A ponte (Mário Benedetti)
Para cruzá-la ou não cruzá-la
eis a ponte
na outra margem alguém me espera
com um pêssego e um pais
trago comigo oferendas desusadas
entre elas um guarda-chuva de umbigo de madeira
um livro com os pânicos em branco
e um violão que não sei abraçar
venho com as faces da insônia
os lenços do mar e das pazes
os tímidos cartazes da dor
as liturgias do beijo e da sombra
nunca trouxe tanta coisa
nunca vim com tão pouco
eis a ponte
para cruzá-la ou não cruzá-la
e eu vou cruzar
sem prevenções
na outra margem alguém me espera
com um pêssego e um país
Mario Benedetti (1920-2009), poeta uruguaio, profundo conhecedor da América Latina e de sua literatura. Dramaturgo, poeta, ensaista e novelista, Mario Benedetti logrou boa parte de sua popularidade com seus contos: Esta manhã (1949), A última viagem (1951), Montevideanos (1959), A morte e suas surpresas (1968), Geografias (1984), e outros - nos quais captou aguda e sutilmente os pequenos fatos da vida cotidiana do homem comum de seu pais.
Este poema - A Ponte - faz parte Do livro "Perguntas ao acaso", com tradução de Julio Luís Gehlen.
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