FALÉSIA DO ADEUS

Quando a morte nos leva o amor,
o tempo é um cemitério de recordações.

As emoções
tornam-se um percurso de silêncios.

A realidade
veste-se de lua desfragmentada
num eclipse de nãos inacabados.

Os instantes
ficam fátuos pelo nu do corpo,
estirado sobre nuvens que deformam
o arco-íris nas mãos de quem chora tal perda.

Os amanhãs
vertem sem voz sepulturas
onde jazem momentos a dois numa luz ausente.

Em cada sepultura
os desejos adiam-se para a saudade eterna.

À cabeceira dessas sepulturas,
juras de amor são profanadas com lágrimas.

Lágrimas em fúria,
inundadas de agonia profunda.

A morte
quando nos leva o amor,
é um verme sem compaixão
nas lápides de dor que nos arrasta a alma.

A intensidade do ser
é desfeita em pedaços por um mar de ânsia.

A utopia
cai numa distância
que atravessa o infinito sem esperança
nos ramos de uma árvore maculada de angústia.

A vida
derriba-se descontinuada
para todo o sempre em vales de sombras
que são as flores de mil fados desconsolados.

O amor
pinta-se de oásis,
onde os ventos são pensamentos
dos restos mortais daqueles beijos
que já mais voltarão aos lábios do luto.

Quando a morte
leva o nosso amor com ela,
ficamos fechados em nós atados
nas traseiras desse cemitério de últimos dizeres.

Dizeres por tanto que não foi dito.

Ficamos escuros
em clarões despovoados de alegria.

O rosto
fica um santuário de mágoas.

O nosso olhar
fica um pesadelo de musas,
de onde nos damos a ver quanto nada somos
sobre esse chão que de nós herdou os sentimentos.

Sentimentos laqueados em sofrimento.

Ali,
naquele cemitério de recordações,
sentimo-nos pedras truncadas pelo destino
que nos separa a sangue frio de quem amamos.

Sentir a vida,
é uma sensação de chuva fria
que nos afasta o sabor romântico
das noites do coração agora ferido por vazio.

Tão vazio o nosso dentro pela traição da morte.

Amar até
que a morte nos separe,
é uma precisão ensandecida
num torpor que nos devora fatidicamente
num esgar repentino que pára a corrente dos rios.

Ao ver partir o amor
para a tempestade do desconhecido,
toda a parte que nos rodeia é poesia calada.

O sorriso
de ontem fogo,
é hoje cinza que contrasta a alma.

Entre cúpulas
de estrelas cintilantes
onde sonhávamos jardins de palavras celestes,
e caminhos que nos levam ao abismo dos sentidos.

Quando a morte
nos leva o amor para o seu pó,
o sol é-nos rendilhado a ódio nos olhos
em poemas que em nós lemos lodo nesta falésia…

…do adeus.

Submited by

Friday, July 9, 2010 - 01:06

Poesia :

No votes yet

Henrique

Henrique's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 9 years 35 weeks ago
Joined: 03/07/2008
Posts:
Points: 34815

Comments

meninadorio's picture

Re: FALÉSIA DO ADEUS

""Ao ver partir o amor
para a tempestade do desconhecido,
toda a parte que nos rodeia é poesia calada.""

É poesia calada
espinho que fere alma
que sangra sentida
pela vida...

Um beijo

GilBerthoLopes's picture

Re: FALÉSIA DO ADEUS

Henrique, meu nobre poeta
Belíssimo pensamento embora tão carregado de melancolia. Sentimento expresso num jogo de palavras que contém fibras, raíz, alma.
Gostei muito. Me vi neste poema.Um abraço, Gil Bertho Lopes

Add comment

Login to post comments

other contents of Henrique

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Poesia/Meditation SILÊNCIOS POR DIZER … 0 1.714 01/07/2013 - 00:15 Portuguese
Poesia/Love SEMPRE LINDA … 0 1.333 01/05/2013 - 20:14 Portuguese
Poesia/Meditation TINTAS PROFUNDAS … 0 1.165 01/04/2013 - 22:08 Portuguese
Poesia/Sadness LUGARES DE SEM TI … 0 2.730 01/02/2013 - 21:55 Portuguese
Poesia/Love NÃO ESCONDAS TEU CORPO DAS MINHAS MÃOS … 0 4.156 01/01/2013 - 23:47 Portuguese
Poesia/Meditation VENTO DE VOZES LENTAS … 0 1.882 12/29/2012 - 21:44 Portuguese
Poesia/Meditation RIO DE RIR … 0 1.685 12/28/2012 - 21:07 Portuguese
Poesia/Meditation PROCURA QUE ME ENCONTRA … 0 3.450 12/22/2012 - 21:12 Portuguese
Poesia/Passion PAIXÃO DE LENHAS INAPAGÁVEIS … 0 1.634 12/20/2012 - 00:35 Portuguese
Poesia/Meditation BARALHAR OS BARULHOS … 0 3.726 12/17/2012 - 21:04 Portuguese
Fotos/Art Geração do Século XX ... 0 2.117 12/17/2012 - 00:55 Portuguese
Poesia/Intervention PROFISSIONALIZAÇÃO DA HUMANIDADE ... 0 887 12/17/2012 - 00:38 Portuguese
Poesia/Meditation RUAS QUE O VENTO VARRE … 0 2.427 12/14/2012 - 21:58 Portuguese
Poesia/Meditation MAR DE IDAS E VOLTAS GOTA A GOTA … 1 593 12/13/2012 - 07:33 Portuguese
Poesia/Aphorism ACONTECER COMO NÓS ... 0 1.163 12/11/2012 - 01:33 Portuguese
Poesia/Meditation NA SOLIDÃO DE UM LUGAR EM SÍTIO INCERTO … 0 2.593 12/10/2012 - 23:42 Portuguese
Poesia/Aphorism O SER DE UM INSTANTE ... 1 980 12/09/2012 - 17:10 Portuguese
Videos/Music DOWN LOW - So Long Goodbye 0 2.945 12/09/2012 - 01:36 Portuguese
Poesia/Sadness TRISTE TRISTE … 0 1.517 12/09/2012 - 00:59 Portuguese
Fotos/Art Da pedra ao pó, é um instante ... 0 2.251 12/09/2012 - 00:56 Portuguese
Fotos/Bodies Lágrimas ... 0 4.574 12/06/2012 - 21:59 Portuguese
Poesia/Love TUAS LÁGRIMAS SÃO O MEU SILÊNCIO … 0 1.611 12/06/2012 - 21:21 Portuguese
Videos/Movies O Dia da Besta (Filme Completo) ... 0 6.830 12/05/2012 - 21:07 Portuguese
Fotos/Others À Boleia de Um Sonho Grande ... 0 2.588 12/05/2012 - 21:02 Portuguese
Poesia/Meditation SONO PROFUNDO (sem fundo) … 0 1.504 12/05/2012 - 20:42 Portuguese