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Morte no ônibus
toca a minha pele do rosto,levantando uma
mecha grossa de cabelo,o vento que adentra
pelas janelas desgastadas do onibus,
que carcomem como a vida na ferrugem
do material velho,feito,contudo,para
o uso temporaneo até que não garanta
mais a segurança dos que de condução andam
e seja jogado no lixo,como somos postos
debaixo da terra.
a menina loira tem olhos bonitos,
verdejam como as plantas raras em dias ensolarados,
traz sobre as pernas dobradas grossos livros
de anatomia dos quais se utiliza nas aulas
maçantes da universidade.
mesmo sem a conhecer,é legível nos traços
de sua fisionomia rósea,a predestinação
das pessoas fortunadas pelas chances claras
de um destino brilhante na vida prática
do trabalho assalariado.
dois rapazes conversam,como amigos de há muito,
com o sorriso elevado ao começo de suas orelhas,
sobre qualquer assunto que não vem ao caso
por minha audição não poder lhes perscrutar os temas.
o trabalhador,encorpado num cansaço perceptível,
está perto de onde se senta a menina loira,
fazendo-lhe contrastre,e equivocando as sensações
leves que me traziam pequenos laivos de felicidade
e contemplação.as suas botas são foscas devido a poeira
que nelas ficaram impregnadas ainda do trabalho na obra,mas
decerto que dentro daquele corpo de músculos e pele negra
esconde-se a alma de algum João que a vida,
por tanto tentar destruir,já não mais entorta.
uma rapariga de porte médio,também à janela
e com mechas de cabelo salientadas pela constancia da brisa,
olhinhos miúdos por detrás de um óculos grande,
mira a paisagem que passa como se tudo aquilo precisasse
ser absorvido em graus extremos pela sua saudade,
pois talvez já previsse que aquela viagem seria
afinal a última vez.
o motorista,que seguia calado ao seu volante,
no isolamento do seu banco duro para todo dia,
grita ao cobrador que há algo de estranho com a
temperatura do motor do onibus.como se largasse
a atenção da estrada para verificar o cheiro,reclina-se
de maneira rápida sobre a grande caixa onde ficam
o motor e outras partes que não me vem à lembrança.
sempre atento ao cheiro do motor e à estrada que,
àquele momento não cabia de tantos carros,pois era
o horário de pico e todos retornavam as suas casas passageiras,
quando reclinara-se mais uma vez
para constatar o imbróglio a que poderia os submeter
no caso de vir à tona o desfecho dessa nuance,sente,
de repente,o seu rosto salpicado pela
voracidade do estouro,que o queima por completo
e o arrebata mortalmente ali mesmo.
o onibus se descontrola,pois já não há mais o guia.
o cobrador,desesperado,corre ao resguarde do seu amigo
de trabalho,porém o tempo passa e o veículo,
embora a explosão,tem ainda os seus mecanismos
em funcionamento.
A essa hora todos estão desesperados,
os liga em ponto comum apenas o receio da morte,
e,numa situção onde tudo indica um adeus eterno,
não há mais trabalhador nem olhos bonitos
ou conversa que possa ser interessante,
só a verdade que nos vem tão rápida como uma frase
indesejada,porém coerente,a qual não queríamos ouvir.
a vida fora rápida como um vulto
e acabara no dobramento de uma rua movimentada.
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