"Memória das minhas putas tristes"

«O Dinheiro das reformas chegava cada vez para menos. As poucas coisas vendáveis que restavam na casa-Salvo as jóias sagradas da minha mãe não tinham valor comercial e nada era bastante velho para ser antigo. Em tempos melhores, o governador tinha feito a oferta tentadora de me comprar em bloco os livros dos clássicos gregos, latinos e espanhóis para a biblioteca Departamental, mas não tive coração para os vender. Depois, com as mudanças politicas e a deterioração do mundo, ninguém do governo pensava nas artes nem nas letras»

«Memória das minhas putas tristes» (Gabriel Garcia Márquez)

Lisboa, Junho 2008

Há quanto tempo estou aqui…Não me lembro de chegar a esta idade…Que terra é esta…Silenciosa, apática, soporífera.
Oiço o barulho nos cafés das avenidas mortas de luta…
“Cristiano Ronaldo atravessa a linha de meio campo e dribla um país calado;”
As trabalhadoras da Clark´s pousam as batas no chão e festejam a fúnebre tristeza do desemprego…
Há quanto tempo estou aqui?
Nos portões enlutados da Sorefame, ervas daninhas invadem os muros como medalhas da derrota…
“Simão…Cruza para o centro da área, e mais de duzentas mil pessoas são silenciadas pela selecção”
O tirano acena com a mão…Dia da Raça…mais não diz, mais não quer!
Milhões de despedidas na cara dos emigrantes…daqueles que não vão á bola.
E nós pá…aqui nesta terra explorada, ofendida, prostituta e triste…que é feito de nós?
Heróis do mar sem pesca nem marinha mercante…
Nobre povo, vilipendiado e condenado á diáspora para fugir á miséria.
Palmas e vénias;
Marisa canta um fado e os operários da Delphi recebem o prémio da rescisão…
Oiço barulho, muito barulho…São os cafés nas avenidas…

Proxenetas de Assembleia vomitam champanhe e sangue operário violando a dignidade de homens e mulheres, putas tristes deste país…Vendem Trabalho, suor o corpo e recebem indiferença e mau viver.
Duzentas mil a gritar…quanta é força da nossa classe…
“Eusébio chora agarrado á toalha e choram os putos órfãos abusados e castigados pela vergonha”
Cânticos e golos…e os detritos da sociedade jogados que nem bola de trapos, na caridade digna, mas humilhante do “Coração da Cidade”, no Porto sentido, os sem abrigo na “Sopa dos pobres”, nos Anjos, na “Lisboa menina e moça” esquecida... como esquecidas tantas outras sopas dadas por este país fora onde o governador diz que não há fome…só putas tristes!

« Depois, com as mudanças politicas e a deterioração do mundo, ninguém do governo pensava nas artes nem nas letras»…Nem na fome, nem no sofrimento de um Povo que um dia também encontrará o seu “Ninho” e lutará com todas as forças contra a condição de prostituição imposta…por uma corja de filhos da puta alegres e despreocupados!

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Lunes, Febrero 15, 2010 - 01:28

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Lapis-Lazuli

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Re: "Memória das minhas putas tristes"

Creio que no tempo do Salazar havia um anúncio na televisão que era mais ou menos assim:

«Beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses»

- Salazar empobreceu o país mantendo o povo na ignorância e obscurantismo, alimentado com vinho, fado, Fátima e futebol.

Hoje voltamos a ter uma ditadura ainda mais asfixiante e venenosa, a ditadura do Capitalismo e dos Banqueiros e Grandes grupos económicos. O Povo já tem medo de perder até o seu emprego de miséria, pois esta crise está a matar os pequenos Empresários e a classe média. Um novo 25 de Abril é urgente, não só em Portugal como em todo o mundo Capitalista.

Mais palavras para quê...

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Re: "Memória das minhas putas tristes"

Um retrato nu e cru do país de brandos costumes e brandas penas para pesados criminosos... Mas desde q haja um derby fica logo tudo esquecido...Enfim...
Não posso, no entanto deixar e elogiar a forma fuida e inteligente com q retrata tão patetico retrato...
Beijinho em si
Inês

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Re: "Memória das minhas putas tristes"

LINDO POEMA, GOSTEI MUITO!
SEM INTERFERIR EM SUAS POLÍTICAS INTERNAS, QUE AS DESCONHEÇO!
Meus parabéns,
Marne

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