Sonambulismo...
Há um murmúrio desconfortável
que assola o tempo que se isola de fresco,
num mercúrio venenoso de termómetro que se partiu,
porque caiu no chão,
com o qual as crianças brincam a juntar gotas de morte...
Tenho medo de eleva(dores) porque sobem as escadas
mais depressa do que eu
e as descem como eu descia
quando as saltava em lances
e o embate do chão
me sabia a conquista quando estremeciam os predios
debaixo do eco dos meus pés...
Mas os elevadores elevam-se até onde quero subir
e eu tenho de deixar a porta fechar se quero ir...
Conto os pisos...
Um...
Dois...
Três...
Quatro...
E aquela musica de Vivaldi
que fala de quatro estações amarrotadas
num piano pardacento, amorfo e monocórdico
deixam-me ainda mais ansiosa e nervosa
pela claustrofobia da minha caixa...
E chego...
Lá em cima ainda existem andaimes
e açaimes de mim,
naquele piso coberto por plásticos,
de sofás que nunca foram repouso de ninguém...
E o medo vem me esperar à porta,
tinha estado a dormir e ainda tem ramelas nos olhos...
E eu sacudo o pó dos plásticos,
discretamente, com a palma da mão,
enquanto o medo lava os dentes à pressa...
E tomamos o pequeno-almoço juntos,
falamos do lixo à porta da inveja,
dos cães da saudade que mijam na escada...
Do ódio que rega as flores e molha os parapeitos das janelas
de toda a gente...
Da paixão que faz amor de persianas levantadas e nos olha de soslaio...
E caio...
Em mim, por entre pisos de sonhos...
E acordo nos meus braços porque os teus, ficaram lá...
Inês Dunas
Libris Scripta Est
Submited by
Poesia :
- Login to post comments
- 878 reads
Add comment
other contents of Librisscriptaest
Topic | Title | Replies | Views |
Last Post![]() |
Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/Sadness | Quimeras... | 2 | 5.974 | 06/27/2012 - 16:00 | Portuguese | |
Poesia/General | Presa no transito numa sexta à noite... | 2 | 3.466 | 04/12/2012 - 17:23 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Santa Apolónia ou Campanhã... | 2 | 2.646 | 04/06/2012 - 20:28 | Portuguese | |
Prosas/Others | Gotas sólidas de gaz... | 0 | 2.772 | 04/05/2012 - 19:00 | Portuguese | |
Poesia/General | Salinas pluviais... | 1 | 3.085 | 01/26/2012 - 15:29 | Portuguese | |
Prosas/Others | Relicário... | 0 | 3.255 | 01/25/2012 - 13:23 | Portuguese | |
Poesia/General | A covardia das nuvens... | 0 | 3.695 | 01/05/2012 - 20:58 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Arco-Iris... | 0 | 3.986 | 12/28/2011 - 19:33 | Portuguese | |
Poesia/Love | A (O) que sabe o amor? | 0 | 3.632 | 12/19/2011 - 12:11 | Portuguese | |
Poesia/General | Chuva ácida... | 1 | 3.028 | 12/13/2011 - 02:22 | Portuguese | |
Poesia/General | Xeque-Mate... | 2 | 3.273 | 12/09/2011 - 19:32 | Portuguese | |
Prosas/Others | Maré da meia tarde... | 0 | 3.193 | 12/06/2011 - 01:13 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Cair da folha... | 4 | 3.871 | 12/05/2011 - 00:15 | Portuguese | |
Poesia/Disillusion | Cegueira... | 0 | 3.392 | 11/30/2011 - 16:31 | Portuguese | |
Poesia/General | Pedestais... | 0 | 3.505 | 11/24/2011 - 18:14 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | A primeira Primavera... | 1 | 3.344 | 11/16/2011 - 01:03 | Portuguese | |
Poesia/General | Vicissitudes... | 2 | 3.702 | 11/16/2011 - 00:57 | Portuguese | |
Poesia/General | As intermitências da vida... | 1 | 3.886 | 10/24/2011 - 22:09 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | O silêncio é de ouro... | 4 | 3.025 | 10/20/2011 - 16:56 | Portuguese | |
Poesia/General | As 4 estações de Vivaldi... | 4 | 4.085 | 10/11/2011 - 12:24 | Portuguese | |
Poesia/General | Contrações (In)voluntárias... | 0 | 3.545 | 10/03/2011 - 19:10 | Portuguese | |
Poesia/General | Adeus o que é de Deus... | 0 | 3.441 | 09/27/2011 - 08:56 | Portuguese | |
Poesia/General | Limite | 2 | 4.733 | 09/22/2011 - 22:32 | Portuguese | |
Poesia/General | Quem nunca fomos... | 0 | 4.001 | 09/15/2011 - 09:33 | Portuguese | |
Poesia/General | Antes da palavra... | 1 | 4.407 | 09/08/2011 - 19:27 | Portuguese |
Comments
Re: Sonambulismo...
E o medo vem me esperar à porta,
tinha estado a dormir e ainda tem ramelas nos olhos...
Despertar é importante!!!
Bom poema Inês!!!
:-)
Re: Sonambulismo...
Há quem misture palavras, com a esperança ou a petulância de as fazer passar por arte, só alcançável aos "eleitos", aos pseudo-eruditos. E quem não lhe segue cegamentem os esbarrões, é quase visto como herege, ou, pior, quadrado e insensível. Eu gosto de palavras sãs. Palavras nossas de cada dia, palavras que se agarram umas às outras com coerência e sentido do belo. Simplesmente belo.E sentido. Pode o texto transportar-nos aos fundos do surreal, ou aos cumes da transcendência. Mas que haja uma linha condutora, um extracto consistente, ah, isso eu gosto!
Isto tudo para dizer das tuas escritas: menina, levas-me sempre contigo nas palavras que reconheço!
Beijinho!
Re: Sonambulismo...
Olá Inês.
A tua poesia, parece sair de um mundo, que não se sente, não se vê, não se toca, a não ser quando, desces a outro plano, e nesse espaço te sentes como uma personagem principal saída de um conto de fadas
beijos linda INês
Dolores Marques
Re: Sonambulismo...
Há poemas que deixam um trago a encanto, uma sensação de não acordar porque o sonho dura enquanto a leitura se sucede em gotas de nectar.
Este teu poema é assim, um fruir que não apetece terminar.
:-)
Re: Sonambulismo...
O visual em ti é uma das mais belas caracteristicas da tua poeisa.
depois acrescentas os sons, o teu interior tão rico em risos, sorrisos e outros aspectos de vivência fértil.
A grande mensagem?
Da paixão que faz amor de persianas levantadas e nos olha de soslaio...
E caio...
Lindissimo!
Re: Sonambulismo...
Inês,
Que belezura este poema!!! Maravilhooooso; não há nada melhor para dizer sobre ele. Sua poesia comove; envolve; inspira...
Parabéns!
Ana Patricia Maximo