Spinoza e o Panteísmo - Parte XI - A Ética baseada no Saber
Nesse capítulo, Spinoza volta a tratar das questões morais e o inicia inventariando os tipos mais comuns de ordem ética que são adotados pela humanidade. A saber:
1) O Sistema calcado nas virtudes budistas ou cristãs, que alguns chamam de “virtudes femininas”; ou seja;
1.1 – todos os homens são iguais.
1.2 – o Mal será combatido apenas com a utilização do Bem.
1.3 – “Amor” é sinônimo de “Virtude”.
1.4 – a Democracia ilimitada é a forma de governo apropriada.
2) O Sistema baseado nas teses de Filósofos como Maquiavel, Nietzsche e outros:
1.1 – exaltação às chamadas “virtudes masculinas” como o arrojo, a ousadia, a disposição para o combate etc.
1.2 – aceitação do fato de haver desigualdade entre os indivíduos.
1.3 – admissão e enaltecimento dos riscos inerentes ao combate, à conquista e ao domínio.
1.4 – identificação de “Poder” e “Virtude”.
1.5 – exaltação do continuísmo aristocrático como forma de governo.
3) O Sistema proposto pelos Filósofos gregos clássicos, Sócrates, Platão e Aristóteles, que contém:
1.1 – a negação de que os sistemas anteriores sirvam para todas as circunstâncias.
1.2 – a afirmação de que apenas a Mente (a Sabedoria amadurecida) pode julgar quando se deve agir segundo as “virtudes femininas” ou de acordo com as “virtudes masculinas”.
1.3 – a afirmação de que a “Virtude verdadeira” é a Inteligência, a sabedoria e não a humildade ou o arrojo.
1.4 – defesa de uma mescla entre Democracia e Aristocracia como forma de governo ideal.
A partir desse inventário, Spinoza partiu em busca da melhor forma de harmonizar essas posições divergentes e com isso criou uma síntese que ainda hoje é considerada a ideal.
Ele propõe de inicio que a “Felicidade” deva ser o objetivo da conduta humana, sendo a “felicidade” definida como “a presença do prazer e a ausência do sofrimento”.
Porém, como o “Prazer e a Dor” são conceitos relativos e passageiros e não estados absolutos ou definitivos, ele propõe que sejam considerados apenas como “transições”; assim, o “prazer” é a transição de uma situação negativa para outra positiva e a dor, obviamente, o inverso.
E porque, então, todas as paixões humanas são transitórias e as emoções são apenas movimentos em direção à realização (ou inteireza) do homem enquanto Ser; o homem ético, escorado na Sabedoria, saberá o momento oportuno de agir com a humildade adequada e/ou com o arrojo necessário.
Nesse equilíbrio é que está a “Virtude Verdadeira” e por isso, Spinoza não advoga que o homem se sacrifique em prol de outrem, até porque, para ele, o egoísmo é uma necessidade ditada pelo instinto de autopreservaçao. Em suas palavras:
“Já que a Razão não exige coisa alguma contra a natureza, ela admite que cada homem deva amar a si mesmo e procurar aquilo que lhe for útil, e desejar aquilo que o leve verdadeiramente a um maior estado de perfeição: e que deva esforçar-se para preservar o seu ser até o ponto que lhe compete”.
Respeitando, portanto, a natureza das coisas e dos homens, Spinoza constrói o seu ideário com base nas exigências da natura e não sobre um suposto altruísmo que foi tão caro e precioso para os Filósofos utópicos. Tampouco se apoia no egocentrismo nefasto que propõe ir além das necessidades naturais, como propuseram os pensadores “Cínicos”, entre outros.
Em linhas gerais, pode-se dizer que a sua sistemática nega:
1) Qualquer valor para a fraqueza, para a subserviência, para a humildade; pois elas seriam, na verdade, sórdidas enganações de manipuladores ou manifestações de fraqueza e covardia.
2) Qualquer validade para a soberba, para o orgulho que não se justifique por méritos reais. A presunção, diz, torna o presunçoso um incômodo para os demais.
