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GLOSAS X

10

Basta, pensamento, bauta;
Deixa-me em fim descançar;
Um bem, que ser meu não póde,
E um tormento lembrar.

GLOSA

Desvelado pensamento,
Que a minha mágoa requintas,
Quando em illusões me pintas
Suave contentamento:
Se um dever duro, e violento
Do bem, que adoro, me affasta,
Se barbara lei contrasta
Os desejos da paixão,
De enganar-se o coração
«Basta, pensamento, basta.»

Nize em braços de um tyranno
Mesmo a seu pezar suspira;
Em quanto geme, e delira
Longe d'ella o triste EImano:
O meu rival gosa ufano
A dita mais singular:
E se a dor de o invejar
Tu me excitas, pensamento,
Em profundo esquecimento
«Deixa-me em fim descançar.»

Bem, que se não gosa, ancêa;
Não me apresentes, memoria,
A perda da minha gloria
Na imagem da gloria alhêa:
Nize arrasta uma cadêa
Que só a morte sacode,
E por isso não me acode,
Nem me paga a sympathia
Um bem, que ser meu devia,
«Um bem, que ser meu não póde.»

Pensamento namorado,
Não promovas minha pena;
Ceda-se ao que o fado ordena,
Que ninguem resiste ao fado:
Alto prazer suspirado,
Que se não pode alcançar,
Porque em se não desfructar
Deixa em fim de ser prazer,
E' uma dita esquecer,
«E' um tormento lembrar.»

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segunda-feira, setembro 21, 2009 - 00:04

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Bocage

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