Ecos do Subúrbio

Cuidado... que tenho a alma a arder...
Tenho a alma a arder...
Mais depressa...
A arder...
Agora.
Quero perder-me, por onde janelas á noite acendem o alcatrão destas ruas.
Tenho pressa de andar...
Livre como subúrbio nas poeiras do Junho cálido.
Estão a ouvir o eco???
Sim...porque me magoam clorofilicas, as brisas onde os montes, não me dão o frenesim das oficinas da cidade e o cheiro a gasolina.
Pró diabo o abandono carregado de ar puro...
Que a música onde eu quero, são ambulâncias dessincronizadas a ladrar aos meus ouvidos no eco dos edifícios....
Tortura-me...
Arrabalde anfetaminico, porta esquiva das entradas dos arredores da cidade.
Olha...olha...
Vês a batida no ar?
Um, dois, três, quatro...
Como cilindros de um motor a acelerar as metrópoles.
Burburinho de magias cheias de rádio e monóxido.
Milhões de rosto com música a fumarem horas de ponta...
Pontas de hora apressadas a enfartarem nos cacilheiros...
Não que consista em dizer que a acalmia não faz falta...mas que maça...maça!
E eu quero o estrondo...
Mas que é feito do amor com equações mirabolantes...
Da alforria proletária quando tocam fins-de-semana de graduado volume alcoólico.
Das artimanhas acetinadas dos intrujas de fim de rua...
A esses que tiro de letra, do tamanho de um comboio em escusas de apressado ás horas do imprevisto...
A arder...a alma...
E os “patos bravos”?
E as sopeiras produzidas como candelabros oitocentistas?
Os romancezinhos melodramáticos, de adolescentes virginais, densas de tesão como gatas a pedir mimo?
E as “cuscas” de padaria, que emprenham pelos ouvidos...
Rainhas da hipérbole que lavam a roupa suja, de uma freguesia inteira em seis carcaças de má-língua.
O subúrbio é uma renda, a semiótica do crime que acontece enquanto dorme.
Tenho a alma a arder...
Mais depressa...
A arder...
Um debruado multilingue pincelado de risos étnicos...
Os putos todos cagados a descobrir ilusões num saco de cola vazio.
Os mendigos desordenados, de vestes andrajosas num épico quadro de fome.
Mais depressa...
As putas nas avenidas com cigarros que publicitam camas breves miseráveis.
Cuidado... que tenho a alma a arder...
Tenho a alma a arder...
Agora...
Um tiro.
Na madrugada às tantas, tintos, tantos à batota...
Tontos, tansos, ruídos de mota...
Toscos tascos, torcem a rota...
Tinas de sangue à nossa porta
Penúrias de sal à mesa morta...
Salários chorados em murmúrio...
Bairros filhos do distúrbio...
Oiçam...
São os ecos do subúrbio.
Tenho a alma a arder...

Submited by

Saturday, January 16, 2010 - 01:24

Poesia :

No votes yet

Lapis-Lazuli

Lapis-Lazuli's picture
Offline
Title: Membro
Last seen: 10 years 42 weeks ago
Joined: 01/12/2010
Posts:
Points: 1178

Comments

jopeman's picture

Re: Ecos do Subúrbio

Um poema carregado de imagens, "ecos do subúrbio" que nos consomem, por vezes, a alma

gostei bastante

abraço

MarneDulinski's picture

Re: Ecos do Subúrbio

LINDO POEMA, LINDOS ECOS!
Meus parabéns,
Marne

Add comment

Login to post comments

other contents of Lapis-Lazuli

Topic Title Replies Views Last Postsort icon Language
Fotos/Profile 3517 1 4.496 03/13/2018 - 21:32 Portuguese
Poesia/Aphorism In Vapore Sano 4 3.568 03/13/2018 - 21:32 English
Poesia/Aphorism Era só isto que eu queria dizer 1 3.277 02/27/2018 - 10:22 English
Poesia/Aphorism salgo :33 Isaías sonha que aos fala aos camones 0 2.714 06/20/2014 - 15:41 English
Poesia/General Boca Do Inferno 0 6.198 07/04/2013 - 22:44 Portuguese
Poesia/Thoughts veludo 3 3.217 05/15/2013 - 17:34 Portuguese
Poesia/Aphorism Segundo Reza a Morte 0 3.041 10/04/2011 - 17:19 Portuguese
Poesia/Meditation Fumo 0 2.997 09/23/2011 - 12:00 Portuguese
Poesia/Aphorism De olhos fechados 3 3.452 09/20/2011 - 22:11 Portuguese
Poesia/Aphorism Tundra 0 2.872 09/20/2011 - 16:36 Portuguese
Poesia/Meditation Vazio 3 2.994 09/16/2011 - 11:00 Portuguese
Poesia/Aphorism Intento 0 2.473 09/05/2011 - 16:52 Portuguese
Poesia/Aphorism Palma Porque sim...Minha Senhora da Solidão 0 2.808 08/29/2011 - 11:13 Portuguese
Poesia/Aphorism Editorial 0 3.140 08/29/2011 - 11:08 Portuguese
Poesia/Thoughts Ermo Corpo Desabitado 0 3.099 08/29/2011 - 11:04 Portuguese
Poesia/Aphorism Dos passos que fazem eco 1 2.687 06/21/2011 - 22:06 Portuguese
Poesia/Meditation Autoretrato sem dó menor 3 4.354 03/28/2011 - 23:34 Portuguese
Poesia/Aphorism Todo o mundo que tenho 2 2.999 03/09/2011 - 08:23 Portuguese
Fotos/Profile 3516 0 5.000 11/24/2010 - 00:55 Portuguese
Fotos/Profile 3518 0 4.606 11/24/2010 - 00:55 Portuguese
Fotos/Profile 2672 0 5.966 11/24/2010 - 00:51 Portuguese
Prosas/Others A ultima vez no mundo 0 3.134 11/18/2010 - 23:56 Portuguese
Prosas/Others Os filhos de Emilia Batalha 0 3.321 11/18/2010 - 23:56 Portuguese
Poesia/Disillusion Veredictos 0 3.018 11/18/2010 - 16:41 Portuguese
Poesia/Intervention Nada mais fácil que isto 0 3.006 11/18/2010 - 16:41 Portuguese