Apenas uma gota
Será necessário apenas uma partícula,
um átomo, uma gota, uma molécula,
para cristalizar tudo o que temos
para pulverizar tudo o que seremos
Na mansidão da tarde tudo é vago
Vazio no deserto do ser beduíno,
Sonhando com areias auríferas,
Mar limpo, praias encantadas
Poluição não permite que caranguejos
se reproduzam nos mangues,
o que fizeram com estes trastes?
dejetos, objetos, humanos rejeitos
Será que ainda haverá jeito?
Água na garrafa plástica, outrora cristalina
a maré arrasta consigo as impurezas da orla
a praia recebe a cota de miséria no seu leito
Tudo é disperso, chocante ao espírito
que nem onda milagrosa consegue afogar
este coração árido, que bate no entardecer
das marés rasantes, chamando o crepúsculo
Lá, nas margens do Paraíba,
vem notícias da enchente
que carregm o que a pobre gente
em vão cultivou, foi-se a colheita
Amor cativo de nativo,
a cada ano, a mesma cheia
a esperança da lua cheia
o rio como abrigo e desamparo
Tudo morto,
o milharal destruído,
o arrozal reduzido,
por apenas um desejo...
de uma chuva,
não de uma tromba d´água.
Mas, por que haveria de acontecer uma cheia?
Oh, céus, nos serviria apenas uma gota...
AjAraújo, o poeta humanista, escrito nas águas de março de 1975, revisitado em março de 2010.
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Comments
Apenas uma gota
Tragédias, ah, quanta dor, desespero, desesperança. Este poema marcou uma grande cheia em minha cidade em 1975, não pude durante dias visitar meus familiares ilhados, mas estavam seguros, vivos.
Oh, céus, nos serviria apenas uma gota.Por que nos enviaste a cheia?