O Canto do Índio

Quando o sol vai dentro d'água
Seus ardores sepultar,
Quando os pássaros nos bosques
Principiam a trinar;

Eu a vi, que se banhava...
Era bela, ó Deuses, bela,
Como a fonte cristalina,
Como luz de meiga estrela.

Ó Virgem, Virgem dos Cristãos formosa,
Porque eu te visse assim, como te via,
Calcara agros espinhos sem queixar-me,
Que antes me dera por feliz de ver-te.

O tacape fatal em terra estranha
Sobre mim sem temor veria erguido;
Dessem-me a mim somente ver teu rosto
Nas águas, como a lua, retratado.

Eis que os seus loiros cabelos
Pelas águas se espalhavam,
Pelas águas, que de vê-los
Tão loiros se enamoravam.

Ela erguia o colo ebúrneo,
Por que melhor os colhesse;
Níveo colo, quem te visse,
Que de amores não morresse!

Passara a vida inteira a contemplar-te,
Ó Virgem, loira Virgem tão formosa,
Sem que dos meus irmãos ouvisse o canto,
Sem que o som do Boré que incita à guerra
Me infiltrasse o valor que m'hás roubado,
Ó Virgem, loira Virgem tão formosa.

As vezes, quando um sorriso
Os lábios seus entreabria,
Era bela, oh! mais que a aurora
Quando a raiar principia.

Outra vez - dentre os seus lábios
Uma voz se desprendia;
Terna voz, cheia de encantos,
Que eu entender não podia.

Que importa? Esse falar deixou-me n'alma
Sentir d'amores tão sereno e fundo,
Que a vida me prendeu, vontade e força
Ah! que não queiras tu viver comigo,
Ó Virgem dos Cristãos, Virgem formosa!

Sobre a areia, já mais tarde,
Ela surgiu toda nua;
Onde há, ó Virgem, na terra
Formosura como a tua!?

Bem como gotas de orvalho
Nas folhas de flor mimosa,
Do seu corpo a onda em fios
Se deslizava amorosa.

Ah! que não queiras tu vir ser rainha
Aqui dos meus irmãos, qual sou rei deles!
Escuta, ó Virgem dos Cristãos formosa.
Odeio tanto aos teus, como te adoro;
Mas queiras tu ser minha, que eu prometo
Vencer por teu amor meu ódio antigo,
Trocar a maça do poder por ferros
E ser, por te gozar, escravo deles.

Submited by

Monday, April 27, 2009 - 03:27

Poesia Consagrada :

No votes yet

AntonioGoncalvesDias

AntonioGoncalvesDias's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 14 years 24 weeks ago
Joined: 04/27/2009
Posts:
Points: 288

Add comment

Login to post comments

other contents of AntonioGoncalvesDias

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia Consagrada/General O Soldado Espanhol : Parte II 0 671 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Soldado Espanhol : Parte III 0 517 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Soldado Espanhol : Parte IV 0 494 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Soldado Espanhol : Parte V 0 528 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Soldado Espanhol : Parte VI 0 585 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Soldado Espanhol : Parte VII 0 525 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General A Leviana 0 538 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General A Minha Musa 0 589 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Desejo 0 477 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Seus Olhos 0 560 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Inocência 0 496 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Pedido 0 545 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Desengano 0 497 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Minha vida e meus amores 0 559 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Canção do Exílio 0 493 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Canto do Guerreiro 0 792 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Canto do Piaga 0 592 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Canto do Índio 0 612 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Caxias 0 601 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General Deprecação 0 618 11/19/2010 - 16:53 Portuguese
Poesia Consagrada/General O Soldado Espanhol : Parte I 0 454 11/19/2010 - 16:53 Portuguese