Diablo - Capitulo 1 ( parte 2/2)
Num esforço sobrehumano para segurar as lágrimas, Paquito tentou não reparar no ar de sofrimento do irmão a ser conduzido, como se de um condenado se tratasse, pelo braço autoritário de Don Rodriguez.
Havia muito tempo que Rodrigues estabelecera a sua disciplina de ferro, entre todos os miudos que acolhera, e desde sempre fora exemplar no tratamento de castigos.
No fundo, ironia das ironias, Rodriguez aplicava no retiro, o mesmo tratamento que sofrera em pequeno por parte do seu pai. Uma selavajaria de pancada ao abrigo da " boa disciplina".
Não era só o facto de Manito ser fedelho e ousar encarar a sua figura de austeridade, mas era igualmente o facto de tanto Manito como o irmão, serem raçados de indios. Seres sem disciplina, sem modo, seres selvagens, que devido ás boas graças do Santo Padre, podiam agora receber a educação de Cristo e serem tementes a Deus e inteirados aos bons costumes católicos.
Em solavancos consecutivos Manito foi conduzido à sala de recepção, assim chamada, pois era nessa sala que Don Rodriguez recebia os candidatos a pais adoptivos, e onde fruto da sua hábil retórica conseguia " despachar" os mais problemáticos.
A decoração da sala era bem diferente de toda a habitação.Bens luxuosos foram adquiridos, e cuidadosamente espalhados pela divisão, aliados a um conforto nada usual neste tipo de habitações.
Os olhos tambem comem, retorquiu Don Rodriguez ao Santo padre, quando pediu a verba para adquirir os bens que necessitava, onde se destacam uma carpete Persa do inicio do século, em tons avermelhados, luxuosos candelabros de pé alto de bronze e estanho, bem como uma mesa de fina madeira Francesa, cuidadosamente envernizada.
Mas a Manito, nada lhe interessava toda esta opulência. Desde muito novo fora habituado a zelar pelo seu irmão e pela sua familia e orgulhava-se das suas origens, odiando como muitos descendentes Maias o povo colonizador.
De punhos cerrados e olhos castanhos flamejantes, Manito aguardava impaciente a próxima atitude de Don Rodriguez, ficando até impaciente com o tempo que este demorara a fechar a porta.
Don Rodriguez pensara em fechar a porta à chave, mas após alguns segundos de hesitação optou por apenas bater cuidadosamente a porta, sem perder de vista o pequeno rapaz:
-Está com medo que fuja?
-Fugires para onde pobre indio?
-Não me chame isso, sou Mexicano!
-Claro que és, meu fedelho...Claro que és! Em sonhos talvez.
-Não se deixe influenciar pelo meu corpo de rapazinho. Sou já homem feito!
Don Rodrigues olhou-o demoradamente, detendo-se no rosto franzino porém rigido do rapaz e esfregando a sua opulenta barriga, riu sarcásticamente.
No dormitório, Paquito que simulava atar os atacadores das sapatilhas rotas, aproveitando um momento de distração do responsável e sem perder tempo, correu desenfreadamente pelo pequeno corredor na perseguição do paradeiro de Manito:
-Mas que fazes? Volta aqui, não compliques a situação.
-Manito, desculpa...
Desesperado e temendo a reacção tempestuosa do seu superior, quando ouvisse os berros, gritou para os outros miudos:
-Agarrem-no! Ele não pode avançar mais.
Como soldados sob as ordens de um general, os miudos saltaram da cama na perseguição do pequeno Paquito.
Ao ouvir o chamamento do seu irmão, Manito precipitou-se para a porta, encolerizando um Don Rodrigues que se colocou à frente da porta, encarando o jovem:
-Quem te mandou mexer?
-Deixe-me passar. Não sei o que pretende mas deixe o meu irmão em paz!
Don Rodriguez sentindo os passos cada vez mais próximos de Paquito, cometeu o seu erro final, e perdendo a razão, puxou a sua mão atrás e com violência esbofeteou o rapaz.
