Pessoa
Sórdida procura infame.
Singrando vastas formas além daquilo que está à minha frente
Procuro uma visão, um detalhe preso entre o tempo e o espaço.
Ah, como eu gostaria de viver longe das horas e das distâncias,
Ser todos os autores em suas personalidades!
Descobri uma forma de dar vida aos que se foram,
Li, “É antes do ópio que minh’alma é doente”
E Álvaro de Campos se apossou de meu ser,
Sendo eu o meu ser apossado em Álvaro de Campos,
Mas como posso querer ser O poeta decadente
Se Fernando Pessoa já o era?
Ah, que inveja de Fernando Pessoa! Contudo se sou o Opiário
Então não sou dois, mais sim três, pois Pessoa passa a ter mais um heterônimo,
Passo eu, a ter mais um heterônimo rabiscado na memória,
Todos os estados físicos e psicológicos.
Dou vida à minha vida várias vidas.
Por que caio em depressão então? Por que bato a cabeça na pedra
Da solidão desta ampla literatura-confusa?
_ É porque estes poetas caminharam pela nebulosa letargia,
Na contramão das “crianças” em suas brincadeiras de lógica observação.
É quase impossível libertar o Sorriso no cárcere da Tristeza.
Mesmo assim meu sangue dança em minhas veias
Como no cair de vinho pelas folhas das vinhas.
Atirem-me na rua,
Atirem-me nas pedras à beira-mar.
Atirem-me na maior das arenas dos leões do maior dos impérios,
Atirem-me fora do mundo,
Mas não me atirem fora de mim.
Se não sou todos, não sou ninguém, mesmo triste, mesmo calado,
Mesmo só, tão só, mesmo sendo apenas uma chama num pavio duma vela,
Quero apenas sê-los, ou então não lutarei pelas confluências dos meus “milagres”.
Se os melhores livros são criticados como ruins,
É porque os olhos daqueles que os leram
É que estavam ruins.
Ah, que inveja de sua inteligência tímida
De seu olhar triste e melancólico
De sua potência oculta!
Não escrevo por querer ser alguém
Ou para alcançar o auge no altar da fama,
Ou por querer fazer parte dos seletos grupos de escritores.
Escrevo porque o momento existe,
Escrevo porque existo
E se eu existo é porque escrevo.
Não escrevo por querer ser mais inteligente do que os outros,
Nem por ser um sábio, não, me livrem.
Escrevo porque tudo à minha volta é infinito,
Infinito é tudo à minha volta, porque escrevo.
Meus mares oceânicos são letras no qual navego em meu barco-cérebro,
Sou todos que leio
E não posso querer ser todos que leio
Por que sou eu.
Mas o que forma o eu, se sou eu, apenas eu quem está a ler o que leio?
Escreveram em minha alma a poesia mais rica,
Encarnaram em minha alma milhões de almas roubadas
Que dos livros foram se atirando em mim
Num disperso redemoinho dentro das paredes sob o teto estrelado,
Entraram em forma de letras pelos meus olhos.
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Poesia :
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Comments
Re: Pessoa
Muito bom, sabe que em Mim, tudo começou depois de Álvaro de Campos, o primeiro que me chamou atenção foi "Adiamento" que me gerou uma puzta identificação, depois opiário...depois, li quase tudo que há, um belo dia acordei em verso e graças a Deus nunca mais parei de poetar.
E espero morrer, de velha, assim, louca, heterônima em Mim.
Grande abraço,
Querido irmão em "Pessoa"
Re: Pessoa
É Analyra,
Pessoa cativou e ainda cativa a todos que gostam de uma boa poesia.
Obrigado pelo cometário.
Abraços.
Re: Pessoa
Excelente navegação pelos mares da alma de "Pessoa" onde em fim chega a conclusão que a escrita é o amor que invadio o mar do seu ser... podendo assim ele ser ele e ser outros...as palavras o conquistou e nos conquistou tomaram novas formas...Muita linda homenagem ... Muito lindo eu adorei...
:-)
Re: Pessoa
Obrigado!
É um prazer receber comentários tão inteligentes.
Abraços
Re: Pessoa
A tua poesia crê e consegue atingir o profundo do ser de quem te lê :-)
Não és heterónimo de Pessoa és o poeta que rumoreja a imaginação de quem convidas a ler-te :-)
Bjs
IC
Re: Pessoa
Obrigado,
A poesia tomou este rumo quando a escrevi e me parece que sem querer deu este sentido de ser heterónimo de Pessoa, mas foi também uma maneira de homenager tal poeta, que sempre gostei. Não quero que confunda, às vezes sem querer, por meio de leituras, de pensamentos, de hitórias ou até imaginações, vamos caminhando de forma a ir galgando em semblantes alheios.
Abraços.