carta ao sentimento Amor.
Espero-te, não desisti de ti, ainda guardo um alforje suprimentos para mais um empreitada. Ainda guardo na mala um agasalho para o inverno frio, ainda guardo um fio de afeto para costurar as noites vazias que me separam de ti. Dizem-me que és sonho, ilusão, loucura, perda de tempo. Mas isso também disseram a Galileu quando disse que a terra era redonda. As verdades universais materializam-se na medida do tempo, não através da vontade. Não se força a existência, ela simplesmente existe, não se cultivam sentimentos eles brotam do solo do peito de uma forma natural, são ervas da natureza, selvagens, não brotam em canteiros pela vontade das mãos dos homens. São originais, ervas nativas que habitam apenas determinados solos. Assim como o ar, sei que és livre e circundas a todos bem como sei que as escolhas são múltiplas e fractais. Fora da liberdade sei que não viverás. És livre por definição e a tristeza sempre te acompanhará na medida da tua prisão. Talvez isso eu não tenha entendido, talvez isso me afastasse de ti toda a vez que me aproximava e queria desesperadamente engarrafar-te para em uma noite de solidão beber-te na minha cozinha aquecida pelo fogo onde cozinho meus desejos e sonhos.
Mas prefiro ter-te ao meu lado embriagado da tua própria vinha. Não mais irei buscar-te ou tentar aprisionar-te entre os dedos, pois te sei líquido, muito menos te engarrafarei por egoísmo para ter-te apenas para acompanhar minhas noites de solidão ou minhas refeições feitas de carne e pão. Não mais usarei-te como modelo em meus quadros aprisionando-te em uma imagem bidimensional. Simplesmente te esperarei serena, sem perturbar. Tenho todo um universo para acompanhar-me. Não farei pactos, não te cobrarei condutas, não colocarei a faca no teu pescoço e direi "a bolsa ou a vida?" Simplesmente sentarei e observarei a infinitude rítmica das ondas do mar que pacientemente batem e batem à areia sem saber porque. Elas não precisam saber, o fazem por simplesmente serem ondas do mar, é seu jeito de ser.
Portanto sei que um dia aparecerás, à porta da minha casa, à mesa de um café, em um saguão de aeroporto, num banco de um trem qualquer e verei a tua luz, em qualquer lugar, talvez apenas no sorriso de uma criança ao despertar ou na faísca de algum olhar ateu.
Ainda não foi minha última empreitada, ainda te espero Amor, um dia acharás meu endereço e me encontrarás. Enquanto este dia não chega costuro meus lindos bordados de saudade do que não vivi, no linho da esperança do que não conheço debruado com o cetim da mais pura entrega e esperança. Acredito, sobretudo acredito em ti. Ainda guardo um alforje de suprimentos para mais tantas outras jornadas...
Apenas não sairei mais insana caçando-te inutilmente, pois agora percebo que por definição és dócil, apenas tímido, e, quando for a hora, eu estiver pronta, saberás me achar.
Da tua esperançosa cara metade.
Ana Lyra.
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Comments
Re: carta ao sentimento Amor.
Oh minha safada até me comoveste...
Ca estou, cheia de lágrimas a ler-te e a pensar, (estas a ouvir amor imbecil? ela esta a tua espera!)
Achei lindíssima a forma como descreveste essa tua redenção, com alguns recursos no alforjes, pacientemente à espera q o amor te descubra, tu queres tanto descobri-lo, mas ele é q tem de nos descobrir a nós, por isso se engana tantas vezes, ele nem sempre sabe o q anda a fazer...
Existe tanta paixão dentro de ti, tanta furia de amar, de ser amada q eu me enterneço a admirar essa tua coragem toda!
Eu não sou assim, por norma fujo do amor como o diabo da cruz, pq qd ele me encontra vem com tanta fome q me devora sem perguntar se eu estou preparada, depois um dia parte e eu não tenho forças para nada pq o alimentei aquele tempo todo e esqueci-me q eu tb preciso de comer...
Mas isto foi só um delírio cúmplice meu...
Que o amor te saiba encontrar, te saiba saborear devagarinho!
Beijinho grande, grande em ti!
Inês
Re: carta ao sentimento Amor.
Libris querida, como podemos ser tão parecidas sendo tão diferentes?
Querida, já posso dizer amiga. Sofremos do mesmo mal, apenas do avesso. Já passei por esta faze de fugir do amor como se foge da morte, mas viver sem ele também é uma forma de estar morta. Eu havia me resignado em ser um ser dormitante, sem amor esperando a morte. Mas novamente por uma fração de segundo uma luz brilhou e dei-me conta que tudo é muito sem cor sem ele, sem gosto, sem poesia. Hoje sinto-me vazia, como bem disseste, mas este vazio já me é tão familiar que sobrevivo. Mas não desisto, apenas parei de buscar, de tentar abraçar, pois as vezes abracei com tanta força e com tanto fogo que acabei por derrete-lo, evaporá-lo e sair com o peito em carne viva queimado cheio de cicatrizes.
Isso mete medo e o medo nos impede de viver.Eu decobri que amo, a vida acima de tudo. Não viverei por metades, não mais. Tenho o amor incondicional de meus filhos, dos amigos, inclusive pelo que vejo o teu, portanto sou uma pessoa "amável" e sempre por onde passo deixo um rastro de amigos bons e verdadeiros, que carrego sempre na minha mochila em forma de coração.(estás nela, no bolso principal).
Beijos grandes eu emocionei-me com teu comentário, vieram-me lágrimas também...
beijoca Ministra, teu coração é lindo e cheio de estrelinhas de todas as cores...
Fizeste uma pessoa feliz hoje pela manhã. Que Deus te ilumine e guarde e te mantenha assim nesta tua meiga docilidade, sempre vestida com o melhor do afeto que há.
beijos.
Re: carta ao sentimento Amor.
Ó minha querida amiga Ana
Que carta mais linda ao amor
assim é, não é loucura é um
sentimento que não se pega
assim como a terra, mas é
algo concreto dentro de cada
ser....Belíssima...Parabéns!
Grande beijo de carinho e amizade
Re: carta ao sentimento Amor.
É assim mesmo como colocas. Mas as vezes não percebo.
Grata Angela és uma pessoa com talha para o amor, eu talvez mais para a loucura e paixão, mas um dia chego lá, é preciso evoluir como diz meu sábio filho de 9 anos.
beijos.