O fantasma da velha escola - 5

Vestindos-se apressadamente, Alfredinho saiu para ir encontrar Marcão. Ao chegar, sentou num banco, nervoso. Será que Marcão acreditaria?
Marcão não demorou. Chegou, sentou ao lado de Alfredinho e perguntou:
-Como a Lilith sabe, Alfredinho?
-Não posso dizer em poucas palavras.
-Tudo bem, mas diga.
a aparência de Marcão era péssima: rosto cansado e olhos inchados, provavelmente de tanto chorar. Alfredinho teve uma certa pena dele. 
-Você não dormiu, não foi?
-Acha que eu iria dormir? perguntou Marcão com agressividade.
-Claro que não, Marcão. 
-Fale logo, meu Deus!
Pausadamente, tentando evitar um tom dramático, Alfredinho contou sobre a conversa com Litlith. Marcão disse com desconfiança:
-Ah, essa maluca inventou essa história.
-Marcão, não acha que é coincidência demais?
-Você acredita nessa história, Alfredinho? A Lilith vê gente morta e o Zé Afonso apareceu para ela?
-Por que ela iria aparecer para contar tudo isso, Marcão?
-Isso não faz sentido!
Os olhos de Marcão estavam injetados. Alfredinho falou com calma:
-Marcão, há outra explicação para a Lilith ter ido à minha casa contar isso? O Zé Afonso está morto e com raiva de nós dois!
-Ah, mas a ideia de ir lá foi dele! Ele que quis, desde o início, convencer você a ir lá para nós o assustarmos!
Morrendo de raiva por lembrar da armadilha, Alfredinho rebateu:
-E você adorou a ideia, não foi? Nem você nem o Zé Afonso foram legais!
-Quer parar de nos esculhambar? Você foi melhor do que nós, foi? Na hora H, foi um covarde!
-E você não foi covarde também, seu nojento?
-Fui! Fui covarde sim, seu nerd metido a besta, que sempre se achou melhor do que todo mundo!
Alfredinho viu que a discussão estava caindo no nível da baixaria e tentou acalmar:
-Marcão, se toda vez que tocarmos no assunto, lembrarmos dos erros que cometemos, vamos brigar.
-Tem razão.
-Mas pense numa coisa: não podemos deixar o corpo do Zé Afonso ali e, se o que a Lilith disse é verdade, o Zé Afonso está furioso conosco. 
-O que você propõe?
-Por que não vamos à polícia e contamos tudo? 
-Você ficou maluco, Alfredinho? Está tão maluco quanto a Lilith?
Muito sério, Alfredinho olhou para Marcão e argumentou:
-Marcão, se é verdade que a Lilith vê pessoas que morreram, ela não é maluca.
-Então, o que ela é? Bruxa, médium?
-Seja o que ela for, o que importa é que temos de fazer algo.
-Que tal não fazermos nada?
-Marcão!
-Vamos ficar quietos. Se ninguém souber de nada, será melhor.
-E o corpo do Zé Afonso na velha escola, Marcão? E os pais dele? Eles merecem isso?
-Não podemos fazer nada, melhor que ninguém saiba.
-A Lilith sabe.
-Pelo que vemos, não é do interesse dela espalhar a história, ou todos saberiam do segredinho dela, não é?
Alfredinho sabia que tinha de fazer algo em relação àquuilo tudo, mas o medo era sufocante. Pensou no que ocorreria se soubessem de tudo. Na escola, Marcão e ele seriam olhados de soslaio, lembrados como os covardes que haviam abandonado o colega. A vida se tornaria insuportável. Porém, ele conseguiria viver daquele jeito, corroendo-se de culpa e guardando aquele segredo infame? Olhou Marcão de esguelha e era evidente que o amigo de José Afonso estava sofrendo, talvez mais do que ele. Decidiu:
-Está bem, Marcão. Não falemos nada. A Lilith não vai nos dedurar, porque sabemos o segredo dela.

Submited by

Saturday, August 8, 2015 - 11:27

Prosas :

No votes yet

Atenéia

Atenéia's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 7 years 36 weeks ago
Joined: 03/21/2011
Posts:
Points: 2453

Add comment

Login to post comments

other contents of Atenéia

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/General Para o que vivemos 0 2.511 10/26/2016 - 15:13 Portuguese
Poesia/Meditation Os ecos da alma 0 2.079 10/25/2016 - 22:04 Portuguese
Poesia/Thoughts Sua vida 0 2.828 10/21/2016 - 15:49 Portuguese
Poesia/Sadness Não me faça sentir assim 0 9.666 10/18/2016 - 20:57 Portuguese
Poesia/General Afasta-te 0 2.683 10/04/2016 - 13:08 Portuguese
Poesia/General Até quando 0 3.337 10/04/2016 - 13:05 Portuguese
Poesia/General Meu corpo não lhe pertence 0 1.998 09/30/2016 - 19:04 Portuguese
Poesia/Disillusion You don't love me 0 4.983 09/30/2016 - 18:59 English
Poesia/Meditation Give me strength 0 5.703 09/13/2016 - 18:36 English
Poesia/Meditation O que fazer 0 2.062 09/12/2016 - 13:18 Portuguese
Poesia/General Aqueles olhos 0 2.414 09/12/2016 - 13:15 Portuguese
Críticas/Books Uma tragédia monumental 0 6.399 09/03/2016 - 11:48 Portuguese
Prosas/Thoughts Meu grito silencioso 0 1.784 09/03/2016 - 11:21 Portuguese
Poesia/Gothic All my fears 0 4.227 09/03/2016 - 11:16 English
Poesia/Gothic Filho da lua cheia 0 3.289 09/03/2016 - 11:12 Portuguese
Poesia/Gothic Solidão eterna 0 2.706 09/03/2016 - 11:09 Portuguese
Poesia/Meditation When will my life begin 0 4.601 08/31/2016 - 20:15 English
Prosas/Thoughts Diferença 0 2.058 08/28/2016 - 09:40 Portuguese
Críticas/Books Desejos e frustrações 0 6.259 08/28/2016 - 09:38 Portuguese
Poesia/Meditation We need a true love 0 4.486 08/28/2016 - 09:19 English
Poesia/Haiku Aves 0 3.613 08/26/2016 - 18:05 Portuguese
Poesia/Meditation Precisamos de liberdade 0 2.900 08/26/2016 - 18:04 Portuguese
Poesia/Meditation Um sentido 0 1.654 08/26/2016 - 18:00 Portuguese
Poesia/Disillusion Don't call me anymore 0 5.911 08/22/2016 - 13:37 English
Prosas/Thoughts A ilusão da paixão 0 2.720 08/16/2016 - 12:50 Portuguese