CONFISSÃO - Gil Bertho Lopes

O vento fresco, arauto do amanhecer
Sussurro poético
O arrepio que corre pela terra quando ela desperta...
Uma fraca réstea de luz brilha através dos arcos encortinados
Muralhas de mármore
Na sala dos sonhos
No palácio do coração do homem

Um cheiro de uvas maduras
Uma branca neblina se estirando como um lago
Uma nuvem de pequeninas plumas brancas
Casinhas perdidas na neblina
A alvura da parede caiada
A erva crescendo livremente pelo chão

Atormentado
Sempre dotado de dor de cabeça e aspirina
Talvez sofresse de vulcânicas perturbações, devido às suas tantas paixões reprimidas dentro do seu enorme tórax

Junto à cama desfeita
Perceptível no tédio sombrio e sonolento daquele velho quarto
Paredes de gelo
Um murmúrio de assentimento

Em inusitada atitude pensativa
Uma dúvida angustiosa se insinua em sua alma em alvoroço
Uma realidade torturante, árida, obscura
Desenredar os fios do mistério da existência
“O que sou?”
“Bebamos juntos pelo nada que somos.”

No espelho o enfrentamento do outro, nosso duplo.
“Você está envelhecendo, meu caro!

Apertado entre os dentes o lábio, a fim de impedir uma explosão de soluços
Vergonha do envelhecimento

Se somos a soma de nossas experiências
O que tenho eu para somar
Se tão pouco experienciei?

Confessando na intimidade
A impossibilidade de amar
Crise de afetividade
Pintura íntima
Auto-retrato
Saindo de trás da tela.