FASTOS DAS METAMORPHOSES VIII
Atlante convertido em monte
(Traduzido do Livro IV)
Trazendo o espolio do vipéreo monstro
E equilibrado em azas estridentes,
Presas aos leves pés, vagava os ares
O Argolico Persêo, prole do nume
Que a Danae seduzira em aurea chuva.
Sobre as crestantes, lybicas arêas
Pendente o vencedor, cahiram n'ellas
Da Gorgonea cerviz sanguineas gotas,
E bebendo-as a terra as faz serpentes:
Desde então de serpentes Lybia abunda.
Logo, agitado por discordes ventos,
Para aqui, para ali, qual gira a nuvem,
Descobre o moço errante ao longe as terras,
E sobre o vasto globo anda voando.
As Ursas boreaes viu já tres vezes,
E já tres vezes viu do Cancro os braços;
Mil ao occaso foi, mil ao nascente,
Pela aérea violencia despedido.
Em fim, proximo á noute, e receando
Persêo fíar-se d'ella, o vôo abate
Na hespéria região, reinos de Atlante.
O heróe pede ao monarcha um breve asylo,
Té que phosphoro esperte a luz d'Aurora,
E Aurora o carro de ouro ao Sol prepare.
Superior na estatura aos homens todos
Era o filho de Japeto, era Atlante.
Deu leis na terra extrema, e leis nos mares
Onde os lassos frisões mergulha Phebo.
Ali manadas mil do rei gigante,
Mil rebanhos ali pascendo erravam,
E ao seu não confrontava extranho imperio.
Tinha um vergel com arvore lustrosa:
As folhas eram de ouro, e de ouro os ramos,
Aureos os pomos, que pendiam d'elles.
«Gran rei (Persêo lhe diz) se amas a gloria
D'alta estirpe, o meu ser provém de Jove:
E se és admirador d'acçoes famosas,
Hão de maravilhar te as acções minhas.
Rogo-te a graça de nocturno hospicio.»
Mas de oraculo antigo o rei se lembra;
A Themis no Parnaso ouviu outr'hora:
«Ha de vir tempo, Atlante, em que dos fructos
A arvore tua despojada fique:
Filho o seu roubador será de Jove.»
Receoso do furto, havia Atlante
Torneado o pomar com rijos muros,
E horroroso dragão lhe pôz de véla:
A forasteiro algum nos seus dominios
Guarida não concede, expulsa todos,
E a este diz tambem: «Vae para longe,
Se não queres de ti vêr longe a gloria
Dos mentirosos feitos, se não queres
Longe, mais longe ainda o pae, que ostentas.»
E, ajuntando a violencia aos ameaços,
Intenta repellir além das portas
Persêo, que lhe resiste, e substitue
Palavras fortes a palavras brandas.
Nas forças inferior se reconhece:
Quem podia egualar de Atlante as forças ?
«Já que a minha amisade em pouco estimas,»
(Diz o affrontado heróe) recebe o premio.»
N'isto co'a mão sinistra, e desviando
Primeiro os olhos para a parte adversa,
Lhe mostra da Medusa a face horrenda.
Eis feito o enorme Atlante um monte enorme:
Barbas, melênas se lhe tornam selvas:
São recostos da serra as mãos, e os braços,
O que já foi cabeça agora é cume,
Dos ossos os penedos se formaram.
Para todas as partes se dilata;
Crescendo mais, e mais, altura immensa
Toma em fim: (vós, oh numes, o ordenastes)
Todo o pezo dos cêos descança n'elle.
Submited by
Poesia Consagrada :
- Login to post comments
- 3916 reads
other contents of Bocage
Topic | Title | Replies | Views | Last Post | Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia Consagrada/General | FRAGMENTOS DRAMATICOS - O R I G I N A E S – I | 0 | 824 | 11/19/2010 - 16:56 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | VERSÕES LYRICAS I | 0 | 600 | 11/19/2010 - 16:56 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | VERSÕES LYRICAS II | 0 | 1.075 | 11/19/2010 - 16:56 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A CONCORDIA - E N T R E A M O R E A F O R T U N A - I | 0 | 1.135 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A CONCORDIA - E N T R E A M O R E A F O R T U N A - II | 0 | 1.077 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A CONCORDIA - E N T R E A M O R E A F O R T U N A - III | 0 | 1.485 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A VIRTUDE LAUREADA - I | 0 | 1.015 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A VIRTUDE LAUREADA - II | 0 | 828 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A VIRTUDE LAUREADA - III | 0 | 982 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A VIRTUDE LAUREADA - IV | 0 | 892 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A VIRTUDE LAUREADA - V | 0 | 632 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A VIRTUDE LAUREADA - VI | 0 | 990 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | A VIRTUDE LAUREADA - VII | 0 | 745 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | FRAGMENTOS DRAMATICOS - O R I G I N A E S - I | 0 | 1.089 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | FRAGMENTOS DRAMATICOS - O R I G I N A E S - II | 0 | 638 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XV | 0 | 525 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XVI | 0 | 580 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XVII | 0 | 868 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XVIII | 0 | 1.073 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XIX | 0 | 865 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XX | 0 | 1.093 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XXI | 0 | 841 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XXII | 0 | 546 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XXIII | 0 | 752 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | ELOGIOS XXIV | 0 | 814 | 11/19/2010 - 16:55 | Portuguese |
Add comment