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Por Ti Seguirei... (12º episódio)

(continuação de http://galgacourelas.blogs.sapo.pt/47407.html)

Quando chegaram à base de apoio já os seres nocturnos se manifestavam há muito. Alépio e Brági ficaram ostensivamente para trás, como medida preventiva para o caso de serem seguidos. Não havia novidade e, assim, rapidamente se juntaram aos outros num, uma vez mais, frugal e mal iluminado repasto.
De facto, o importante era mesmo o êxito da recente expedição. Alépio estava quase eufórico e, não fora a situação melindrosa em que estavam, até teria ganas de fazer uma festa. Havia visto e reconhecido muitos dos seus homens, entre os prisioneiros. Alguns dos quais, amigos de infância e outros que tal.
-“Digo-vos: todos - os que vi - estavam de perfeita saúde. Algo tristonhos, mas isso é natural. Os Romanos querem-nos realmente em boa forma. Estão a tratá-los bem. São muitos e provavelmente não vi a maioria, porque também, entretanto, aquele tribuno aproximou-se e exigiu explicações para a nossa presença… De toada a maneira, são mais do que os que tinha visto há muitas luas atrás. Devem ter reunido aqui uma boa parte dos prisioneiros que conquistaram a Aníbal.”
-“Viste Tongídio?...” Perguntou Rubínia.
-“Não. Lamento. Mas isso não significa que não esteja entre eles. Vou contar-vos o que eu e Brági fizemos, quando nos expulsaste da tenda. Hehehhe, que grande golpe, Gurri! Magnífico!”
Gurri, já estava perfeitamente imiscuído com os novos companheiros, alinhado com os seus objectivos e com a mesma vontade obstinada. Agora, já descontraído, soltou igualmente uma gargalhada, em reacção a Alépio. Este prosseguiu: -“Logo que saímos da tenda, pusemo-nos a caminho da paliçada Norte. Assumimos uma atitude descontraída: mãos atrás das costas, ora assobiar, ora a tagarelar. Fomos andando, admirando alegremente a sofisticação romana. Os legionários estranhavam a nossa passagem, mediam-nos com o olhar, mas não nos incomodaram até aí. Chegados ao extremo, viramos a Leste e foi então que vimos uma mudança radical da paisagem. Os Romanos não construíram o campo fortificado por acaso naquele sítio. Há um bom motivo para a sua localização. Pois oiçam e pasmem: a acompanhar uma boa parte do muro Norte, existe uma fossa natural de gigantesca dimensão. Parece que arrancaram dali uma montanha pela raiz, deixando um descomunal buraco no chão. Só alguém poderoso com Larauco o poderá ter realizado. Essa monumental cavidade tem uns bons 8 homens de altura e, dentro, está rodeada de muitas pequenas grutas. É nestas que se abrigam os nossos cativos camaradas. Parece um acampamento lítico. Este cárcere de pedra tem uma só saída a Leste, através de uma rampa serpenteante interna, que desemboca num grosso portão, ladeado por duas torres de vigia. A toda a volta tem uma forte presença da guarnição, com patrulhas constantes, que vão circundando o fosso.”
Brági também interveio: -“Os que estão encerrados não têm qualquer possibilidade de fuga se não forem auxiliados de fora. De cima, os legionários facilmente esmagariam qualquer revolta, antes mesmo que eles conseguissem alcançar o portão…”
-“Por isso, temos de planear bem o assalto e a fuga. Somos poucos e não teremos qualquer hipótese se não conseguirmos soltar os nossos irmãos antes que os romanos tentem reagir”, atalhou Alépio.
-“Só naquele quinhão de terreno devem estar instalados muitas centenas de soldados inimigos. Temos de os afastar de lá. Criar uma manobra de diversão e atraí-los para longe. Só depois, atacar ferozmente e sem piedade, libertando rapidamente os prisioneiros e armá-los também. Então será a debandada geral, dada as diferentes proveniências dos militares púnicos. Nessa altura também teremos de ser lestos na reunião dos que pertencem aos clãs célticos e iniciar a fuga, aproveitando a confusão que reinará nas hostes romanas.” Gurri mostrava a sua sabedoria na arte de guerra.
Rubínia, que já estava a imaginar o cenário da batalha, também quis partilhar a sua visão: - “Exactamente, precisamos de um artifício que engane os itálicos. Vamos ter de dividir a força. Considerando que só nos resta atacar de noite, poderíamos colocar uma vintena de homens no exterior do muro Sul - no oposto do objectivo - a arremessar projécteis contra o campo. Primeiro, com fundas, atirariam pedras aos vigias e, de seguida, disparariam setas incendiárias para cima das tendas. Tenho a certeza que arderão facilmente e produzirão forte efeito. No escuro, e bem munidos de arcos e fundas, iludiremos o inimigo que imaginará que tem um pequeno exército à porta. Podemos também, incendiar a vegetação a Oeste e dar ideia que estamos concentrados no flanco Sudoeste. E, se desviarmos o pequeno curso de água que atravessa o arraial inimigo, eles não terão água para combater o fogo e serão forçados a centrar nisso o seu esforço.”
-“Excelente também, Rubínia!”, aprovou Alépio. – “Agora, só nos falta o plano para entrarmos a Norte, enquanto os Romanos nos procuram a Sul. Vamos ter silenciar as sentinelas, galgar a paliçada e investir em duas frentes, os guardas que permanecerem junto do portão da entrada do fosso e abrir a porta Norte da fortaleza para, por aí, escaparmos posteriormente.”
