Tristeza

Que leda noite! - Este ar embalsamado,
Este silêncio harmônico da terra
Que sereno prazer n'alma cansada
Não espreme, não filtra, não difunde?
A brisa lá sussurra na folhagem
D'espessas matas, d'árvores robustas,
Que velam sempre e sós, que a Deus elevam
Misterioso coro, que do Bardo
A crença quase morta inda alimenta.
É esta a hora mágica de encantos,
Hora d'inspirações dos céus descidas,
Que em delírio de amor aos céus remontam.

Aqui da vida as lástimas infindas,
Do mirrado egoísmo a voz ruidosa
Não chegam; nem soluços, risos, festas,
- Hilaridade vã de turba incauta,
Néscia de ruim futuro; ou queixa amarga
De decrépito velho, enfermo, exangue,
Nem do mancebo os ais doidos, preso
Ao leito do sofrer na flor da vida.

Aqui reina o silêncio, o religioso,
Morno sossego, que povoa as ruínas,
E o mausoléu soberbo, carcomido,
E o templo majestoso, em cuja nave
Suspira ainda a nota maviosa,
O derradeiro arfar d'órgão solene.

Em puro céu a lua resplandece,
Melancólica e pura, simelhando
Gentil viúva que pranteia o extinto,
O belo esposo amado, e vem de noite,
Vivendo pelo amor, mau grado a morte,
Ferventes orações chorar sobre ele.

Eu amo o céu assim, sem uma estrela,
Azul sem mancha, - a lua equilibrada
Num céu de nuvens, e o frescor da tarde,
E o silêncio da noite adormecida,
Que imagens vagas de prazer desenha.

Amo tudo o que dá no peito e n'alma
Tréguas ao recordar, tréguas ao pranto,
À v'emência da dor, à pertinácia
Tenaz e acerba de cruéis lembranças;
Amo estar só com Deus, porque nos homens
Achar não pude amor, nem pude ao menos
Sinal de compaixão achar entre eles.

Menti - um inda achei; mas este em ócio
Feliz descansa agora, enquanto aos ventos
E ao cru furor das verde-negras ondas
Da minha vida a barca aventureira
Insano confiei; em céu diverso
Luzem com luz diversa estrelas d'ambos.
Ai! triste, que houve tempo em que eu julgava
As duas uma só, - c'o mesmo brilho
Uma e outra nos céus meigas brilhavam!
Hoje cintila a dele, enquanto a minha
Entre nuvens, sem luz, se perde agora.
Meu Deus, foi bom assim! No imenso pego
Mais uma gota d'amargor que importa?
Que importa o fel na taça do absinto,
Ou uma dor de mais onde outras reinam?

Submited by

Lunes, Abril 27, 2009 - 02:44

Poesia Consagrada :

Sin votos aún

AntonioGoncalvesDias

Imagen de AntonioGoncalvesDias
Desconectado
Título: Membro
Last seen: Hace 14 años 13 semanas
Integró: 04/27/2009
Posts:
Points: 288

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of AntonioGoncalvesDias

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Fotos/Perfil Gonçalves Dias 0 1.370 11/23/2010 - 23:37 Portuguese
Poesia Consagrada/General Rosa no mar! 0 1.043 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Sempre ela 0 1.094 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Se muito sofri já, não me perguntes 0 954 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/Amor Se se morre de amor 0 1.958 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Sobre o túmulo de um menino 0 988 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Voltas e mortes glosados 0 1.245 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Zulmira 0 1.204 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Minha terra! 0 1.231 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Não me deixes! 0 952 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General No jardim! 0 1.120 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/Amor O Amor 0 1.798 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Gigante de Pedra 0 1.007 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Oh! Que acordar! 0 1.036 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Olhos Verdes 0 1.080 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General O que mais dói na vida 0 1.000 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Palinódia 0 1.023 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Pensas tu, bela Anarda, que os poetas 0 1.462 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Que me Pedes 0 1.070 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Retratação 0 1.424 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Rola 0 1.511 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General A Tempestade 0 1.217 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General As artes são irmãs 0 1.055 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General As duas coroas 0 1.515 11/19/2010 - 15:54 Portuguese
Poesia Consagrada/General Canção 0 1.102 11/19/2010 - 15:54 Portuguese