O editor
A poesia transcrita é de Torquato,
Desse pobre poeta enamorado
Pelos encantos de Leonora esquiva,
Copiei-a do próprio manuscrito;
E, para prova da verdade pura
Deste prólogo meu, basta que eu diga
Que a letra era um garrancho indecifrável,
Mistura de borrões e linhas tortas!
Trouxe-ma do Arquivo lá da lua
E decifrou-ma familiar demônio...
Demais... infelizmente é bem verdade
Que Tasso lastimou-se da penúria
De não ter um ceitil para a candeia.
Provo com isso que do mundo todo
O sol é este Deus indefinível,
Ouro, prata, papel, ou mesmo cobre,
Mais santo do que os Papas — o dinheiro!
Byron no seu Don Juan votou-lhe cantos,
Filinto Elísio e Tolentino o sonham,
Foi o Deus de Bocage e d'Aretino,
— Aretino! essa incrível criatura
Lívida, tenebrosa, impura e bela,
Sublime... e sem pudor, onda de lodo
Em que do gênio profanou-se a pérola,
Vaso d'ouro que um óxido terrível
Envenenou de morte, alma — poeta
Que tudo profanou com as mãos imundas
E latiu como um cão mordendo um século...
Quem não ama o dinheiro? Não me engano
Se creio que Satã, à noite, veio
Aos ouvidos de Adão adormecido,
Na sua hora primeira, murmurar-lhe
Essa palavra mágica da vida,
Que vibra musical em todo o mundo,
Se houvesse o Deus-Vintém no Paraíso
Eva não se tentava pelas frutas,
Pela rubra maçã não se perdera:
Preferira decerto o louro amante
Que tine tão suave e é tão macio!
Se não faltasse o tempo a meus trabalhos,
Eu mostraria quanto o povo mente
Quando diz que — a poesia enjeita e odeia
As moedinhas doiradas. É mentira!
Desde Homero (que até pedia cobre),
Virgílio, Horácio, Calderón, Racine,
Boileau e o fabuleiro LaFontaine
E tantos que melhor decerto fora
De poetas copiar algum catálogo,
Todos a mil e mil por ele vivem
E alguns chegaram a morrer por ele!
Eu só peço licença de fazer-vos
Uma simples pergunta: — na gaveta
Se Camões visse o brilho do dinheiro...
Malfilâtre, Gilbert, o altivo Chatterton
Se o tivessem nas rotas algibeiras,
Acaso blasfemando morreriam?
Submited by
Poesia Consagrada :
- Login to post comments
- 1407 reads
other contents of AlvaresdeAzevedo
Topic | Title | Replies | Views |
Last Post![]() |
Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia Consagrada/General | Epitáfio | 0 | 555 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | O pastor moribundo | 0 | 585 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Tarde de Verão | 0 | 508 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Tarde de Outono | 0 | 486 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Cantiga | 0 | 739 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Saudades | 0 | 479 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Anjos do mar | 0 | 648 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Tenho um seio que delira | 0 | 850 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A cantiga do sertanejo | 0 | 1.126 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Quando, à noite, no leito perfumado | 0 | 594 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | O poeta | 0 | 529 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Fui um douto em sonhar tantos amores | 0 | 737 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Foi mais uma ilusão! de minha fronte | 0 | 544 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Quando falo contigo, no meu peito | 0 | 601 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Na minha terra | 0 | 531 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Dedicated | Itália | 0 | 552 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A T... | 0 | 840 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Crepúsculo do mar | 0 | 640 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Crepúsculos nas montanhas | 0 | 626 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Introdução | 0 | 558 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Dedicated | À minha mãe | 0 | 901 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | No mar | 0 | 526 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Sonhando | 0 | 645 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Cismar | 0 | 504 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Ai Jesus! | 0 | 1.146 | 11/19/2010 - 15:52 | Portuguese |
Add comment