Itália
Ao meu amigo o Conde de Fé
Veder Napoli e poi morir.
I
Lá na terra da vida e dos amores
Eu podia viver inda um momento...
Adormecer ao sol da primavera
Sobre o colo das virgens de Sorrento !
Eu podia viver — e porventura
Nos luares do amor amar a vida,
Dilatar-se minh'alma como o seio
Do pálido Romeu na despedida!
Eu podia na sombra dos amores
Tremer num beijo o coração sedento...
Nos seios da donzela delirante
Eu podia viver inda um momento!
Ó anjo de meu Deus! se nos meus sonhos
Não mentia o reflexo da ventura,
E se Deus me fadou nesta existência
Um instante de enlevo e de ternura...
Lá entre os laranjais, entre os loureiros,
Lá onde a noite seu aroma espalha,
Nas longas praias onde o mar suspira
Minh'alma exalarei no céu da Itália!
Ver a Itália e morrer!... Entre meus sonhos
Eu vejo-a de volúpia adormecida...
Nas tardes vaporentas se perfuma
E dorme, à noite, na ilusão da vida!
E, se eu devo expirar nos meus amores,
Nuns olhos de mulher amor bebendo,
Seja aos pés da morena Italiana,
Ouvindo-a suspirar, inda morrendo.
Lá na terra da vida e dos amores
Eu podia viver inda um momento,
Adormecer ao sol da primavera
Sobre o colo das virgens de Sorrento!
II
A Itália! sempre a Itália delirante!
E os ardentes saraus, e as noites belas!
A Itália do prazer, do amor insano,
Do sonho fervoroso das donzelas!
E a gôndola sombria resvalando
Cheia de amor, de cânticos e flores...
E a vaga que suspira à meia-noite
Embalando o mistério dos amores!
Ama-te o sol, ó terra da harmonia,
Do levante na brisa te perfumas:
Nas praias de ventura e primavera
Vai o mar estender seu véu d'escumas!
Vai a lua sedenta e vagabunda
O teu berço banhar na luz saudosa,
As tuas noites estrelar de sonhos
E beijar-te na fronte vaporosa!
Pátria do meu amor! terra das glórias
Que o gênio consagrou, que sonha o povo...
Agora que murcharam teus loureiros
Fora doce em teu seio amar de novo...
Amar tuas montanhas e as torrentes
E esse mar onde bóia alcion dormindo,
Onde as ilhas se azulam no ocidente,
Como nuvens à tarde se esvaindo...
Aonde à noite o pescador moreno
Pela baía no batel se escoa...
E murmurando, nas canções de Armida,
Treme aos fogos errantes da canoa...
Onde amou Rafael, onde sonhava
No seio ardente da mulher divina,
E talvez desmaiou no teu perfume
E suspirou com ele a Fornarina...
E juntos, ao luar, num beijo errante
Desfolhavam os sonhos da ventura
E bebiam na lua e no silêncio
Os eflúvios de tua formosura!
Ó anjo de meu Deus, se nos meus sonhos
A promessa do amor me não mentia,
Concede um pouco ao infeliz poeta
Uma hora da ilusão que o embebia!
Concede ao sonhador, que tão-somente
Entre delírios palpitou d'enleio,
Numa hora de paixão e de harmonia
Dessa Itália do amor morrer no seio!
Oh! na terra da vida e dos amores
Eu podia sonhar inda um momento,
Nos seios da donzela delirante
Apertar o meu peito macilento
Submited by
Poesia Consagrada :
- Login to post comments
- 576 reads
other contents of AlvaresdeAzevedo
Topic | Title | Replies | Views |
Last Post![]() |
Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
![]() |
Fotos/Profile | Alvares de Azevedo | 0 | 1.966 | 11/24/2010 - 00:37 | Portuguese |
Poesia Consagrada/Tale | Noite na Taverna (Capítulo IV — Gennaro) | 0 | 2.090 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Noite na Taverna (Capítulo V — Claudius Hermann) | 0 | 2.555 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Noite na Taverna (Capítulo VI — Johann) | 0 | 1.935 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Noite na Taverna (Capítulo VII — Último Beijo de Amor) | 0 | 1.522 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Macário - Introdução | 0 | 1.463 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Macário - Primeiro episódio | 0 | 1.228 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Macário - Segundo episódio | 0 | 1.281 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Sombra de D. Juan | 0 | 1.335 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Na várzea | 0 | 1.250 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | O editor | 0 | 1.463 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Oh! Não maldigam! | 0 | 1.738 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Dinheiro | 0 | 1.437 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Adeus, meus sonhos! | 0 | 1.458 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Minha desgraça | 0 | 1.548 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Página rota | 0 | 1.270 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Noite na Taverna (Capítulo I — Uma noite do século) | 0 | 1.559 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Noite na Taverna (Capítulo II — Solfieri) | 0 | 2.030 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Tale | Noite na Taverna (Capítulo III — Bertram) | 0 | 3.105 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Panteísmo | 0 | 1.148 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Desânimo | 0 | 1.220 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | O lenço dela | 0 | 1.290 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Relógios e beijos | 0 | 1.527 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Namoro a cavalo | 0 | 1.677 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Pálida imagem | 0 | 1.331 | 11/19/2010 - 16:52 | Portuguese |
Add comment