CONCURSOS:
Edite o seu Livro! A corpos editora edita todos os géneros literários. Clique aqui.
Quer editar o seu livro de Poesia? Clique aqui.
Procuram-se modelos para as nossas capas! Clique aqui.
Procuram-se atores e atrizes! Clique aqui.
FASTOS DAS METAMORPHOSES II
Io
(Traduzido do Livro I)
Nos fundos lares Inaco escondido
Altêa com seu pranto as aguas suas;
Io, a filha gentil, perdida chóra:
Não sabe se está viva, ou se entre os manes:
Mas porque não a encontra em parte alguma,
Em nenhuma do globo a julga o triste,
E o peor se lhe ant'olha ao pensamento.
Volver do patrio rio a vira Jove:
«Virgem digna de Jupiter, guardada
Para felicitar (lhe disse o nume)
No thálamo suave um ente humano !
Procura as sombras dos fechados bosques,
(E aos bosques lhe apontou) a calma aperta,
Dos céos está no cume o sol fervendo.
Se temes ir sósinha aonde ha féras,
De um deus acompanhada irás segura;
Não de um deus inferior, porém d'aquelle
Que o sceptro universal na mão sustenta,
E o raio irresistivel arremessa.
Não, não fujas de mim. — (Que ella fugia).
Já de Lerna as pastagens, e os frondosos
Arvoredos Lircêos Io passára:
Eis em nevoas o deus sumindo a terra,
Lhe prende os passos, e o pudor lhe usarpa.
Juno os olhos em tanto aos campos volve.
E extranha em claro dia haver tal nevoa,
Nevoa tão densa como os véos nocturnos,
Que das aguas não sáe, nem sáe das terras.
Olha em torno de si, não vê o esposo,
E suspeitosa, pelo haver colhido
Já vezes cento em amorosos furtos,
Não o achando nos céos — «Ou eu me engano,
Ou lá me aggravam » — (diz) e, deslizada
Da etherea habitação, parou na terra,
Onde o sombrio horror desfez n'um ponto.
Mas o consorte presentiu-lhe a vinda,
E em candida novilha por cautela
De Inaco a prole transformado havia,
Que depois de novilha inda é formosa.
Saturnia, a seu pezar, lhe dá louvores,
Pergunta de quem é, d'onde viera,
Pergunta a que manada emfim pertence
(De estar longe do caso indicios dando)
— Que a terra a produziu — responde Jove,
Para não ser o auctor mais inquirido:
N'isto Saturnia em dadiva lh'a pede.
O amante que fará ? Cruel, se entrega
Os seus amores; — se os não dá, suspeito;
O que o pejo aconselha, amor impugna:
Vencido pelo amor seria o pejo;
Porém se a Bua irmã, se a sua esposa
Negar uma novilha, um dom tão leve,
Póde talvez; não parecer novilha.
Já na posse da adultera, não despe
A deusa todavia o seu receio;
Teme a Jove, e do aggravo está mordida.
Argos, o filho de Arestor lhe occorre,
E quer que lh'a vigie, e d'elle a fia.
De Argos cinge a cabeça um cento de olhos,
Olhos, que dous a dous o somno alternam:
Desvelados os mais na presa cuidam.
Em quaesquer posições attento a guarda,
Volta-lhe as costas, e tem Io á vista.
Permitte-lhe pascer em quanto é dia;
Em transmontando o sol vae ferrolhal-a,
E um laço injusto lhe tornêa o collo.
Folhas agrestes, amargosa relva
Morde, rumina a triste; em vez de leito
Dão-lhe, nem sempre de herva o chão forrado.
Matam-lhe as sedes em corrente impura.
Supplices braços estender quizera
Para o seu guardador; mas que é dos braços?
Intenta dar um ai, solta um mugido:
Treme do som, da sua voz se espanta.
Um dia ás margens vae, onde brincava,
As margens paternaes; vê n'agua as pontas,
E, medrosa de si, foge do rio.
Inaco ignora, as Náiades não sabem
Quão pertencente lhe és, gentil novilha.
