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O Retrato - Capítulo VII

VII
"Luís soltara Storm para a box principal após o examinar atentamente. Era sem dúvida um belíssimo cavalo. Com as suas longas crinas castanhas terra e olhos de um negro incrivelmente brilhante, parecia deixar transparecer uma tal nobreza que não negava a sua origem.
Descendentes da raça de cavalos domesticados mais antiga, que há conhecimento, o Puro Sangue Árabe, estes Puro Sangue Inglês herdaram a enorme resistência física e capacidade impar de manter elevadas velocidades. Estas características haviam-nos tornado uma das raças com maior dispersão no mundo.
Não via a hora de o poder mostrar a Marta. Ela iria adorar.
- Luís, come here, please. - Roger, o seu coordenador em Inglaterra, chamava-o. Era hora de voltar ao trabalho.
Deixando para trás o cavalo, começou a caminhar na direcção oposta.
Subitamente, uma terrível dor de cabeça abateu-se sobre ele como um trovão. Tudo à sua volta começou a ficar turvo e as pálpebras estavam tão pesadas que pareciam feitas de chumbo.
Finalmente, também as pernas começavam a ceder. Estava a cair e não podia fazer nada para o evitar.
Estranhamente, aquela queda parecia não ter fim. Era como se tivesse entrado num poço directo para os abismos da Terra.
Caía, caía, caía. Não sabia dizer durante quanto tempo, nem fazia a mínima ideia do que se passava à sua volta. Para onde iria ele? Alguma vez pararia?
Em breve teria a resposta. Subitamente, o seu movimento desenfreado foi interrompido, contrariando todas as leis da cinética. Estava no meio do nada! Uma escuridão impenetrável envolvia-o e não conseguia sentir nada sólido, nem mesmo debaixo dos pés.
Seria aquilo real? Estaria mesmo naquele lugar, ou tudo não passava de uma criação da sua mente? Devia estar a sonhar, certamente. Tudo não devia passar de uma consequência daquela horrível dor de cabeça.
No entanto, enquanto se questionava sobre a veracidade do que se passava, o mundo à sua volta começava, lentamente, a tornar-se mais definido. Os contornos do que sugeriam ser árvores começavam a materializar-se, acabando por se encontrar no que lhe parecia ser, nada mais nada menos que, o Jardim da Carreira. Olhou em volta procurando ver alguém, mas as luzes fracas dos candeeiros não ajudavam. Ficou então muito quieto, tentando apreender algum som, mas nada lhe chegou aos ouvidos.
Confuso começou a caminhar, tendo por companhia o gemer da areia debaixo dos pés e um silêncio tão denso que parecia tornar o ar mais pesado.
Quando já se encontrava no final do jardim, para seu alívio, conseguiu ver alguém. Uma nova esperança afigurou-se-lhe. Poderia pedir ajuda, perguntar o que se estava a passar. Porque estava ele aí? Tentou correr para a pessoa, mas as suas pernas não lhe obedeceram. Continuavam a caminhar à mesma velocidade que anteriormente e pararam alguns metros antes do desejado.
O rapaz que se encontrava no jardim pareceu sentir a presença de mais alguém. Voltou-se e sondou a noite. Nesse momento, Luís reconheceu-o. Era o mesmo rapaz que lhe assombrava as noites, esperando uma Maria que nunca chegava. Era o tal João. Esperaria ele, uma vez mais, por ela?(...)"

(in O Retrato - Autora: Luzia Gomes - Corpos Editora)

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domingo, julho 5, 2009 - 10:51

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