GLOSAS IV

4

Perguntei a Amor, e á Sorte,
Se. tem remedio o meu mal;
Respondeu-me em tom severo
— Que o não tem, porque é mortal.

GLOSA

Eu, que sinto o peito arder
Na pura neve d'Isbela,
Que um volver dos olhos d'ella
Não posso ao menos obter:
Cançado emfim de soffrer
Vida peor do que a morte,
Em paixão tão cega, e forte
Que já passa a desatino,
Qual seria o meu destino
«Perguntei a Amor, e á Sorte.»

«Numes! Poderosos numes !
(Clamaram meus labios tristes)
Vós, que de mim sempre ouvistes
Brados, suspiros, queixumes;
Vós, que as ancias, os ciumes
Lancaes n'esta alma leal;
Vós, que permittis que um tal
Incendio me offenda, e queime,
Ah! Consolae-me, dizei-me
«Se tem remedio o meu mal ?»

Disse; e logo o deus alado
Que céos, e terra avassalla,
Com voz soberba assim falia
Á deusa, que tinha ao lado:
«D'este amante o cruel fado
Que exponhas, oh Sorte, eu quero;
Ergue a voz, pois te assevero
Que o seu pranto me importuna.»
Calou se Amor, e a Fortuna
«Respondeu-me em tora severo:»

«Tu, que dourada corrente
Toléras, mostras, arrastas:
Que os dias, e as noutes gastas
Em chôro infeliz, e ardente:
Tu, que buscas finalmente
Remedio prompto, e cabal
A tua dôr sem egual;
Sabe, para teu terror,
Que o não tem, porque é de Amor,
«Que o não tem, porque é mortal.»

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Sunday, September 20, 2009 - 23:52

Poesia Consagrada :

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