Hajime TANABE - Filósofos Modernos e Contemporâneos

TANABE, Hajime
1885 – 1962
Antes de Filosofar é preciso confessar.
 

Hajime TANABE nasceu em Tóquio, Japão, em fins do século XIX. Essa relativa antiguidade e o fato dele ser um Filósofo oriental despertam a princípio certo estranhamento sobre o motivo de esse Pensador figurar no âmbito da Filosofia Ocidental e Contemporânea.
Mas essa estranheza logo se dissipa ao se observar o quão atual e ajustada é a sua Tese aos nossos dias e ao fato de que as barreiras geográficas perderam importância graças às possibilidades de troca de informações instantâneas.
No desenrolar desse Ensaio veremos que seu Pensamento se alia a tantos outros na eterna busca por respostas que move o Homem; e que vale à pena conhecê-lo, ainda que seu prestígio não tenha se espalhado como o de outros em nosso país.
Depois de estudar na Universidade, TANABE foi nomeado Professor Associado de Filosofia, na Universidade de Kyoto (a ex-capital japonesa) e ali se tornou um membro ativo do Movimento intitulado “Escola de Filosofia de Kyoto”, que trouxe novos Ares ao Pensamento tradicional japonês.
Na década de 1920, esteve por algum tempo na Alemanha estudando com os Filósofos Edmund Husserl e Martin Heidegger. Ao regressar, assumiu o cargo de Professor Pleno, mas a eclosão da 2ª Guerra o afetou profundamente e logo após a rendição do Japão ele se aposentou da vida acadêmica.
Um ano depois, em 1946, publicou sua obra “chave” intitulada de “Filosofia como Metanoética” e daí em adiante, dedicou-se à reflexão, ao estudo e à produção de textos filosóficos até que veio a falecer de causas naturais.
Sabe-se que questões como “ignorância”, “salvação” e “confissão” sempre frequentaram os estudos e as reflexões filosóficas de todos os tempos. Já na Grécia Clássica, após ter sido apontado pelo Oráculo de Delfos como o Homem mais sábio do Mundo, Sócrates tentou convencer seus pares do equívoco, mas em vão. Após inúmeras tentativas inúteis, ele acabou aceitando o epíteto, mas apenas por ser capaz de reconhecer a própria ignorância. Foi então que disse a célebre frase “Só sei que nada sei”.
Posteriormente, no século IV d.C., Santo Agostinho escreveu “As Confissões”, que pode ser considerada sua autobiografia. Nela, ele “confessa” seus erros, em meio a outras reflexões filosóficas.
No Oriente, o monge budista Shinran afirmava que a “Salvação (no sentido de iluminação, de salvação das trevas da ignorância)” só é possível por meio de “Outro Poder”.
Enquanto isso, Heidegger afirmava que a Filosofia é essencialmente uma questão sobre como nos relacionamos com o “nosso eu”. Com o nosso “próprio existir”.
A soma dessas variáveis, concordes ou discordes entre si, forma um conjunto que se abriga no campo da Ética. E foram os valores éticos que formataram o Ideário de TANABE, cuja influência recebida dos Eruditos citados é patente. Abaixo poderemos observar o resumo de seu Sistema:

1 – Para um problema pertencer à Filosofia é preciso que nele exista algo inconcebível, impensável.
2 – Pois a Filosofia é justamente a ação de se fazer as “Perguntas mais profundas sobre a vida”.
3 – Contudo, antes é preciso admitir que a nossa capacidade intelectual é limitada e que Não sabemos as respostas.
4 – É preciso, portanto, “confessar” a nossa limitação e a nossa ignorância.

Essa ideia sobre a necessidade de “confessar a ignorância e a limitação” pode parecer estranha, mas é uma noçao que Hajime insiste em considerar. E para melhor entendermos seu ponto de vista precisaremos examinar as raízes de sua Filosofia, tanto em sua tradição europeia, quanto japonesa.
Com referência à primeira, a europeia, vemos que TANABE remontou seu Pensamento à Grécia Antiga e, como já citamos, ao Filósofo Sócrates, que “confessou” “só saber que nada sabia”. Já as raízes japonesas de seu Ideário remontam ao monge budista Shinran, da Corrente filosófica “Terra Pura”.
Embora fosse fiel aos cânones de sua Escola de Pensamento, Shinran inovou ao afirmar que a “Iluminação (ie, a elevação mental, espiritual)” É impossível se confiarmos apenas em nossa própria capacidade. Em nosso próprio poder. Em invés disso devemos sempre “confessar” as nossas limitações e a nossa ignorância de modo a estarmos abertos e receptivos ao que ele chamava de Tariki*, ou “Outro Poder”, que no contexto da “Terra Pura” é o Poder do Buda Amitabha**.