Apanhado desprevenido pela violencia do embate, Manito desiquilibou-se batendo com a cabeça na mesa Francesa, e caiu pesadamente na carpete, quando Paquito irrompeu pela divisória.
Como se fosse uma imagem de um filme que alguem tivesse colocado em Pausa, todos os presentes ficaram imóveis, sem emitir qualquer ruido.
Na carpete, Manito jazia inerte, e ao redor da cabeça formava-se uma poça de sangue que circundava o rosto dele.
Desesperado paquito, avançou destemido até junto do irmão, segurando calmamente na cabeça dele. Nenhum sinal de vida ele recebia do irmão, e então como que apanhado indefeso e desprevenido Paquito principiou a chorar violentamente:
-Meu Deus, Don Rodriguez. Está morto!
-Que dizeis? - Don encarava o seu subalterno.
-O miudo, não se mexe!
-É fita dele. Mesmo um pobre indio não se deixava morrer assim. Eu mal lhe toquei.
Ignorando os ultimos comentários do seu superior, Velasco aproximou-se do jovem ensaguentado e nervosamente buscou os sinais vitais:
-Está morto!
-Não, não pode! - Retorquiu Don Rodriguez.
-É como lhe digo: Não respira!
-Merda, trata disso. É preciso esconder isto. O Santo Padre vem esta semana, se isto se sabe...
-Esconder o corpo?
-Sim. Trata disso!
-Mas senõr e o irmão?
Como se tivesse despertado de um sonho, Paquito apercebeu-se que pela primeira vez na vida estava só. Se Manito estava morto, ele teria que se virar sozinho. Mas Manito não podia estar morto, não podia...Não podia.
Sem se dar conta, o choro e dor apoderou-se dele e ganhou uma curiosa forma de ódio. Uma chama que sem explicação o consumia por dentro.
Os relâmpagos caiam sobre a proximidade do lar, o vento uivava furiosamente sobre a pequena casa e talvez isso fosse um pronuncio para o que aconteceria de seguida.
Sem conseguir perceber como, ao ver os dois sujeitos a aproximarem-se dele, Paquito fechou os olhos, cerrou os punhos e então o incrivel aconteceu.
O amuleto que Manito lhe entregara, começou a brilhar, de um vermelho vivo e incandescente , e como ferro em brasa, fundiu-se na sua pele, penetrando no seu interior.
Apalermados diante do grito de dor lancinante do jovem, os dois testemunharam algo indescritivel.
O corpo franzinho de Paquito, começou a mudar, começou a brilhar, a crescer...
-Dios...Santa Guadalupe!
-Que se passa com ele, Velasco?
-Ès El Diablo.....
Segundos depois uma figura avermelhada, sob a forma de um ser demoniaco, tomou forma e coberta de fogo, proferiu violentamente:
-Castigo...Castigo. São alimento para mim, as vossas almas são minhas!
Velasco, branco como o cal, ajoelhou-se diante da criatura e atabalhoadamente trauteou o " Padre Nosso" enquanto que Don Rodriguez, mais prático tentava fechar.
Em apenas dois passos, o novo corpo de Paquito alcançou Velasco, pousando sob o ombro deste a mão esquerda e segundos depois, uma bola de fogo consumia o corpo de Velasco.
Apavorado e emchoque, ao ver o seu subalterno a ser quiemado vivo, Don Rodriguez fechou os olhos , e sentiu o fogo em si, sentiu todo o seu corpo em chamas e caiu inanimado.
Sedento de vingança, Paquito avançou aaté ao dormitório, atirando bolas de fogo em todas as direcções.
Por fim, encarando os dois corpos inanimados, ainda fumegantes, sorriu, fechou os olhos e sentindo extirnguir-se as chamas das mãos, pegou no corpo do seu irmão e desapareceu pela janela do lado Este.
-Fim Capitulo 1
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