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Saturnina - 1. Imobilidade
1. Imobilidade
Suas costas quase se entregaram totalmente ao encosto da cadeira de balanço. Quase. Algo a faz estar ali e não estar também. Um misto de tédio e pulsos de inquietação se afirmam nos confins de sua imagem exata, dos traços seguros e também delicados de seu semblante. Mas sua perturbação não transpareceria se, por suposto, alguém lhe observasse – algo inexplicável vibra só para si, como se fosse rasgar-lhe a carne para sair e tomar vida - um grito estridente ou como se sua figura lindamente distinta fosse um borrão, uma imagem medonha e turva, mal esculpida.
As mãos alvas e magras seguram um livro em seu colo, sobre o vestido tão longo e negro como a noite, num contraste. Repara em suas próprias extremidades e tenta impressionar-se com algo que lhe fugisse à naturalidade: tudo está em seu lugar como há tempos sempre esteve. Tudo paira em uma dinâmica tão perfeita que chega a lhe causar um topor enauseante.
Seus olhos, então, lançam-se para fora da janela e perdem-se nos galhos pouco folhados que ostentam heroicamente os tufos de neve branca – destoam-se destes ao tentar esconder o verde temporão que teima em não secar. Há um riacho que também não congelou, em resistência a nevasca da noite anterior. E sua própria alma parece resistir a si mesma, numa existência suspendida. Mesmo assim, nada é capaz de lhe prende maior atenção – nem a beleza mórbida e fugaz da tarde cinzenta de inverno.
E o tempo é seu contraponto, como uma entidade antagônica que destoa de toda sua exasperação – o galope do pêndulo do relógio instiga-lhe maior impaciência, como se algo estivesse para acontecer, algo que transformasse sua vida numa estática eterna e desmedida. Tudo no relógio é ricamente adornado e entalhado, menos suas horas – elas seguem independente de sua angústia, e não seguem o suficiente para ultrapassarem a mesma.
O calor aconchegante, quase febril, da ampla cozinha faz sua cabeça girar em pensamentos que lhe fogem, como se não fosse hora de entreter-se em imagens mentais, mas tempo de esvaziar-se de si. Pudera ousar tanto! A alma é tão atribulada de coisas (passadas, futuras e marcas que se fazem duradouras) que só de pensar em tamanha impossibilidade algo lhe comprime o peito e lhe desgasta ainda mais. Ou talvez o problema esteja, entre tantas coisas que seguem consigo, no fato de nenhum de seus pensamentos lhe preencher, em nada neste mundo lhe completar. É estar saturada de coisa alguma – uma alma com um fundo falso, uma abulia abissal, que tudo lhe suga e lhe esgota. Mesmo tudo o que se abstrai de si, de uma forma ou de outra, não lhe serviria de nada. É justamente estar defronte ao nada e sentir-se arrebatada por isso.
O fogo que crepita traça um leve rubor na face clara, ardendo-lhe a pele e acendendo ainda mais a agonia em seu peito: o estalar do abeto em brasa, o descompasso do relógio com a sua alma, as imagens dos adereços cotidianos (objetos de afazeres da criadagem), que à sua vista, ganham o ar vívido de um relevo bizarro, vazado - tão perturbador quanto esta parede vazia, sem quadros, a sua frente. A falta de objetos e o excesso deles a fazem girar em sua própria mente, em voltas absurdas, multicoloridas; as imagens que lhe cercam e sua própria imagem destoam tanto de seu interior que a fazem ofegar e largar-se de si – o pânico progressivo lhe invade, como uma fera errante prestes a se evidenciar.
(...)
E desse turbilhão de sensações que eclodem em seu universo interno quase nada acusa em seu exterior – apenas um suspiro mais profundo. E quase nada, em si ou no ambiente, se move divergentemente: o barulho do relógio, como sempre, fissura o ar com cuidado, as labaredas continuam a envolver os pedaços de madeira na lareira, um gato tenta sem atritos alcançar uma pequena aranha entre a lenha de um cesto... tudo está como deveria estar e tudo parece estar à turva distância, num mundo que não é o seu, num mundo que não lhe interessa.
(Continua... se eu achar que devo postar a sequência)
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Comentários
Re: Saturnina - 1. Imobilidade
Por favor continua.
Imaginação, talento e umadas formas mais fortes da prosa que já li.
Para mim és uma referencia, já.
Parabens...
Re: Saturnina - 1. Imobilidade
Ah Mefistus...
uma honra ter lhe atingido de alguma forma... se não "matar minha saturnina", eu posto mais dela aqui!
bjs, muitos
;-)
Re: Saturnina - 1. Imobilidade
Odair...
Que bom que se identificou com que escrevo... fique a vontade para visitar meu espaço e me aderir entre seus amigos no MSN!
bjs
Re: Saturnina - 1. Imobilidade
Fiquei totalmente imóvel diante de sua escrita. Simplesmente fantástica. Corri, então, até o seu blog e foi... amor a 1ª vista. Amei de coração... me tornei seguidor e, com certeza devo estar constantemente vendo-o e me inspirando... se tem uma coisa que amo nas mulheres mais do que a beleza essa coisa é a inteligencia... e pra escrever dessa forma... vc tem de sobra...um grande abraço...obs:add o seu msn tb, espero podermos trocar algumas idéias...