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Dois em Um
Não há pensamentos definitivos,
nem verdades absolutas.
Ou se renovam, ou se complementam,
ou se anulam
por validade perdida,
Nunca por morte.
Espraiam-se em memória
E afirmam-se como indeléveis pegadas
deixadas ao acaso
nos trilhos de um caminho
de destino indefinido.
Há-os que passam
furtivos,
como películas precipitadas
que correm e as minhas mãos não alcançam
Mas há também aqueles
que ficam
como diabruras de criança
acenam-me, tocam-me
e não descansam
enquanto não os escrevo
para como uma fotografia tirada
lograrem a extensão de si.
E eu faço-lhes a vontade
sem que me importe a sua validade efémera
porque efémero sou já eu
e todas as coisas que são.
E por isso, vos conto deste pensamento que tive,
embora sabendo que amanhã mesmo
cuidarei de o emendar:
Todos somos dois
Um que se apaga
no interior de muralhas erguidas
inexpugnável mundo sentido
Outro que se abre
nos impõe a vida
Esta vida…
É estranho e partilhado,
cheio de um “Nós” que não chega a ser
É vida que se consome
É vida que morre,
porque isso mesmo é viver,
nada mais do que morrer
morrer devagar,
sincopadamente partir
E outro que fica
Outro que somos verdadeiramente,
Outro que não vive
e por isso não morre.
É etéreo
É para lá das coisas que são,
paira algures em lugar nenhum
“É” em todo o lado
Não realiza, não vê, não faz.
Ele é tudo isso e muito mais,
É o mundo num mundo,
O nosso Sol de verdade.
É cavalos alados,
Mãos limpas,
Olhar distante,
Névoa que paira
e persiste “vivendo”
no interior dessas muralhas de ser
onde a prática,
A construção,
Os castelos,
A riqueza ilusória,
Sei lá…
Todas as verdades que morrem,
não são,
senão nuvens que passam
sob um Céu eterno
que é esse mundo de Nós
Todos somos dois,
Um Eu de verdade,
Um outro emprestado.
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