*Tariki – é um nome que também foi adotado e largamente utilizado por TANABE, em seus escritos.
** Buda Amitabha – é um dos cinco Budas (representados por estatuetas) que são cultuados pelos adeptos. Amitabha é o principal da “Família de Lótus” e representa a Sabedoria discriminativa. É especialmente comprometido com a “iluminação” do Homem.

Desse modo, viu-se que a concepção de “Confissão ou de Admissão de ignorância e/ou limitação” sempre foi assaz importante no conjunto de Pensamentos que chegaram a TANABE.
A “confissão” leva ao reconhecimento do “Nada Absoluto”, que, ao cabo, conduz ao próprio despertar e à Sabedoria que disso resulta. Ou seja, ao reconhecermos que estamos despidos de qualquer saber, somos estimulados a buscá-lo até que efetivamente o alcancemos.
Destarte, para o Pensador, a Filosofia NÃO é o ato de investigar/discutir as noções, as assertivas (falsas ou verdadeiras) a Lógica, a Metafísica, a Beleza e os outros assuntos que tradicionalmente são abarcados pela disciplina.
Não é uma “Disciplina Mental, Intelectual”, mas é sim, algo muito mais fundamental, básico. É um Processo para se relacionar no sentido mais amplo possível com o “próprio eu”.

NOTA do AUTOR – nesse trecho fica clara a influência de Heidegger sobre o Ideário de TANABE, haja vista ser de sua autoria essa concepção.

TANABE acreditava que apenas pela “Confissão” é que podemos descobrir o nosso “eu verdadeiro”, pois aquilo que nós imaginamos ser não passa de um amontoado de conceitos alheios que nos foram dados. Para ele é preciso “admitir o nosso vazio” para nos vermos em essência.
Para descrever esse “Processo de Redescoberta do Eu”, Hajime usou termos religiosos em uma feliz analogia com a morte e a ressurreição pregada pelas Igrejas. Morte e ressurreição da Mente através do “Outro Poder (aqui a figura religiosa representa o poder do Raciocínio, exercido sem as amarras dos preconceitos e prejulgamentos que foram abandonados quanto ‘confessamos’ a sua inutilidade)”. A passagem da “visão limitada do eu” para a “perspectiva da Iluminação pela Sabedoria Verdadeira”.
Essa transformação, TANABE insiste em dizer, não é apenas “uma preparação” para a Filosofia; ie, não é um aprendizado para se habilitar ao Superior Conhecimento Filosófico. Ao contrário, tal mudança é a própria função da Filosofia, que deve estar baseada em nossa descrença sobre o nosso Saber anterior e na “renúncia de nós mesmos (na renúncia de nossa soberba em nos acharmos donos de determinados conhecimentos)” que é conseguida através do “Outro Poder”; ou seja, através do Raciocínio isento de premissas, predisposições etc.
Para TANABE, em outros termos, a Filosofia NÃO é uma atividade na qual nos engajamos ou à qual aderimos. Não realidade é “algo” que acontece em nosso íntimo e que nos permite acesso ao “Verdadeiro Eu”, por meio da renúncia do ego superficial. Ou nas palavras de TANABE, quando ocorre “a ação sem um Sujeito atuante”.

NOTA do AUTOR – aqui o leitor nota a clara e vigorosa influência do Budismo no Sistema de Hajime.

A “confissão contínua, ou a renúncia, ou o ascetismo intelectual contínuo” é, para o Filósofo, o ponto de chegada definitivo. Ao exercitarmos o reconhecimento de nossa ignorância e limitação, estaremos aptos para atender ao que TANABE propõe: o abandono da busca por novas respostas para os velhos problemas filosóficos. Propõe, ainda, que reavaliemos a própria Filosofia e a utilizemos como instrumento para o crescimento mental e espiritual.
Essas ideias encontraram eco favorável entre a Intelectualidade de todo o Mundo; porém, como não poderia deixar de ser, encontraram também algumas resistências.
Seus críticos apontam em sua Filosofia o que julgam um grave defeito: a mescla com as assertivas religiosas. Todavia, é importante considerar que a Religião em pauta, o Budismo, é muito mais uma Corrente Filosófica que Teológica. Afinal, Sidarta nunca assumiu a condição de “Santo”, ou “Profeta”, ou outra forma de intermediação entre o Homem e a divindade. A Verdade que ele atingiu – e que pregou – aconteceu apenas por obra de suas reflexões mentais, filosóficas, sem que tenham sido enviadas através de um anjo (sic).
Ademais, mesmo que se ajuntasse a elementos religiosos, não estaria fazenda nada diferente de Santo Agostinho, São Tomaz de Aquino e outros Pensadores, cujos Ideários são reverentemente acatados, apesar de contaminados pelas assertivas das Religiões.
O fato, então, sendo válidas ou não essas críticas, é que se faz de suma importância conhecer o Pensamento de TANABE, pois através do mesmo conseguimos preencher uma lacuna que lamentavelmente perdura no Pensamento Ocidental.

São Paulo, 29 de Junho de 2012.

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Saturday, June 30, 2012 - 11:51

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