argumentar que a jihad é meramente defensiva e exibem os versículos já ab-rogados como suposta prova. (…) A jihad só é defensiva no sentido em que defende o homem e o liberta dos grilhões de outros homens. Só nesse sentido é ela defensiva. De resto, a ordem de Deus é a de espalhar a Lei Divina por toda a humanidade! E como se faz isso? Só a pregar? Claro que não! Teríamos de ser muito ingénuos para pensar que as sociedades jahili aceitariam pôr as suas leis de acordo com a Lei Divina, de modo a viabilizar um clima de liberdade que permitisse que os kafirun escolhessem a religião que querem sem constrangimentos. E por isso que a jihad é necessária. A jihad não se destina a defender terras, destina-se a impor a Lei Divina!"
"O islão procura a paz, mas não uma paz superficial que se limite a garantir a segurança das suas terras e das suas fronteiras. O que o islão procura é a paz mais profunda de todas: a paz de Deus e de obediência a Deus apenas. Enquanto essa paz não existir, teremos de lutar por ela. A luta faz-se através da pregação e, quando necessário, da jihad. "
Deus diz no Livro Sagrado que o objectivo é limpar a corrupção da face da Terra! Se fosse a defesa das fronteiras, Ele tê-lo-ia dito. Mas não disse. A jihad não é pois uma mera fase temporária, mas uma etapa fundamental que existe enquanto existir jahiliyya entre os homens. É obrigação do islão lutar pela liberdade do homem até que todos se submetam à Lei Divina. O destinatário do islão é toda a humanidade e a sua esfera de acção é o planeta inteiro. Ou os kafirun se convertem ou pagam a jizyab. São essas as ordens de Alá e é para isso que existe a jihad." Se os kafirun não o fizerem, terão de ser mortos."
"O que distingue um mudjahedin de um guerreiro kafir é a sua preparação moral e a sua pureza diante de Deus. Um mudjahedin é um soldado de Alá, pelo que, uma vez em combate, as regras que tem de respeitar são muito rigorosas. Deve evitar as matanças indiscriminadas, em particular de mulheres e crianças, e também a destruição de santuários religiosos, como igrejas ou sinagogas."
"E se as mulheres e crianças estiverem envolvidas no esforço de guerra dos kafiru? "
"Nesse caso devem ser mortas", sentenciou. "As leis da jihad são muito claras nisso. Um hadith conta que uma vez perguntaram ao Profeta se era errado matar as mulheres e crianças dos kafirun. Ele respondeu: «Considero-os como se fossem os seus pais.» Ou seja, se os pais forem kafirun, em certas circunstâncias é permitido matar-lhes os filhos. Por exemplo, quem de alguma forma apoiar o inimigo, mesmo fornecendo apenas água ou até somente apoio moral, é também um inimigo e pode ser morto."
"Imagina, meu irmão, que uma mulher kafir reza para que o marido mate um crente. Ou imagina que uma criança kafir reza para que o pai mate um mudjabedin.'"
"Devem ambos ser mortos. Basta um kafir desejar a morte de um crente para poder ser morto, mesmo que se trate de uma criança. De qualquer modo, é importante sublinhar que o recurso à força deve ser evitado enquanto possível. No entanto, no momento em que a jihad for necessária, ninguém deve fugir às suas responsabilidades. Disse o Profeta: «Aquele que se encontrar com Alá sem alguma vez se ter envolvido em jihad encontrará Alá com um defeito». A jihad ocupa muitas páginas do Santo Alcorão. São mais de cento e cinquenta versículos nos quais Alá Al-Hakam, o Juiz, enuncia as regras da guerra, tornando claro que a verdade tem de ter uma força física que a proteja e a propague. A maior parte das guerras decretadas por Maomé foram ofensivas, como toda a gente sabe. Ora como Alá nos manda no Alcorão seguir o exemplo do Seu mensageiro, também nós temos de lançar guerras ofensivas. Há até um hadith que cita assim o Profeta: «Fui educado com a espada nas mãos da Hora até que apenas Alá seja venerado. Ele ofereceu-nos sustento por baixo da sombra das lâminas e decretou a humilhação de todos os que se me opõem.» Por aqui se vê que o apóstolo de Deus valorizava a espada e a necessidade de a usar até que todos os seres humanos se submetam a Alá. Num outro hadith, o Profeta é assim citado: «Eu ordeno por Alá que se faça guerra a toda a gente até que todos digam que Alá é o único Deus e que eu sou o Seu Profeta». Ou seja, o objectivo do islão é governar todo o mundo e submeter toda a humanidade ao islão. Há pessoas que se dizem muçulmanas mas que preferem fingir que estas palavras do Profeta não foram proferidas. Mas, meus irmãos, as ordens de Maomé são claras: enquanto houver kafirun há jihad para os converter ou para os obrigar a pagar jizyah."
