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Eskizofrénico - Capitulo 4
Amanheceu suavemente, sem raios fortes de sol, apenas o ligeiro nevoeiro matinal, que abraçava a janela rectangular do quarto de Rita.
Invariávelmente ela não havia dormido nessa noite. Por muito que ela quizesse adormecer, as incidências da ultima noite, não a tranquilizavam em nada.
Chegara a uma penosa etapa da sua vida, o fim da adolescência e a certeza que novos desafios a esperavam. Ela já estava com um pé na faculdade, já se habituara a pensar por si desde muito nova, mas nada a havia preparado para as insónias amorosas.
Mais grave que tudo, não poderia pedir ajuda á sua chefe, pois iria receber o tipico " eu bem te disse!", que é a pior ofensa que uma jovem precisa de louvir.
Admitir que a chefe estivesse certa em relação ao traste do doido do Marco, era para ela uma enorme derrota. Rita acreditava que as pessoas, todas elas, mesmo os grandes criminosos, tinham algo de bom e que necessitavam apenas em certos momentos de um abraço, de uma mão estendida. Não conseguia ser como o seu pai e ver tudo a branco e preto. Talvez lhe faltasse a maldade da guerra, ou a rigidez militar. Talvez lhe faltasse o contacto com outros Povos, outras gentes.
A jovem ergueu-se penosamen te da cama e dirigiu-se ao chuveiro, ( a receita médica que ela usava para disfarçar a dureza e sonolência do corpo),assobiando " La vie en rose", num tom quase inaudivel.
Os dez minutos de cuidados corporais, não lhe trouxeram grandes alterações ao seu estado de alma e numa clarividência repentina, agarrou o Nokia, abriu a pasta de contactos e iniciou a chamada:
-Hello miuda, é a Rita. Estás por casa?
-Bom dia. Sim estou! Que se passa?
-Precisava falar contigo.
-Muito bem e a que horas trabalhas?
-Hoje é o meu dia de folga. Sei lá, estava na ideia que poderiamos ir sair e tomar um café, ou assim.
-Parece-me bem. Vens cá ter?
-Estava a pensar em nos encontramos no " Blue Moon".
-Certo. A que horas?
-Demoro uns vinte minutos. Dá para ti?
-Perfeito.
-Até já.
-Anda!
Com um sorriso de satisfação, ela desligou a chamada, optou pelo vestido de alças azul e pensava que a unica pessoa do Mundo que a poderia ouvir e aconselhar era a Carina.
Conhecia a Carina desde os tempos da escola e rápidamente ela se transformou na sua melhor amiga.
A Carina Henriques era uma miuda como ela, não acreditava na maldade das pessoas e por incrivel que possa parecer sempre tinha a frase certa, a palavra certa e a atitude certa. Era não só uma excelente ouvinte, como uma amiga dedicada.
Claro que a relação entre as duas sofreu um ligeiro afastamento, enquanto ela esteve na Suiça, mas as amizade verdadeira sobrevive a tudo. è uma árvore de tronco forte e raiz profunda, um baluarte na existência de quem um dia descobriu que não sobreviveria sem a sua amizade.
De casa dela até ao Blue Moon Café, distavam seis quilómetros, o tempo suficiente para ela ir colocando as ideias em lordem pelo caminho.
Não tinha a minima duvida de que receava voltar a encarar o doido, mas simultaneamente precisava desesperadamente de o ver todos os dias, nem que fosse ao longe. Ele provocava-lhe um nervoso miudinho, com toda a sua loucura, ium misto de amor/ ódio, uma repulsa e ao mesmo tempo uma necessidade forte de o abraçar. O ironia de tudo isto deve-se à forma carinhosa como ela sorria ao se recordar do modo como ele a abraçlou a noite passada, no escuro. O calor do seu copo, a sua mão na sua boca. E tal ideia revoltava-a. Ela que devia sentir raiva por ele a ter feito andar aos saltos pelo pátio de alguem, feita maluquinha. Ela que deveria sentir ódio, pela estória mal contada, a roçar um James Bond de má qualidade, e a tomá-la por parvinha ou uma idiota. Ela que sempre o tratar bem e o apoiara, recebia assim o "troco", por acreditar que no fundo ele era "normal".
Seria ele um amor proibido, igual aos que tantas vezes lera nos mais diversos romances, ou seria apenas tudo fruto da sua imaginação e na verdade ele estava a borrifar-se para ela?
Sentada sorridente diante de uma Frize limão, ainda a borbulhar no gelo, Carina observava-a atentamente enquanto ela circulava hesitante pelo corredor de mesas redondas.
Carina aprendera a entrar no Mundo da amiga, que por coincidência, não era muito diferente do seu, e tin ha Rita como modelo, de uma jovem inteligente e culta, com alguma dose de irreverência e acima de tudo, uma pessoa fraterna e franca.
-Bom dia Rita.
-Bom dia Carina.Desculpa ter-te arrancado de casa!
-Sem problema. Qual é drama desta vez?
-Drama?
-Sempre que tens algum problema ou indecisão, marcas comigo aqui. Quando só queres falar, vais lá a casa.
Rita corou e ainda tentou negar, mas na verdade não se lembrava de uma unica vez que tal não acontecera. Como que adivinhando os seus pensamentos, a amiga, disparou:
-Foi assim com o Rui, a quem tu deste uma "real tampa", com o futuro trabalho no café, com a carta de condução...Então, qual é o tema de hoje?
-É complicado.
-Contigo, minha amiga, é sempre complicado. tens o dom para isso, sabias?
