ELOGIOS VII

7
Aos annos do mesmo Senhor

(13 de Maio de 1803)

... Ipse tibi jam brachia contrahit araens
Scorpius & coeli justa plus parte relinquit.

VIRG. Georg. Lib. I.

Oh lustres do salão radioso, immenso,
Fonte invisivel dos visíveis astros!
Em torrentes de luz, perennes, vossas,
Sem que naufrague a mente, é jus do vate
Sondar a eternidade, abrir os Fados.

Sorria-se na terra o mez das flôres,
Espelho eram dos céos as vitreas ondas;
Do azul Favonio, da punícea rosa
Tenues suspiros, candidos perfumes
A leda Natureza embellezavam.
Eis ante o rei de tudo heróe, que outr'hora
Gosára entre os mortaes o gráo de nume,
O claro fundador do luso imperio,
Dos altos promontorios a saudade,
Aquelle, cujo nome os patrios eccos
Com lugubre memoria inda proferem.
Curvo o joelho, supplice a palavra,
Pios desejos exprimiu dest'arte:

«Gran Ser, que da medonha, antiga massa
D'uma vez extraíste o térreo globo,
Que n'um sorriso os céos e o sol creaste !
Dá complacente ouvido ás preces minhas.

«O imperio occidental, por ti doado
A mim, e ao sangue meu, que as leis te adora,
O imperio occidental, theatro annoso
De innumeros portentos, de alta gloria,
A plaga venturosa, o dôce clima,
(Que já sagraste co'a presença tua)
Lustre de novos dons, de timbres novos,
Em virtude, em grandeza, em majestade.
A planta, de que fui raiz fecunda,
Sempre mimosa de teu almo influxo,
Brote por ordem tua um fructo ameno.
Que adorne, encante, aformosêe a terra.

«De Lysia velador, propicio genio
Tu me elegeste, oh Deus! Eu guardo, eu zelo
Fiel, grata nação: mil, e mil vezes
Se apuram no esplendor da eternidade
Incensos, que te dá meu povo amado.
Requintada ventura, um lustre, ignoto
Ao resto dos mortaes, o galardoe:
Primeiro templo teu no mundo é Lysia,
Quasi como é nos céos, é lá teu culto.»
Taes, e tantas de Affonso as preces foram,
E ás preces annuiu o auctor dos astros.

Revolve a mão suprema o cofre eterno,
E entre milhões de espíritos fulgentes
Um, que mais brilha, bemfazejo, estrema.

Oh vós, de inextinguivel claridade
Serenos filhos ! Impalpaveis entes !
Nuncios da terra aos céos, dos céos á terra
Quando implora o mortal, e outorga o nume !
Vós, leves meneando as alvas plumas,
Ao solio, que dá leis do Tejo ao Ganjes,
Trazeis um dia, que atavie os tempos,
Um dom trazeis, que divinize o mundo.
É teu natal, grande João, tua alma
Este dia, este espirito, fadados
De caracter sem par, de bens sem conto
Pela voz, que do sol regula o giro.

Donativo do céo, prazer da terra,
Que honras o mundo todo, e reges parte,
Principe excelso, Principe adorado,
Enlaças corações em flóreo jugo;
Ternura filial nos diz que reinas,
Não convulso terror, não leis de ferro.
Quaes folgam, limpas das terrenas fezes,
Almas formosas nos elysios prados,
Vagam risonhos, festivaes teus povos,
Amplo dominio, que dos céos herdaste.

Tarde, mui tarde a teu principio voltes;
Depois que o tempo fatigar seus vôos
Vá sumir-se comtigo a Natureza
No seio da lustrosa eternidade:
Eis os votos de Lysia, e do universo.

Submited by

Sunday, October 18, 2009 - 20:42

Poesia Consagrada :

No votes yet

Bocage

Bocage's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 13 years 33 weeks ago
Joined: 10/12/2008
Posts:
Points: 1162

Add comment

Login to post comments

other contents of Bocage

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS V 0 447 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS VI 0 1.002 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS VII 0 1.132 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS VIII 0 680 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS X 0 821 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS XI 0 775 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS XII 0 654 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS XIII 0 511 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS XIV 0 937 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS XV 0 731 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS LVI 0 410 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS LVII 0 1.009 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS LVIII 0 504 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS I 0 536 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General APÓLOGOS II 0 721 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS XLIII 0 684 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS XLIV 0 505 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS XLV 0 594 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS XLVI 0 355 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS XLVII 0 543 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS XLVIII 0 691 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS XLIX 0 744 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS L 0 1.087 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS LI 0 859 11/19/2010 - 16:55 Portuguese
Poesia Consagrada/General GLOSAS LII 0 593 11/19/2010 - 16:55 Portuguese