"Mas quem decreta a jihad ofensiva, meu irmão? Há quem diga que só o califa o pode fazer..."
"Esse é um ponto em discussão. Muitos dos nossos irmãos entendem que a jihad ofensiva está já decretada no Alcorão e na sunnah do Profeta, que a paz esteja com ele. Para perceber isso basta ver os hadith que acabei de citar ou ler a ordem de Alá na sura 2, versículo 216 do Alcorão: «Prescreve-se-vos o combate, ainda que vos seja odioso»." Ergueu o dedo e repetiu as palavras que considerava cruciais: "Ainda que vos seja odioso! Mas há outros irmãos que entendem que a jihad ofensiva, sendo de facto uma obrigação dos crentes, só pode ser decretada pelo califa. Existe, como sabem, tradição nesse sentido. O califa tem o dever de reunir um exército e atacar os kafirun uma ou duas vezes por ano, como fizeram no passado Abu Bakr e Omar ibn Al-Khattab e tantos outros. O califa que não o fizer estará a violar a vontade de Alá, expressa no Alcorão ou na sunnab. A jihad é obrigatória para os crentes e deve existir até que todos os seres humanos sejam crentes ou paguem a jizyab."
"Mas o último califado já foi abolido. Como se faz agora que não há califa?"
"Na minha opinião aplicam-se as ordens de Alá dadas no Alcorão ou através do exemplo do Profeta. Mas parece haver acordo no sentido de que, aconteça o que acontecer, é preciso reinstalar o califado para pôr fim a esse ponto de discórdia e, por consenso, podermos lançar guerras anuais contra os kafirun. Disse o Profeta num hadith: «Se receberes a ordem de marchar contra o inimigo, então marcha.» Foi justamente porque negligenciámos a ordem divina de atacar os kafirun que Alá nos abandonou. Ignorámos as Suas regras e Ele ignorou-nos a nós. Foi porque deixámos de fazer a jihad ofensiva, conforme ordenado por Alá no Alcorão ou através da sunnah do Profeta, que nos vemos agora na contingência de fazer a jihad defensiva. Urge, consequentemente, reinstalar o califado e pôr fim à humilhação da umma, espalhando o islão por todo o planeta."
"E como se faz isso? Como se pode reinstalar o califado?
"Com a guerra!"
Os instruendos de Khaldan estavam nessa manhã a estudar a técnica e os princípios por detrás dos itisbadi, os atentados suicidas. Abu Omar, que dava a aula, começou por se centrar nos princípios teológicos que legitimavam as acções levadas a cabo pelos shabid, os mártires, uma vez que o suicídio era absolutamente proibido pelo Alcorão. "A excepção são justamente os itisbadi", sublinhou o instrutor, referindo-se aos suicidas em acções de combate. "O martírio em jibad é até a única forma de garantir o acesso ao Paraíso. Alguém sabe qual o versículo do Alcorão onde isso é esclarecido?"
"É na sura 3, versículo 169". "«Não tenhais por mortos aqueles que morreram pela causa de Deus. Não! Estão vivos juntos do seu Senhor, estão alimentados»."
"Esse versículo torna claro que a morte em jihad nos leva para junto de Alá, nos jardins eternos onde há muita água e comida. Existe até um hadith que esclarece que o shahid tem à sua espera setenta e duas virgens. Isso é... Realmente, como não desejar morrer se o shahid é o único dos crentes que tem assegurado um lugar no Paraíso?", "Com a paz do Senhor e as virgens à nossa espera, qual é a dúvida? O que são as agruras desta vida quando comparadas com as recompensas que nos esperam? Há outros versículos do Alcorão e outros ahadith que falam sobre o Paraíso à espera dos shahid. "
"Sabes o que fazem muitos irmãos no momento de se tornarem shahid? Como não conseguem deixar de pensar nas virgens, protegem o ventre com cartão para garantir que, depois de se fazerem explodir, os órgãos genitais chegam intactos ao Paraíso"
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