Eil-a os segue; ás irmãs, ao pae, que a admiram,
Não só deixa que a toquem, mas se off'rece.
O velho hervas lhe colhe, e chega aos beiços:
Ella lhe lambe as mãos, as mãos lhe beija;
Terno pranto lhe corre, e se podéra
Soccorro a desditosa invocaria,
Seu nome, os fados seus articulára:
Mas, com letras em fira supprindo vozes,
Servindo-se do pé, na arêa exprime
O triste annuncio da mudada fórma.
«Oh pae desventurado! (Inaco exclama
Abraçando a cerviz, pegado ás pontas
D'alva bezerra, da chorosa filha)
«Oh pae desventurado ! (Elle repete)
Es tu, filha infeliz, tu, procurada
Tantas vezes por mim, e em tantas partes?
Antes que vêr te assim, nunca te vira,
Menor seria então minha amargura.
Ah malfadada ! Responder não sabes,
Altos suspiros sós do peito arrancas,
Mugir á minha voz é quanto pódes.
Não prevendo tens fados, eu outr'hora
O toro nupcial te apercebia.
Duas bem ledas esperanças tive:
Primeira o genro foi, segunda os netos;
Esposo, e filhos nas manadas brutas,
Querido meu penhor, terás agora.
Nem posso tanto mal findar co'a vida;
Empece-me o ser deus; afferrolhadas,
Defesas para mim da morte as portas,
Se estende a minha dôr á eternidade.»
O oculoso pastor, que lhe ouve as mágoas,
Ao lamentavel pae remove a filha,
E vae apascental-a em outros campos:
Sentado, de alto monte a vê, e a tudo.
Que ella sinta, porém, tão duros males
Não póde o rei dos céos soffrer mais tempo:
Chamando o filho, que de Maia houvera,
Lhe ordena, lhe commette a morte de Argos.
Mercurio logo aos pés segura as azas;
Toma a vara somnífera, o galéro,
E, ataviado assim, demanda a terra.
Galéro ali depõe, depõe talares,
Sómente o caducêo na mão conserva;
Leva-o como pastor, que seu rebanho
Co'o toque do cajado aos pastos guia,
E de canora flauta os sons diffunde.
Da nova, dôce musica tentado,
Argos ao numen diz : «Quem quer que sejas,
Comigo aqui, pastor, sentar-te pódes.
Sitio melhor não ha para o rebanho,
Nem para o guardador, assim na sombra,
Como em fertilidade.» O deus se assenta;
E em razões varias, que profere, e escuta,
Vae-se-lhe o dia. Adormécer intenta
Com a avena os cem lumes veladores,
Porém repugna o monstro aos molles somnos,
E bem que os acolheu parte dos olhos,
Parte d'elles vigia. Em fim, porque era
Da flauta a invenção recente ainda,
A Mercurio o pastor pergunta como,
Por quem fôra inventada. A isto o nume
Diz então: «Nas arcádicas montanhas
Teve nome entre as nymphas Nonacrinas,
Foi entre as Hamadryadas o assombro
A náiade Syrins, Syrins, a esquiva.
Aos sátyros hirsutos se furtava,
E aos mais deuses campestres, que a seguiam;
Honrava nos costumes, no exercicio,
E na flôr virginal a Ortygia deusa.
Em traje venatorio era Diana:
A similhança os olhos enganára
Se arcos diversos não tivessem ambas,
Syrins um de marfim, Latónia um de ouro,
E assim mesmo enganava. Ella, deixando
O sombrio Lycéo, de Pan foi vista,
De Pan, c'roado do pinheiro agudo,
E o deus fallou-lhe assim... «Narrar faltava
O que lhe disse o deus; que accezas preces
A nympha repulsára, e que fugira,
Perseguida por elle até ás margens
Do sereno Ladon; que ali parando,
Pelo estorvo das ondas, deprecára
Ás ceruleas irmãs que a transformassem;
Faltava referir que em vez da amada,
Crendo que já nas mãos a tinha presa,
Pan sómente abraçou palustres canas;
Que em quanto suspirava, os ares n'ellas
Fizeram tenue som, quasi queixume;
Que n'arte nova, que na voz suave
Enlevando-se todo, o deus dissera:
«Taes colloquios se quer terei comtigo.»
