ELOGIOS V
5
Aos annos do mesmo Senhor
(13 de Maio de 1801)
Serus in celum redeas, diuque
Loethus interies populo.
Horat. Lib. I. Od. II.
Que alegre, desdobrando o véo de rosas,
Que amena resurgiu, que abrilhantada
De estreme, de amorosa claridade
A aurora de João no céo de Lysia!
Oh plaga sup'rior ás plagas todas,
Que déste ao mundo antigo um novo mundo,
Que, immensa no valor, no espaço curta,
Transcendeste os confins da humanidade,
Levaste execução lá onde apenas
Ousára abalançar-se o pensamento !
N'esta luz singular, n'este aureo dia,
Da eterna protecção penhor formoso,
trouxe de nove a ti mil dons celestes
O Genio tutelar, que escuda, e véla
Gran ministro de Jove, os teus destinos:
Que vassallaem firme ás leis, aothrono
Em teu seio arreigou, nutriu, reforça,
Qual planta ingente, que, abarbando as eras,
Opulenta de aromas, flôres, tractos,
Na viçosa altivez penetra, invade
A terra co'a raiz, os céos co'a rama.
Recrea-te, oh nação ! divino indulto
Além da méta humana alçou teu lustre.
Colossos gigantêos no mar se abysmam,
Marmoreos torreões dão baque horrendo.
Da Fortuna as montanhas se desabam,
D'este, d'aquelle imperio morre a fama;
O Médo, o Assyrio cáe, cáe Roma, e Grecia,
Maravilhas do globo, e ferros d'elle;
Mas Fado universal não é teu Fado:
Gravâme acerbo, aspérrimo tributo,
Males, que a tudo impõe, não ousa impôr-te
O tyranno commum, rei de minas.
Elle acata a nação no heróe que a manda,
Nos heroes que a mandaram, que a subiram
A' grandeza, ao nivel do lacio nome.
Deuses na menle, se mortaes na essencia,
Co'a rectidão por norma, os paes de Lysia,
Os monarchas do Tejo á patria deram
Leis amigas do céo, do mundo amigas,
Leis, que um Deus confirmou, porque eram suas.
Magnanimos leões leões produzem,
Frouxo arbusto não é do cedro a prole.
Affonsos, Manueis, Dinizes, Sanchos,
De vós, egual a vós, João proveiu !
Decreto, pelos numes promulgado,
Transpôz de dextra em dextra o sceptro luso,
Até parar na mão, que ha de empunhal-o
Com tanta duração, que espante os evos.
Astréa, a paz, o amor, virtude e graças,
No mais que dôce jugo embellezados,
Volvem dos astros, sem saber que volvem,
O Olympo esquecem, de João no imperio,
E suppõem convertida em tempos de ouro
Negra edade de horror, que os pôz em fuga.
A turba etherea, ladeando o solio,
Bafeja o coração do regio moço:
Ali derrama da Clemencia o nectar,
Ali, deidade austera, ali Justiça,
Teu rispido amargor com elle adoça;
N'alma idéas prestantes lhe aposenta,
Arduas combinações lhe induz, lhe aplana;
politica sublime entre ellas surge,
Onde a sagacidade abrange a honra;
N'um quadro luminoso o bem da patria
Ante a face real prospéra, avulta:
O presente, o porvir fulguram n'elle.
Oh tu, de um Deus contemporanea augusta,
Voragem onde os seculos sossobram,
Ignota, veneranda Eternidade !
Debalde te abarreiram teus arcanos
Contra audaz invasão da idéa em chammas.
Metal de mais vigor que o bronze, e o ferro,
Recondito mortaes, compõe teus muros;
A nevoa dos mysterios te rodêa:
Mas despedindo o vate ardentes vôos,
Áquem deixando o globo, o vento, as nuvens,
Qual a que arrosta o sol, e empolga o raio,
A eternos penetraes os hombros mette,
Obstaculos derruba, e lê nos Fados.
Lá onde altos Futuros majestosos
Em sagrado silencio envoltos dormem,
A todos sobre-sáe Destino excelso
Do generoso heróe, que rege os lusos,
Que impéra co'a virtude, e não co'a força,
Que inda mais que no sangue, em si tem base
A inviolavel direito, ao jus supremo
De ser na terra o que no Olympo é Jove.
Sim, Príncipe immortal; se a longa serie
De teus grandes avós te não guiasse
A' brilhante eminencia, onde te adora
Nos hemispherios dous um povo immenso,
Sempre nos corações houveras throno.
A tua gloria és tu, comtigo brilhas;
Por ti fogem de nós communs desastres,
Venturas entre nós por ti florecem.
O céo te inspira, o céo te galardôa,
E ethereo resplendor teus annos c'rôa.
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