São traços bem definidos e posições dotadas de uma rigidez que, em principio, parece destoar da suavidade que caracteriza o filósofo. E, realmente, no desenrolar de seus pensamentos, ele se reaproxima de sua faceta mais branda e, talvez, mais ingênua, como quando, por exemplo, mostra-se horrorizado com toda a maldade humana, com a inveja existente entre os que se dizem amigos e com o desprezo que cada qual devota a quem julga ser-lhe inferior. Uma ingenuidade, aliás, que se torna mais evidente quando ele propõe acabar com os males humanos através da simples eliminação das emoções e intenções negativas, já que para ele seria “simples” mostrar a todos os homens que o “ódio pode ser vencido pelo amor graças à proximidade entre ambos (sic)”. Em seus termos:
“Aquele que acredita ser amado por quem ele odeia torna-se presa de conflitantes emoções de ódio e amor, uma vez que amor tende a gerar amor; de modo que o seu ódio se desintegra e perde a força. Odiar é reconhecer a nossa inferioridade e nosso medo; não odiamos um inimigo que acreditamos convictamente podermos vencer”.
Todavia, a suposta ingenuidade do filósofo logo é superada e na sequência ele retoma a sua convicção acerca do Saber enquanto sinônimo de comportamento ético. Embora as suas palavras pareçam repetir a ideologia cristã, a rigor, trata-se de uma falsa impressão, haja vista que o cerne de seu Sistema Ético é mais influenciado pelos gregos do que pelos hebreus, como se pode inferir dessa outra afirmação:
“O esforço para compreender é a primeira e única base da Virtude”.
Continua...
Submited by
Prosas :
- Login to post comments
- 2512 reads
other contents of fabiovillela
Topic | Title | Replies | Views | Last Post | Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/General | A Dor | 0 | 1.574 | 12/11/2015 - 13:27 | Portuguese | |
Poesia/General | Quem dera | 0 | 2.124 | 12/08/2015 - 18:30 | Portuguese | |
Poesia/Love | A Gueixa | 0 | 1.704 | 11/25/2015 - 13:49 | Portuguese | |
Prosas/Others | Kant e o Idealismo alemão | 0 | 8.320 | 11/21/2015 - 20:44 | Portuguese | |
Poesia/General | Vidas | 0 | 1.738 | 11/08/2015 - 13:57 | Portuguese | |
Poesia/Love | Tempos | 0 | 632 | 11/07/2015 - 13:21 | Portuguese | |
Poesia/General | Nihil | 0 | 1.251 | 11/05/2015 - 13:43 | Portuguese | |
Poesia/Love | A Moça e o Luar | 0 | 2.013 | 11/02/2015 - 14:05 | Portuguese | |
Poesia/Sadness | A Atriz | 0 | 1.852 | 10/24/2015 - 12:37 | Portuguese | |
Prosas/Others | Lula, Dilma, Cunha e a "Banalidade do Mal" | 0 | 2.366 | 10/21/2015 - 23:32 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Mestres | 0 | 1.639 | 10/15/2015 - 13:24 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | As Cores de Frida | 0 | 1.719 | 10/12/2015 - 15:24 | Portuguese | |
Poesia/Love | Crepúsculo | 0 | 1.728 | 10/08/2015 - 14:23 | Portuguese | |
Poesia/Love | A Inquietude | 0 | 2.708 | 09/20/2015 - 15:44 | Portuguese | |
Poesia/Sadness | A Canção de Budapeste | 0 | 2.816 | 09/18/2015 - 14:13 | Portuguese | |
Prosas/Others | AS BODAS DE FÍGARO - Óperas, guia para iniciantes. | 0 | 2.109 | 09/18/2015 - 00:10 | Portuguese | |
Poesia/General | Húngara | 0 | 1.100 | 09/12/2015 - 16:07 | Portuguese | |
Prosas/Others | ORLANDO FURIOSO, Vivaldi - Óperas, guia para iniciantes | 0 | 1.879 | 09/10/2015 - 20:39 | Portuguese | |
Poesia/Sadness | O Menino Morto | 0 | 1.235 | 09/03/2015 - 14:23 | Portuguese | |
Prosas/Others | FIDÉLIO, Beethoven - Óperas, guia para iniciantes | 0 | 1.770 | 09/03/2015 - 13:36 | Portuguese | |
Prosas/Others | DR. FAUSTO, Gounod - Óperas, guia para iniciantes | 0 | 2.074 | 09/01/2015 - 13:37 | Portuguese | |
Prosas/Others | NORMA, Bellini - Óperas, guia para iniciantes | 0 | 2.390 | 08/27/2015 - 20:27 | Portuguese | |
Prosas/Others | OTELO, Verdi - Óperas, guia para iniciantes. | 0 | 2.340 | 08/24/2015 - 20:14 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | A Canção de Roma | 0 | 1.890 | 08/23/2015 - 16:37 | Portuguese | |
Prosas/Others | TURANDOT, Puccini - Óperas, guia para iniciantes | 0 | 1.881 | 08/20/2015 - 23:43 | Portuguese |
Add comment