-Oh pá não gozes.
-Não. Falo a sério.! Vá lá, pede o café e desembucha.
Enquanto aguradava quie o pedido fosse satisfeito, Rita ganhou coragem e já com o liquido castanho fumegante diante de si, iniciou:
-Conheci um sujeito. Mas antes que tires conclusões apressadas, deixa-me esclarecer que este sujeito é um pouco diferente doa que até agora conheci.
-Ah sim?
-Na verdade é um pouco mais velho e socialmente distorcido.
-Distorcido?
-Bem, como te poderei explicar....Um pouco louco.
-Amiga, como podes definir loucura?
-Bem, é diferente apenas isso. eu tambem não acredigtava que ele fosse louco, mas na verdade é um sujeito demasiado irreal.
Com os lábios pequenos e vermelhos, encostados á palhinha azul da Frize Limão, Carina levantou ligeiramente os olhos e inquiriu:
-Entendo. É casado!
-Não.Bem pelo menos acho que não.
-Achas?
-Não tenho a certeza.
-Ui, complicado isso. Quando o conheces-te?
-A noite passada.
Um silêncio sepulcral instalou-se na pequena mesa redonda, alheio ao ar de estupefacção de carina:
-Espera, estás a tentar dizer que conheces-te um tipo a noite passada e zás, estás apaixonada?
Rita sorriu ligeiramente e ganhando forças, continuou:
-Mais dificil que isso. Na verdade ele é cliente lá do café onde trabalho. Mas só a noite passada falamos um pouco.
-E ele seduziu-te com falinhas mansas e tiradas de livro...não, espera, de cinema. Usou aquelas tiradas universais de cinema!
-Ele não me seduziu pela conversa. Aliás um diálogo com ele é absolutamente impossivel.
-É mudo?
-Não, é só louco.
Carina cruzou os braços rendida e após se certificar que tinha a atenção da sua amiga, alertou:
-Ouve, não estás a dizer nada com sentido. Eu quero ajudar-te, mas começa pelo inicio. Conta-me tudo.
Durante trinta e cinco minutos Rita abriu a alma e contou meticulosamente tudo. Desde o primeiro momento que o vira, até aos estranhos acontecimentos mna noite passada.
No final da descrição, Carina pediu uma nova Frize e permaneceu alguns segundos calada , tentando tambem ela analisar o problema. Não que ela tivesse um vasto conhecimento sobre os Homens em geral ou relações amorosas, mas de uma amiga era esperado um comentário.
Pousando delicadamente as palmas das mãos na mesa, Carina concluiu:
-Sinceramente penso que devias tomar algum cuidado. Eu não sou psicóloga, nem psiquiatra, mas acredito que esse tipo deve sofrer várias perturbações psiquicas. Diabo miuda, és novas, és jovem. deixaõ estar. Ele não te trará nada de bom, acredita!
-Talvez tenhas razão.
-Pelo que me contas, ele não passa de um lunático, alguem que vive noutra realidade e parece ter algum controle sobre ti, pelo que te irá arrastar para toda essa loucura. Creio até que ele é perigoso.
-Perigoso?
-Bastante. Repara o que ele te fez, sem tu esboçares uma reacção contrária. Rita,interiormente és boazinha de mais. Deixa-o!
-Sabes amiga, acho que vou fazer isso, Sim. Definitivamente não quero mais saber dele.
-Optimo.
-Sabia que podia contar contigo. Não tinha mais ninguem a quem recorrer.
-Rita apenas tem cuidado.
-Ai amiga, onde eu estava com a cabeça.
Um brilho de malicia, estalou no olhar de Carina e não resistindo, perghuntou:
-Não me estás a esconder nada, acerac da ultima noite, çpois não?
-Não. Sei o que estás a pensar, mas quanto a isso nada se passou. Foi tal e qual como te disse.
-Bom, agora juizinho!
O encontro com a Carina, arrastou-se invariávelmente toda a tarde. Sabia-lhe bem não só estar de folga, como poder passar tanto tempo sem pensar nele directamente.
Mas amanhã ela iria para o café e tal circunstância enervou-a subitamente.
Sabia que não se deixaria facilmente dominar por ele. Ela era até bastante profissional e sentiria sempre os olhos atentos da sua superiora hierárquica sob si. Mas alguma coisa teria de muda. Será que tambem ela acabaria por ignoraro Marco, como até aqui todos o faziam?
Enquanto analisava mentalmente o dia seguinte, no regresso a casa, com as chaves de casa a rodarem no seu dedo, FRita não se apercebeu de imediato dos dois homens fardados á entrada da sua residência.
Num gesto altivo, o alto agente de camisa azul, dirigiu-se à sua presença e secamen te, inquiriu:
-Menina Rita Gonçalves?
-Correcto.
-Inspector Rui Rodrigues da policia judiciária, importava-se de nos acompanhar á esquadra?
-Á esquadra?
-Só para lhe fazer umas perguntas. Não vai demorar, muito.
-Umas perguntas, sobre que assunto?
O agente hesitou um pouco, perante a figura perplexa do progenitor, de mãos atrás das costas, na entrada de casa e como que ganhando confianç, mostrou uma foto tipo passe á jovem:
-Conhece este sujeito?
Reconheceu de imediato o rosto aquilino e nariz fino de Marco:
-Sim. É cliente no café.
-Por favor, iria-lhe pedir que nos acompanhasse.
Baixando o rosto de vergonha perante o ar siusudo do progenitor a jovem entrou na viatura policial.
------Fim Parte 1
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