- “Para isso vamos necessitar de cordas, com espigões nas pontas, para se agrilhoarem aos topos dos troncos da paliçada. Alguns dos meus Vacceus são especialistas em movimentos furtivos. Começarão por aniquilar os vigias. Quando a passagem estiver livre, entraremos todos e atacaremos conforme determinou Alépio.”
- “Vamos então repousar. Amanhã temos muito que fazer. Em Sekia encontraremos as cordas, os arcos, as flechas e os outros materiais que necessitamos. As transacções têm de ser feitas sem levantar suspeitas. Seremos mercadores de artigos bélicos. Iremos à civitas em dois grupos: o principal e o de apoio, que estará sempre por perto, mas sem que se comuniquem. Depois preparamos tudo e atacaremos na próxima Lua. Que a Senhora da noite nos seja auspiciosa e benéfica.”
Tal como previsto, deslocaram-se a Sekia. A operação decorreu normalmente. O grupo de seis, com funções de adquirir as mercadorias, cumpriu a sua parte diligentemente, bem como os oito homens que se faziam passar por mercenários se mantiveram sempre prontos para as eventualidades que pudessem surgir.
No regresso, mais um golpe do destino abriu nova perspectiva nos planos.
A comitiva da frente, disfarçada de negociantes, foi abordada pouco após ter ingressado no caminho principal e que levava ao campo romano. Tratava-se de uma pequena formação de Aravecos que seguia um pouco atrás, na mesma direcção. Adiantaram-se a Gurri e aos seus e barraram-lhes o caminho. Cercaram-nos.
O líder iniciou a conversação: -“Quem sois vós que passais tão descansadamente por nossas terras? Não tendes receio de perder as mercadorias, assim tão parcos de homens de armas? Qual é o vosso destino? Serão as paragens dos nossos desprezíveis vizinhos, Iacetani? ”
Gurri, impávido e sem mostrar qualquer nervosismo, respondeu: - “Somos mercadores, Vacceus. Levamos armas ao campo romano. Há itálicos que gostam de coleccionar armamento autóctone e levar recordações para a pátria.“ Deu um esticão ao cavalo e obrigou-o a fazer um círculo. Viu o que queria, o grupo de Alépio já estava nas redondezas e tomava posição, escondido entre a vegetação.
- “Vacceus? Hum, os guerreiros das tuas tribos andam um pouco desnorteados, sem saber bem o partido que tomar. Continuam com medo de lutar, como se fossem mulheres prenhas. Vamos precisamente para o reduto dos nossos aliados Romanos, preveni-los que um grupo importante de Celtas passou a caminho de Nova Cartago. Preparamos-lhes uma boa armadilha. Contudo desconfiamos que os teus roeram a corda e deram com a língua nos dentes. Sigamos então todos ao forte romano e ver se eles ainda vos compram as armas ou se vos enforcam nas cordas desses arcos que aí levam”, gracejou, o Araveco.”
Uma vez mais, clarividente, Rubínia usou da astúcia. Os ataques às caravanas de seu pai, Físias, resolviam-se muitas vezes atiçando a cobiça dos salteadores. Lembrou-se do que havia aprendido e, num movimento pujante, atirou para o chão a bolsa das moedas, espalhando-as abundantemente pelos pequenos arbustos do caminho.
Os Aravecos menos disciplinados lançaram-se sofregamente das montadas à cata do vil metal. O caudilho dos opressores observou o movimento, ainda sorridente. Quando encarou novamente Gurri sentiu, apenas por breves momentos, a lâmina fria da arma do oponente a embeber-se no seu pescoço, cortando-lhe o ar e a palavra, tombou e não mais se moveu. Os que continuavam montados, também não tiveram tempo de reacção: Zímio, com dois golpes contínuos, rasgou profundamente o peito de um e rachou o crânio de outro; Rubínia empinou o cavalo e quando este descia, também a sua arma caiu tensa no ombro do Areveco que tinha ao alcance; Gurri já tinha abatido um segundo inimigo; e os restantes foram trucidados sem contemplações. Os que estavam apeados, ao verem a carnificina, tentaram fugir para o arvoredo, mas Alépio e os seus sentenciaram o seu destino. Apenas pouparam um, para interrogar.
O Araveco sobrevivente, trémulo, relatou tudo quanto sabia: vinham do campo militar romano de Ardósia, a Norte de Numância, com a missão de informar o campo romano junto a Sekia, onde guardavam os prisioneiros, alertando-os para o perigo potencial de um ataque de Aníbal, face ao incremento das suas forças com tropas celtas frescas. O praefectus legionis de Ardósia, Cordus Paulus Vallis, recomendava inclusivamente que enviassem imediatamente os prisioneiros para Roma. Era demasiado arriscado manter tantos prisioneiros reunidos, mesmo à sombra de uma Legião inteira. De qualquer forma, enviava mais uma legião, das duas que tinha sob seu comando, para reforçar a área de Sekia, enquanto não se livrassem desse peso e chamariz de ameaça.
Na verdade, os Aravecos eram apenas uma chusma de batedores. A Legião de reforço estava apenas a dois dias de marcha.
(continua…)

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terça-feira, agosto 10, 2010 - 08:28

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