O flanelinha e a puta (parte 2) - A puta

Mal vi o flanelinha virar na esquina recebo uma ligação
Um amigo me convidando para ir ver umas “meninas”
- Não tenho dinheiro!
- Vamos só tomar uma cerveja.
Tarde de calor.
Ideal para se tomar uma gelada.
- Vamos lá.
O que não se faz por um amigo?
Lá fomos nós.
Não preciso nem dizer que há vários locais nas periferias da cidade
Que possibilita oportunidades para se conhecer uma garota.
Mas, devo salientar que esses ambientes não são salubres.
Nem bonitos.

Uma moça de sorriso espontâneo
Batom vermelho, seios fartos,
Realçados pelo decote de uma blusa curta
Short mais curto ainda e aberto
Deixa transparecer um par de coxas salientes
Com uma tatuagem em uma das pernas
Vem sentar-se ao meu lado.
- Oi bebezinho – diz ela com uma voz suave
- Você pode pagar um uísque para mim?
Qualquer bebida nesses lugares é o olho da cara
Dá para comprar um engradado em outro lugar.
Invento uma desculpa e digo que só posso pagar uma cerveja
Enquanto meu amigo se diverte com uma loira.
- Vou para o quarto com ela – diz ele.
Tenho que esperar.

Então começo a conversar com a morena
Que insiste em passar as mãos pelo meu corpo e me chamar de bebezinho.
Por que as pessoas gostam de me chamar de bebezinho?
Sei lá. Até que gosto.
Então insisto com ela que não tenho dinheiro e que ela pode tentar agradar outro.
Tinha acabado de chegar outros caras.
- Gosto de você – diz ela – e esses caras ai vão lá para os fundos.
Nos fundos do bar há mesas e outras garotas
Bebendo e conversando.
Vejo uma tomando banho em uma ducha
Ainda está muito calor.
Ela está seminua e não tem como disfarçar o olhar
Ela sorri e faz uma bagunça para chamar a atenção.
- Vai ficar olhando para ela?
Então me volto para a menina ao meu lado.
- Por que você fica aqui? – Pergunto.
É possível ver em seu rosto as marcas do sofrimento.

Conta-me, então, parte de sua história.
Não conheceu o pai e a mãe não tinha condições de criá-la.
Por viver uma vida miserável
Fugiu de casa com quatorze anos
Ficou grávida e teve um filho
O pai do garoto nem quis saber de vê-la e muito menos do filho.
Não queria que o filho passasse pelo mesmo que ela passara
Por isso resolveu trabalhar para sustenta-lo.
Como não conseguia emprego
(não tivera oportunidade de terminar os estudos)
Resolveu ser prostituta
- Eu sou uma puta – ela diz para mim.
Ela mesma me pede para chamá-la de puta.
- Tem meninas aqui que não gosta, mas nós somos putas.
Fico constrangido e ela nota isso.
- Não se preocupe, bebezinho, isso é normal para mim.
Então ela brinca com minha timidez
Mas, na verdade o que sinto é estranhamento.
- Quanto ganha fazendo isso? E seu filho, onde fica?
Eu estava curioso e como ela havia aberto a possibilidade, queria saber.
Disse-me que, às vezes, no começo do mês, dia de pagamento,
Costuma tirar um bom dinheiro.
- Teve uma vez que fiquei com 8 caras no mesmo dia.
Fiz a conta na cabeça rapidamente: 800 reais em um dia!
Caramba!
- Mas, tem semanas que ficamos aqui e não aparece nem uma viva alma.
Ela, então, me contou sobre as rivalidades, sobre a concorrência,
A exploração do dono ou dona do lugar
Das condições miseráveis onde dormem,
Da comida horrível que se alimentam
Dos homens violentos que querem abusar porque estão pagando...
Não sabia o que dizer.
- Ah, o meu filho tem 4 anos e fica com minha avó.

Meu amigo volta de sua aventura.
A loira sorri, ele sorri.
A felicidade!
Ah! Ela existe.

Deito-me na minha cama e começo a refletir sobre o meu dia.
O que é a vida?
Quem somos nós?
De onde viemos?
Para onde vamos?
O flanelinha e a puta.
A vida deles é melhor ou pior do que a minha?
É pior ou melhor do que a sua?

Poema: Odair José, Poeta Cacerense

www.odairpoetacacerense.blogspot.com

Submited by

Tuesday, July 30, 2019 - 20:28

Poesia :

No votes yet

Odairjsilva

Odairjsilva's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 17 hours 23 min ago
Joined: 04/07/2009
Posts:
Points: 15353

Add comment

Login to post comments

other contents of Odairjsilva

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Love Trovas de amor e saudade I 6 296 02/05/2024 - 01:09 Portuguese
Poesia/Love Eu abro meu coração 6 223 02/04/2024 - 13:13 Portuguese
Poesia/Thoughts Sistema ignorante 6 1.088 02/03/2024 - 14:20 Portuguese
Poesia/Thoughts Na grande arena do destino 6 1.200 02/02/2024 - 12:53 Portuguese
Poesia/Thoughts História oficial 6 287 02/01/2024 - 21:19 Portuguese
Poesia/Love Paixão que não se cala 6 249 01/31/2024 - 20:11 Portuguese
Poesia/Love A felicidade que sonhei 6 443 01/30/2024 - 11:30 Portuguese
Poesia/Thoughts O último poema do rinoceronte 6 1.233 01/29/2024 - 20:15 Portuguese
Poesia/Love Só por hoje 6 241 01/28/2024 - 12:45 Portuguese
Poesia/Meditation Águas turvas 6 334 01/27/2024 - 12:00 Portuguese
Poesia/Love Alvorada voraz 6 180 01/25/2024 - 23:25 Portuguese
Poesia/Meditation Primeira Guerra Mundial 6 329 01/24/2024 - 19:46 Portuguese
Poesia/Love Murmúrio de desejos 6 261 01/22/2024 - 19:01 Portuguese
Poesia/Disillusion Caminhos diferentes 6 507 01/21/2024 - 12:13 Portuguese
Poesia/Love Contagem regressiva 6 476 01/20/2024 - 13:13 Portuguese
Poesia/Thoughts Criatura selvagem 6 1.134 01/19/2024 - 12:13 Portuguese
Poesia/Thoughts Apocalipse 6 468 01/18/2024 - 12:17 Portuguese
Poesia/Love Seus olhos 6 296 01/17/2024 - 13:06 Portuguese
Poesia/Disillusion Se distante de mim você sorrir 6 250 01/16/2024 - 12:17 Portuguese
Poesia/Disillusion Segredos de um coração ferido 6 1.218 01/15/2024 - 13:30 Portuguese
Poesia/Disillusion Ele apenas faz sofrer 6 313 01/14/2024 - 13:46 Portuguese
Poesia/Love Que o tempo não apague 6 268 01/12/2024 - 23:39 Portuguese
Poesia/Love Musa inspiradora 6 351 01/12/2024 - 12:30 Portuguese
Poesia/Love Visceral 6 355 01/11/2024 - 12:49 Portuguese
Poesia/Thoughts O ovo da serpente 6 474 01/10/2024 - 13:16 Portuguese