O fantasma da velha escola - 9

A  mãe de Alfredinho o sacudia. Seu rosto mostrava uma séria preocupação. Ele acordou, perguntando-se se o pesadelo realmente acabara. 
-M-mãe?!
-Meu filho, que aconteceu?
-N-nada, mãe.
-Nada? Você gritava a plenos pulmões.
-Foi só um pesadelo.
-Por que você falou o nome do José Afonso?
-Fa-falei?
-Sim.
-Não sei.
-Bem, quer um chá.
-Não, mãe. Voltarei a dormir. Não precisa se preocupar. 
-Tem certeza?
-Tenho.
Recostou-se no travesseiro, sabendo que não voltaria a dormir. A mãe o beijou antes de sair do quarto.
"Meu Deus, será que foi só um pesadelo mesmo?"
No outro dia, viu Marcão no pátio. Perguntou:
-Marcão, não vai entrar na sala?
-Não sei, Alfredinho. Mal consegui dormir a noite passada.
-O que foi?sentou-se ao seu lado.
-Eu sonhei com o José Afonso.
-Mesmo? - Alfredinho se colocou em alerta - Sonhou mesmo com ele?
-Sim, e foi muito nítido.
-Conte-me!
-Por que o interesse?
-P-por n-nada. Só me conte.
-Não foi apenas nítido. Foi horrível. Eu estava na velha escola, no pátio, onde nós dois ouvimos o José Afonso gritar e cair da escada. Estava escuro e eu me perguntava: "Que estou fazendo aqui? Eu nunca mais vim aqui! Foi aqui que meu melhor amigo morreu!" Então, eu escutei a voz dele dizer: "Precisei morrer para descobrir que você não é, aliás, nunca foi realmente meu amigo, seu covarde!" Eu me ajoelhava e gritava: "José Afonso, eu sei que fui covarde, mas eu estava com muito medo! Você precisa me perdoar, por favor! " A resposta dele era: "Ah, e você vai ficar vivinho, enquanto eu estou aqui, morto?O Alfredinho e você vão seguir com suas vidas e eu passarei a eternidade aturando essa menina chata? A nojentinha quer mais companhia, sabia?" Meu Deus, Alfredinho, eu comecei a sentir um fedor insuportável! E a ouvir passos se aproximando. Eu caía de joelhos e tentava não chorar porque, Alfredinho, a minha vontade era a de chorar como um menininho com medo do escuro. Além de cair de joelhos, eu fechava os olhos e tapava o nariz, porque o fedor ia ficando mais forte. Então, de repente, eu ouvia bem em cima de mim: "Abra os olhos, covarde! Veja seu melhor amigo, deixa de ser molenga!" Mas eu não abria. Foi aí que duas mãos agarraram meu pescoço, Alfredinho! Duas mãos frias e podres! E o fedor, minha nossa, o fedor! Eu abria os olhos e via o José Afonso, com o rosto decomposto, quase virando uma caveira e gargalhando! Mas o pior foi que, junto com a gargalhada dele, começou a ecoar uma gargalhada de menina! Meu Deus, como eu gritei! Meus pais acordaram e quiseram saber sobre o que era!
De olhos arregalados, Alfredinho pensava no seu pesadelo. Contaria ou não a Marcão? Ia dizer algo, mas viu Lilith se encaminhando em direção à sala de aula e falou:
-Acho que a Lilith pode nos dizer algo.
-...
-No velório do José Afonso, ela veio me dizer que ele não nos queria lá.
-Será que ele...
-Óbvio que ele estava lá, vendo tudo.
-Mas só ela o via.
-O que ele não deve ter dito da gente. Ele está com muita raiva!
-O pior é que ele tem razão.
-Mas Alfredinho, ele não pode nos perdoar? A gente não queria isso! Foi tudo um acidente! E não fomos nós que o matamos! Nem estávamos com ele na hora!
-Será que a menina que morreu foi empurrada ou caiu sozinha?
-Nunca souberam. Meu pai contou que apenas a encontraram morta, com o pescoço quebrado. Houve um boato de que abafaram o caso e os pais dela ficaram revoltados, porque ela era filha única.
-Nossa! Será que a Lilith sabe...?
-Isso faz diferença agora?
-Não sei. O que sei é que estou com medo, Marcão. 
Alfredinho decidiu não contar seu sonho a Marcão.
-Vamos assistir à aula, Marcão?
-É, vamos.
Lilith, sentada na sua carteira, lia um livro. Marcão e Alfredinho notaram que ela parecia mais abatida e com o rosto mais fino. 
-Será que o José Afonso continua aparecendo para ela?
-Tenho certeza que sim, Alfredinho.

Submited by

Sunday, August 16, 2015 - 19:30

Prosas :

No votes yet

Atenéia

Atenéia's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 7 years 27 weeks ago
Joined: 03/21/2011
Posts:
Points: 2453

Add comment

Login to post comments

other contents of Atenéia

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Love Saudade 0 1.224 06/10/2013 - 16:17 Portuguese
Prosas/Contos Reconciliando-me com Deus 0 1.304 06/09/2013 - 15:04 Portuguese
Prosas/Contos Reconciliando-me com Deus 0 2.115 06/09/2013 - 15:04 Portuguese
Críticas/Movies O preço da curiosidade 0 3.296 05/19/2013 - 20:20 Portuguese
Poesia/General Estou sozinha 0 3.776 05/17/2013 - 18:46 Portuguese
Poesia/Meditation A coruja 0 2.913 04/25/2013 - 14:49 Portuguese
Poesia/Gothic O castelo 0 1.169 04/24/2013 - 01:26 Portuguese
Poesia/Love Teu sorriso 0 1.176 03/30/2013 - 18:19 Portuguese
Poesia/Gothic Uma casa vazia 1 1.199 03/28/2013 - 19:33 Portuguese
Poesia/Disillusion As dores são muitas 0 2.168 03/27/2013 - 19:31 Portuguese
Poesia/Disillusion Only sorrow 0 2.838 03/26/2013 - 19:33 English
Poesia/Meditation When we needed 0 1.722 03/26/2013 - 19:29 English
Anúncios/Miscellaneous - Offers Aulas particulares 0 5.133 03/24/2013 - 18:35 Portuguese
Poesia/General Sigo meus anseios 0 1.741 03/24/2013 - 18:34 Portuguese
Poesia/Love Forgiveness 0 2.369 03/19/2013 - 19:18 English
Poesia/Love I am the only one 0 3.081 03/14/2013 - 15:08 English
Poesia/Love All my treasures 0 2.110 03/10/2013 - 22:53 English
Poesia/Disillusion Take your pain away 0 3.048 03/10/2013 - 22:50 English
Poesia/Gothic Lost in darkness 0 2.946 03/03/2013 - 14:05 English
Poesia/Friendship I won't leave you 0 5.161 02/26/2013 - 00:54 English
Poesia/Gothic Cry in peace 0 3.609 02/20/2013 - 12:40 English
Poesia/Friendship You aren't the only one 0 3.446 02/19/2013 - 20:27 English
Poesia/Meditation Um mistério 0 1.099 01/20/2013 - 13:29 Portuguese
Poesia/Love I can´t forget 0 1.639 01/18/2013 - 15:36 English
Poesia/Meditation Amanhã 0 1.237 01/18/2013 - 15:33 Portuguese