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O outro lado da rua é um lugar distante

       Um dia de primavera. Flores no seu esplendor, abelhas carregadas com cestos de polén, o

chilrear dos pássaros fazia coro ao fundo do palco e eu atravessava uma passadeira com uma

criança pela mão. Um carro parou para nos dar passagem, agradeci e quando chegámos ao outro

lado da rua...

  "Ó Zé, para que serve o medo ?"

  Esta tua filha! Não me apanhas noutra, amigos ou não, nunca mais te digo que ela pode ficar 

comigo por duas horas. Era no teu turno que isto devia acontecer.

   "Desculpa ?... Não percebi bem."

   " O que é que eu faço com o medo ?"

  Está confirmado. Tirem-me daqui. Falta-me o ar. Vamos ali medir a tensão arterial.

  " Sabes... bem... não é simples... é uma pergunta interessante... olha... vamos sentar-nos

naquele banco..."

  Dez segundos. Talvez fosse salvo pela mãe, o avô, a tia, o primo, a mulher a dias... até o gato

serviria.

  " Neste banco ?"

  " Não, não, este está ao sol, aquele além fica à sombra, é mais confortável."

 Outros dez segundos.

 Ali estava ela, sentada ao meu lado, olha-me com o ar mais natural do mundo e espera.

Afinal, tinha feito uma simples pergunta e a resposta só poderia ser, também ela, simples.

 " Tiveste medo quando atrevessámos a rua ?"

 " Não foi bem isso... ia contigo. Mas começei a pensar que, se fosse sozinha, não conseguia 

atravessar a passadeira."

 " Não tenho a certeza se vais entender isto, mas o medo é muito importante. Por exemplo, ali na 

rua, observámos o movimento dos carros e só depois de pararem é que atravessámos com 

toda a segurança. Fizemos isso tudo porque tínhamos medo que nos acontecesse um acidente.

 ficaríamos magoados sem necessidade nenhuma. Seria um grande disparate. Não achas ?"

 " Claro."

 " Faz sentido para ti que o medo seja uma coisa útil que nos faz ter cuidado e impede-nos de fazer

muitos disparates ?"

 "Sim."

 Demasiado bom para ser verdade.

 " Estás satisfeita com a resposta ou ainda tens dúvidas ?"

 " Sim, estou satisfeita."

 Safei-me, já podia parar de suar.

 O resto caber-te-á a ti, meu caro,  assim que voltares do teu compromisso e a vieres buscar. E o 

resto não será pouco. Ela já está a tratar disso.

 

http://istodeseserhumano.blogspot.com

 

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quinta-feira, novembro 17, 2011 - 20:48

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José Sousa

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