Que ás canas desiguaes, com cêra unidas,
Dera seu nome a nympha. Ia Cylenio
Proseguir, eis que vê do somno oppressos
Os olhos todos. Subito emmudece,
Roça-os co'a vara, e lhe carrega o somno.
Rapido logo alçando o ferro curvo,
No vacillante collo o golpe acerta:
Cáe a cabeça; espadanando o sangue,
O sangue em borbotões macúla o monte.
Argos, jazes, em fim; de todo extincta
A claridade está de tantos lumes:
Sombra eterna te occupa os olhos cento.
Saturnia lh'os extráe, na cauda os prende
D'ave sua, e com elles a abrilhanta.
Mas freme a deusa, não retarda as iras;
Da Argólica rival aos olhos, e alma
Expõe a vexadora, horrenda Eriunys.
Seus crueis agrilhões lhe enterra a Furia,
Por todo o mundo a prófuga persegue.
Nilo, ao trabalho immenso, á espavorida
Carreira universal tu só restavas.
Tanto que imprime o pé nas margens tuas,
Sobre os joelhos cae, e aos céos erguendo
O que erguer só lhe é dado, os olhos tristes,
Com prantos, e mugidos lutuosos
Parece que se está queixando a Jove,
E que dos males seus o fim lhe implora.
Elle, o collo abraçando á sacra esposa,
Roga-lhe que remate a pena acerba.
«Perde o temor (lhe diz) crê que incentivo
Io não mais será de teus desgostos:»
E o protesto formal co'a Estyge abona.
Apenas se embrandece ao rogo a deusa,
Torna á mimosa nympha o gesto antigo,
Torna a ser de repente o que era d'antes.
Fogem do corpo as sedas, vão-se as pontas,
O orbe, a fórma ocular se lhe restringem,
Abbrevia-se a bôca, os braços volvem,
Volvem-lhe as mãos tambem, tambem as unhas;
Já sómente em dons pés está sustida,
Da novilha não tem senão a alvura.
Receando mugir, fallar não ousa,
E a desusada voz ensaia a medo.
Celebérrima deusa, agora a honram
Aras, e incensos dos egypcios povos.
Submited by
Poesia Consagrada :
- Se logue para poder enviar comentários
- 1383 leituras
other contents of Bocage
Tópico | Título | Respostas | Views |
Last Post![]() |
Língua | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia Consagrada/Geral | GLOSAS LV | 2 | 2.904 | 02/27/2018 - 09:20 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | APÓLOGOS IX | 1 | 3.087 | 03/24/2011 - 17:43 | Português | |
![]() |
Fotos/ - | bocage | 0 | 5.756 | 11/23/2010 - 23:36 | Português |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XIII | 0 | 4.711 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XIV | 0 | 7.100 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XV | 0 | 4.169 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XVI | 0 | 5.063 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XVII | 0 | 4.637 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XVIII | 0 | 5.618 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XIX | 0 | 4.295 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XX | 0 | 6.960 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES III | 0 | 5.344 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES IV | 0 | 8.053 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES V | 0 | 4.720 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES VI | 0 | 4.925 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES VII | 0 | 4.820 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES VIII | 0 | 5.188 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES IX | 0 | 4.866 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES X | 0 | 5.635 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XI | 0 | 4.461 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | FASTOS DAS METAMORPHOSES XII | 0 | 5.561 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | EPISODIOS TRADUZIDOS VIII | 0 | 5.328 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | EPISODIOS TRADUZIDOS IX | 0 | 3.263 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | EPISODIOS TRADUZIDOS X | 0 | 2.999 | 11/19/2010 - 15:56 | Português | |
Poesia Consagrada/Geral | EPISODIOS TRADUZIDOS XI | 0 | 3.769 | 11/19/2010 - 15:56 | Português |
Add comment