Estadias Contribuídas
Entro no reluzente cristalino automóvel do Diogo Luís. Era tanto o calor que fazia derreter qualquer coração. Não ligava o ar-condicionado. Há que poupar o que não se gasta.
DL: ó Bé, caramba, não tens notado que eu é que me tenho chegado à frente em todas as estadias em que estivemos? - expressão preocupada de quem está às portas da fome.
Benedita: bem, se não te importares e já agora peço tesouros de desculpas por não ter reparado em tal falha minha, no mínimo atingi a escala seis ou sete. Não tinha reparado que te tinha "abanado" tanto. Eu dou-te a parte que te pertence, cêntimo a cêntimo no final da viagem/passeio de estudo. Fazemos as contas e dividimos no final. É assim tão complicado?
DL: achas que vou andar com dinheiro vivo comigo ou em casa? Pensei que percebias que tens que contribuir na altura, alternadamente ou a meias, mas na ocasião.
Benedita: e porque não? dá jeito andar com notas, nem que seja para teres que as doar a algum inesperado assaltante, ou se não houver caixas de Multibanco por perto, ou se o cartão falhar. Qual o drama de eu te pagar em notas?
DL: não! eu não ando com dinheiro. Para a próxima por favor pagas tu as restantes estadias. Já sabes: comigo é tudo a meias.
O homem é o quê? Alguma instituição bancária? Com este calor e com esta chamada de atenção entre a igualdade dos sexos, senti-me ainda mais a ferver, quase capaz de o fazer derreter como um rebuçado, assim lentamente. Devo ter cometido várias injustiças com esta personagem na vida passada. Digo e repito! Ele terá sido um indigente e ao final do dia acumulava dinheiro das esmolas e eu abocanhava-o, mas em troca prometia-lhe comida. Levava-o a minha casa e entregáva-lhe à língua um naco de pão seco. Terei feito atrocidades dessas? Ainda lhe dizia "afinal quem te trata como um rei, quem? Ai, tens tanta sorte comigo."
À chegada da próxima estação dormitória, fui levantar o pouco dinheiro que já tinha. Paguei daí para a frente as restantes noites.
DL: ai Bé, não entendo. Tens algum problema com o dinheiro, és sumítica e falas sempre dele...
Agora os raios solares afunilaram todos em sua direcção. Estão a provocar naquela cabeça o efeito das pastilhas que os adolescentes engolem.
Seguimos viagem com os lábios colados (não um no outro, Deus mo livre!). Eu, ansiosa por esmagar com o dedo uma mosca, mesmo no vidro ou no tablier, que ele ainda não viu ali a esvoaçar no seu mausoléum.
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Comments
Re: Estadias Contribuídas
Esse teu personagem é mesmo um sovina! Tudo a meias?!
Agora como Diogo Luís, vai divertindo quem lê as tuas fantásticas histórias, real, ou não. Demais!
Pela manhã, então!!! :-)
Beijinho
Carla
Re: Estadias Contribuídas
Texto de complexo entendimento, Benedita!
Preferes pagar às meias ou acionar o ar condicionado o carro? Tanto faz, não? Visto que tanto o ar quanto a estadia dependem da sua decisão ( e que se dane o tal DL! :hammer: )
Abraços, Robson!
P.S: Eu não desisto dos meus (textos) assim tão facilmente!