A Minha Irmã e o Zeta
Irmã querida, Estava eu de visita ao Louvre quando de repente vejo um cão urinar sobre um Monet. Não sei como conseguiu ele alçar o membro à altura da obra, mas que lá o fez não o posso refutar. Foi então que vi o próprio Monet com pincel em riste a correr pelos corredores do museu a tentar corrigir cores mal apreendidas. Encontrei-o num desses corredores e com uma lágrima cor de nascer poente me confessou que nunca vira luz natural. Não acreditei. Está bem que isto é só um sonho, mas não pode ser assim tão absurdo, não é mana? Levei o cão para casa e com o latir pintou Van Gogh no espelho. E a noite nem estava estrelada tal como não está agora. Visitei o Louvre em dois minutos e não paguei e até consegui roubar um Rembrant que está agora delicadamente suspenso numa aresta perpendicular ao meu acordar - Que belo quadro seria, eu e ele sentados num pedaço de sonho de pernas abraçadas - e a Gioconda lá continua a sorrir numa tal ironia que daqui a milhões de anos quando o Homem não tiver nada que fazer irá explorar. Que importância terá o teu sorriso hoje, minha irmã?
Acordei assim numa bola transparente de sentido, como quando saímos de casa na esperança de sermos vistos e regressamos como se fôssemos apenas almas beijadas por espíritos. É o mundo de hoje. E aquele jantar aconteceu há tanto tempo que até já descobri que tudo não passou de imaginação minha. Mas quem é o Leno? E a Nelma? E o Zeta? Eu só quero subir um tronco de uma árvore uma vez mais. Ouvi dizer que na Internet isso já é possível, mas como não acreditei, deixei um ramo ameaçar o meu frágil corpo numa queda digna da gravidade. Descobri assim a verdadeira filosofia, a qual Platão desgastou neurónios em respostas tão simples como aquelas que eu tenho. Tudo que sobe tem que descer. Quem disse isto? Eu subi tão alto que até tenho vertigens e medo de Newton. Belisca-me que não sinto os meus olhos. O Zeta e a minha irmã estão de mãos ateadas, deitados no ténue fio entre o mar e a areia. O meu cunhado está a surfar na sétima onda - que o Universo não conhece outro número - porque o sete aplica-se às relações humanas, aos pecados mortais, às vidas dos gatos, às maravilhas do mundo, ao dia em que Ele descansa todos os dias, e porque é ímpar e não quer nem necessita de par. O meu estimado cunhado aproveitou a onda libertando-se do asilo, assente na prancha da loucura. Elogiou ele próprio a loucura, tal como o tinha feito alguém há alguns séculos, mas ele fê-lo sem ler, sem conhecer, apenas sendo-o. Acenei-lhes com o lenço verde e vi que minha irmã não me vira. Tem os olhos vendados de verde e azul do mar, um mentiroso que por vezes é verde ou cinzento ou laranja, conforme o tempo ou o temperamento. Vi-os serem enrolados pela vaga da paixão e subitamente afogarem-se no rebentamento da onda. Nunca mais vi minha irmã. Nem em sonhos. Belisquem-me para eu acordar dela!
Submited by
Poesia :
- Inicie sesión para enviar comentarios
- 614 reads
Add comment
other contents of Benedita
Tema | Título | Respuestas | Lecturas |
Último envío![]() |
Idioma | |
---|---|---|---|---|---|---|
![]() |
Videos/Perfil | 969 | 0 | 2.384 | 11/24/2010 - 22:07 | Portuguese |
![]() |
Fotos/Perfil | 3497 | 0 | 3.117 | 11/23/2010 - 23:54 | Portuguese |
Prosas/Pensamientos | Muitos Cavalos | 0 | 2.149 | 11/18/2010 - 23:03 | Portuguese | |
Prosas/Tristeza | Pascola | 0 | 2.275 | 11/18/2010 - 23:03 | Portuguese | |
Prosas/Contos | O Prédio | 0 | 1.926 | 11/18/2010 - 23:03 | Portuguese | |
Prosas/Contos | O Joel Disse | 0 | 1.727 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | As Outras | 0 | 2.345 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Pensamientos | Contra-Não | 0 | 2.006 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | Mulheres Baixas | 0 | 2.114 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | Fumo ou Vapor? | 0 | 1.700 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | Soraya | 0 | 2.135 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | Hiper Activo | 0 | 1.832 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | Dia dos Namorados | 0 | 1.629 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | Despedida | 0 | 1.806 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | Que dia é Hoje? | 0 | 1.322 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Prosas/Contos | A"S"sombra | 0 | 1.756 | 11/18/2010 - 23:02 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Lantejoulas | 2 | 1.507 | 04/01/2010 - 18:20 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Idoso Criminoso | 3 | 1.638 | 04/01/2010 - 17:16 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Paredes do Miocárdio | 2 | 1.687 | 04/01/2010 - 17:12 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | A Parte de Trás do Meu Cão | 3 | 1.343 | 03/30/2010 - 16:38 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Cavalheira | 4 | 1.754 | 03/30/2010 - 16:18 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | És Cólica | 1 | 1.953 | 03/27/2010 - 16:39 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Torre de Controlo | 1 | 1.775 | 03/27/2010 - 16:38 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Ninho | 1 | 1.612 | 03/27/2010 - 16:35 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Morte Lenta | 4 | 1.566 | 03/26/2010 - 15:30 | Portuguese |
Comentarios
Re: A Minha Irmã e o Zeta
Uma história da vida!!!
:-)
Re: A Minha Irmã e o Zeta
Benedita!
LINDO TEXTO, GOSTEI MUITO!
Conforme pediste, um beliscão em você!
Meus parabéns,
MarneDulinski
Re: A Minha Irmã e o Zeta
FANTÁSTICO Benedita!
Estou deveras impressionado e deliciado pelo que acabo de ler.
Muito bom.
Afoguei-me no mar das tuas palavras. Podes salvar-me que eu quero voltar a ler-te :-)
beijinhos
rainbowsky