William Shakespeare : O Mercador de Veneza – Ato II - Cena V

Cena V

(O mesmo. Diante da casa de Shylock. Entram Shylock e Lanceloto.)

Shylock
Bem; o melhor juiz vão ser teus olhos, que hão de mostrar-te qual a diferença entre o velho Shylock e esse Bassânio. Lá tu não poderás empanturrar-te, como fazes aqui, - Olá, Jessica! - nem dormir e roncar, - Olá, Jessica! - nem rasgar tanta roupa. - Olá, Jessica!

Lanceloto
Jessica, olá!

Shylock
Quem te mandou chamá-la? Não disse que o fizesses.

Lanceloto
Vossa Senhoria me observou muitas vezes que nada eu deveria fazer sem ordem.

(Entra Jessica.)

Jéssica
Chamastes-me? Que desejais?

Shylock
Jessica, hoje tive um convite para ceia. Toma conta das chaves. Nem sei mesmo porque deva aceitá-lo. Esse convite não é sincero, é adulação, apenas. Jessica, minha filha, fecha a casa. Saio pouco tranqüilo; qualquer coisa ruim fermenta contra o meu sossego, pois sonhei toda a noite com dinheiro.

Lanceloto
Suplico-vos que vades, senhor; meu jovem amo espera vossa partida.

Shylock
Como eu a dele.

Lanceloto
Além disso, eles fizeram uma conspiração... Mas se tal acontecer, não foi à toa que o nariz me começou a sangrar na última segunda-feira de Páscoa às seis horas da manhã, no dia em que quatro anos antes caiu numa tarde de quarta-feira de cinzas.

Shylock
Como! Vai haver máscaras? Ouviste, Jessica? Fecha as portas. Quando ouvires barulho de tambor e os irritantes guinchos das flautas de pescoço torto, não te ponhas a olhar pela janela, nem para a rua pública te inclines, para ver os cristãos sarapintados, mas os ouvidos tapa bem da casa, digo, as janelas, para que o barulho dessas futilidades não penetre em minha casa honrada. Juro pelo cajado de Jacó que não me sinto disposto hoje a cear fora de casa. Mas, assim mesmo, irei. Maroto, corre; dize-lhes que já chego.

Lanceloto
Já vou, senhor. Senhorita, apesar das recomendações, olhai pela janela, porque vai um cristão passar de dia, digno do olhar de uma judia.

(Sai Lanceloto.)

Shylock
Hem? Que foi que falou esse estouvado da geração de Agar?

Jéssica
Disse somente: "Passai bem, senhorita", nada mais.

Shylock
Esse palhaço não é má pessoa, mas come por demais; é caramujo para lucros e dorme o dia todo, como um gato selvagem. Não, comigo não prosperam zangões. Por isso deixo que se vá, e que vá para o serviço de um amo a quem desejo que ele possa vir a ajudar a esvaziar a bolsa de dinheiro emprestado. Bem, Jessica, vai logo para dentro. É bem possível que eu volte cedo. Faze o que te disse: fecha a porta ao passares. "Bem trancada, bem guardada", é sentença por quem sabe ganhar sempre acatada.

(Sai.)

Jéssica
Se tudo me correr à maravilha, pai já não tenho e tu tiveste filha.

(Sai.)

Submited by

Thursday, May 7, 2009 - 22:54

Poesia Consagrada :

No votes yet

Shakespeare

Shakespeare's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 13 years 23 weeks ago
Joined: 10/14/2008
Posts:
Points: 410

Add comment

Login to post comments

other contents of Shakespeare

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 12: When I do count the clock that tells the time 0 6.239 07/12/2011 - 02:13 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 119: What potions have I drunk of Siren tears 0 4.092 07/12/2011 - 02:12 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 118: Like as to make our appetite more keen 0 3.722 07/12/2011 - 02:09 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 116: Let me not to the marriage of true minds 0 3.902 07/12/2011 - 02:07 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 115: Those lines that I before have writ do lie 0 4.021 07/12/2011 - 02:06 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 114: Or whether doth my mind, being crowned with you 0 4.132 07/12/2011 - 02:05 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 113: Since I left you, mine eye is in my mind 0 3.735 07/12/2011 - 02:04 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 112: Your love and pity doth th' impression fill 0 3.710 07/12/2011 - 02:02 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 111: O, for my sake do you with Fortune chide 0 3.564 07/12/2011 - 02:01 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 110: Alas, 'tis true, I have gone here and there 0 4.014 07/12/2011 - 01:59 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 11: As fast as thou shalt wane, so fast thou grow'st 0 4.140 07/12/2011 - 01:58 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 109: O, never say that I was false of heart 0 4.790 07/12/2011 - 01:57 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 108: What's in the brain that ink may character 0 3.940 07/12/2011 - 01:57 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 107: Not mine own fears, nor the prophetic soul 0 3.982 07/12/2011 - 01:56 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 106: When in the chronicle of wasted time 0 3.962 07/12/2011 - 01:54 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 105: Let not my love be called idolatry 0 4.652 07/12/2011 - 01:53 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 104: To me, fair friend, you never can be old 0 4.337 07/12/2011 - 01:53 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 103: Alack, what poverty my Muse brings forth 0 4.270 07/12/2011 - 01:52 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 102: My love is strengthened, though more weak in seeming 0 3.513 07/12/2011 - 01:50 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 101: O truant Muse, what shall be thy amends 0 4.320 07/12/2011 - 01:43 English
Poesia Consagrada/General Sonnet 100: Where art thou, Muse, that thou forget'st so long 0 4.071 07/12/2011 - 01:42 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 10: For shame, deny that thou bear'st love to any 0 4.075 07/12/2011 - 01:40 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonnet 1 0 4.167 07/12/2011 - 01:38 English
Poesia Consagrada/Sonnet Sonet LIV 0 4.454 07/12/2011 - 01:37 English
Poesia Consagrada/General Silvia 0 4.483 07/12/2011 - 01:36 English