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Anseio
Gostava de conseguir construir uma boneca viva, tal como Gepeto construiu o Pinóquio, que após muitos imbróglios e atribulações, acabou por se tornar um menino de verdade. Sou da opinião que a vida é como uma Universidade vitalícia. O meu avô materno tinha razão quando dizia que estamos a aprender até morrer. O amor é uma arte feita de etapas e sofrimentos que conseguem gerar, dobrar e triplicar alegria. É como uma colecção de livros de renome, cujo pagamento é feito às prestações. Vai-se recebendo todos os meses e aos poucos. O amor é como um quebra-cabeças, um puzzle, uma poça de sangue ou um torrão de açúcar de sabor exótico. Mesmo que já tenhamos mais de vinte paixões em cima, cada vez que se ama é como se fosse a primeira vez e convencemo-nos que é de vez, que é mesmo para ficar. Para sempre. Despertas em mim mais do que libido, desejo, energia que se direcciona e aproveita para os instintos da vida. Inspiras-me de uma forma tão especial que não consigo traduzir por palavras, é inexplicável. Freud diz que o ser humano possui instintos gerais, cada um com uma fonte de energia específica que se destina a produzir, aumentar, diminuir, distribuir e deslocar consoante a vontade inalienável ao indivíduo, às suas reacções das quais pode ter ou não conhecimento. Santo Agostinho, ilustre pensador vinculado à Igreja Católica defendeu que o Homem se rege por três desejos ou vontades principais: libido scendi (desejo de conhecimento), libido sentiendi (desejo ligado ao sensual) e libido dominendi (vontade de dominar). Temos a faculdade de alternar as nossas preocupações e atenção entre estas várias áreas, procurar um sentido mais amplo para o que nos restringe e reduz. A mobilidade depende da vontade, é claro e transparente como um copo de água. Reconheço que já entraste numa parte de mim que estava anteriormente vedada a qualquer outra pessoa, talvez seja do meu sistema límbico (a área responsável pelas emoções), talvez seja dos meus neurónios que após alguns shots e outras bebidas bem doces e alcoólicas, já não estejam a funcionar como deveriam. Talvez seja do meu metabolismo desregulado, do meu sistema nervoso que anda sempre num turbilhão, numa avalanche de complicações a decompor e gerir. Tento, perco, deixo sair, reprimo, afasto-me, acerco-me, sem chegar nunca ao fundo e ao fim do que me faz mover e me agita tanto. Só sei que me deixas num estado onde nunca estive antes, pairo sobre os dias, flutuo sobre os constrangimentos, não sinto vontade de comer nem de dormir, só de correr para ti, de te entrelaçar nos meus braços para nunca mais te largar. Entregar-te todos os fundamentos necessários para seres os meus olhos quando fique cega pela melancolia e a minha boca para que me beijes com a tua e me absorvas interruptamente com o teu sabor, num entreticimento contínuo e insondável. Creio que devo estar definitivamente numa das últimas fases do processo de catexia: de investimento deliberado e incansável numa pessoa sem dar espaço a que qualquer outra ideia, coisa ou conceito se possam formar na minha cabeça. Retenho fixamente os conceitos que me fazem lembrar-te melhor, só tenho espaço para o que me atrai em ti, que é absolutamente tudo o que és, dizes ou fazes. Raiva, ódio, egoísmo, materialismo, medo: todas essas emoções desapareceram da noite para o dia e foram substituídas por este amor tão inesperado como redentor. Desafias-me, fazes-me desapertar todos os botões que me asfixiavam a postura e eu faço tudo para que me entendas melhor que ninguém, invento uma nova canção para ser a minha tábua de sobrevivência, ligo novas turbinas dentro das baterias que pensei já não servirem de nada dentro dos meus haveres, aprendo um novo jogo. Ofereço-te e sirvo-te até à exaustão. Adoro a tua maneira de ser, tão pura onde sempre brilha um pouco do meu passado, uma parte do meu presente, uma incógnita de futuro e todo o meu amor.
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